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    São Paulo precisa do parque Augusta? Não

    07/03/2015 02h00

    MAURICIO ANTONIO RIBEIRO LOPES: AUGUSTA PERIFERIA

    Quem precisa de um parque ao custo de R$ 240 milhões, em valor de mercado, situado entre as ruas Augusta, Caio Prado e Marquês de Paranaguá? Soa falso responder "toda a cidade". Tanto quanto dizer que interessa a toda a cidade que desapareçam blocos de Carnaval da Vila Madalena. São duas situações sinistramente semelhantes. Na primeira, a elite quer ver-se incluída; na segunda, quer se excluir tudo que não seja da elite.

    Uma simples e indolor olhadela no texto ilustrado do Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo (págs. 190 a 194) mostrará a inoportunidade e excessiva onerosidade do parque Augusta.

    A área central da cidade, subprefeitura da Sé, tem 26,2 km2, 430 mil habitantes e três dos melhores parques municipais instalados: Luz, Buenos Aires e Aclimação.

    O distrito da Consolação, com apenas 57 mil moradores, contaria com dois parques municipais. Levando ao extremo esse raciocínio, a cidade deveria ter 453 parques municipais contra os 105 existentes. Quem se quer privilegiar, afinal?

    Extensões muito maiores da cidade e com contingentes populacionais muito mais expressivos oferecem muito menos à população.

    A subprefeitura de São Mateus, com quase o dobro da área e a mesma população da Sé tem apenas 4 parques, embora 12 estejam no papel. A Subprefeitura de Campo Limpo, com uma vez e meia a área e a população da Sé, tem os mesmos 3 parques, muito embora um deles se destine essencialmente aos mais privilegiados (Burle Marx).

    Na região sul, o distrito do Capão Redondo, com 270 mil moradores tem apenas um parque, e o Grajaú, distrito de Capela do Socorro, com 360 mil moradores, somente dois.

    Cidade Ademar, com praticamente a mesma população da Sé, dispõe somente de um parque, embora quatro estejam nos sonhos. Os 270 mil moradores do distrito do Jardim São Luiz também têm apenas um parque a sua disposição. A Freguesia do Ó, com população aproximada à da Sé, só tem um. Os que moram no Jaçanã, perdendo ou não o trem, também nunca viram um parque, e são quase 100 mil almas.

    Artur Alvim e Vila Matilde, na Penha, cada distrito com mais de 100 mil moradores, também não dispõem de nenhum parque municipal. Os 120 mil que moram em Santana e os 110 mil do Mandaqui, como não mandam em lugar nenhum, também nunca viram um parque, nem em sonhos, pois nem em planejamento existem. Os 100 mil moradores do maior distrito de Santo Amaro, Campo Grande, de parque não sentiram o cheiro até hoje.

    Essa enumeração traz apenas alguns dramáticos exemplos.

    Recentemente foram constituídos parques municipais ao custo individual de cerca de R$ 3 milhões. Quantos mais se fariam com o dinheiro requerido para fazer um só para a elite paulistana?

    Exposto isso, pergunta-se: como se justifica o imoral investimento ou destinação ou o que for de R$ 240 milhões num segundo parque municipal para 57 mil pessoas, quando há outro a menos de 1,2 km ou 15 minutos de caminhada?

    Sobretudo, como se justifica isso diante da circunstância de que há um compromisso público dos empreendedores para destinar mais de 60% da área do terreno para a fruição pública, além da constituição e manutenção eterna do parque a ser doado ao município?

    Perguntando francamente, você compraria, por R$ 240 milhões, uma área para fazer um parque, tendo que mantê-lo depois às suas expensas, se pudesse receber 60% dessa área gratuitamente e com sua manutenção garantida?

    Se não souber responder, pergunte às 120 mil crianças que esperam vagas de creche nesta cidade. Elas devem ter uma boa resposta.

    MAURICIO ANTONIO RIBEIRO LOPES, 53,é promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital

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    Bel Falleiros

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