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    Carolina Arid Rosa Brandão: Publicidade infantil e as notas do Enem

    11/02/2015 02h00

    A divulgação das notas dos alunos do ensino médio que prestaram a última prova do Enem surpreendeu a todos. Mais de 529 mil candidatos obtiveram nota zero em redação, que teve como tema a publicidade infantil no Brasil.

    A iniciativa do Ministério da Educação ao propor para debate dos estudantes um tema contemporâneo e polêmico é merecedora de aplausos porque estimula a discussão sobre uma questão que vem sendo tratada com destaque nos mercados mais relevantes do mundo.

    O baixo rendimento dos alunos, porém, pode ser explicado pela formulação do próprio enunciado da prova, que é confuso, com poucos subsídios e, ainda, com informações equivocadas.

    Um exemplo de imprecisão na proposta do tema aos estudantes está na informação contida no mapa que orientava os alunos a respeito dos diferentes modelos de regramento da publicidade adotados por alguns países do mundo.

    O mapa informava que no Brasil se pratica apenas o modelo de autorregulamentação do setor ("não há leis nacionais, o setor cria normas e faz acordos com o governo"), o que não é verdade. No Brasil vigora um sistema misto, que combina legislação e autorregulamentação. A Constituição Federal prevê restrições à publicidade de cigarro, de bebidas alcoólicas, de agrotóxicos e de medicamentos.

    Além disso, como bem lembrou o Conar (Conselho de Autorregulamentação Publicitária) em ofício que encaminhou ao Ministério da Educação, há no país um sem número de leis ordinárias que, de algum modo, também exercem controle sobre a publicidade direcionada ao público infantil, como o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código de Defesa do Consumidor.

    (Este último prevê pena de prisão àquele que incorrer na prática de publicidade abusiva.)

    Outro ponto em que pecou o Ministério da Educação foi dar maior destaque à posição defendida por alguns setores de proibição total de qualquer propaganda dirigida ao público infantil, deixando de submeter ao crivo dos estudantes informações importantes para a formação do seu convencimento.

    Faltou informar, por exemplo, as conclusões do recente estudo preparado pelo Conar e a Associação Brasileira de Anunciantes, intitulado "Publicidade e Criança: Comparativo Global da Legislação e da Autorregulamentação".

    A pesquisa atestou que as restrições à publicidade infantil vigentes hoje no Brasil são mais rigorosas do que as encontradas nos três países tidos por mais severos nesse controle: Reino Unido, Espanha e Suécia.

    A prova acertou, apesar de tudo, ao mencionar a inconstitucionalidade da resolução nº 163 do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente). Essa resolução pretendia tornar abusiva, portanto, proibida, qualquer publicidade dirigida à criança.

    A Constituição expressamente prevê a competência exclusiva do Congresso Nacional para legislar sobre publicidade e propaganda. Tendo em vista que o Conanda é um órgão administrativo vinculado à Secretaria Especial de Direitos Humanos, suas resoluções não têm a força normativa que alguns setores lhes quiseram emprestar.

    CAROLINA ARID ROSA BRANDÃO, 34, advogada, é sócia do escritório Rodrigues Barbosa, Mac Dowell de Figueiredo, Gasparian - Advogados

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