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    Hilton Thadeu Zarate do Couto: A vez do eucalipto transgênico

    08/04/2015 02h00

    A cultura de eucalipto no Brasil beira os 6 milhões de hectares, a maior parte localizada no Sudeste. Há plantações comerciais, entretanto, em praticamente todos os Estados. Graças ao trabalho de muitos pesquisadores, o Brasil é um dos maiores produtores florestais no mundo, chegando à média anual de 40 m3/ha em algumas unidades da Federação.

    Inicialmente, as plantações de eucalipto no Brasil eram feitas com sementes colhidas em talhões comerciais. Logo se descobriu que o eucalipto respondia bem ao melhoramento genético. Outra etapa na evolução dos plantios de eucalipto foi o desenvolvimento da propagação vegetativa, por meio da clonagem, que praticamente dobrou as produtividades das plantações. Isso vem tornando o Brasil um grande competidor internacional na produção de produtos oriundos da madeira, como a celulose e papel, chapas de fibras e aço (com o uso de carvão vegetal).

    No dia 5 de março, cerca de mil mulheres militantes do MST e Via Campesina ocuparam o centro de pesquisa da empresa brasileira FuturaGene, em Itapetininga (SP) e, protestando contra o cultivo de eucaliptos transgênicos, destruíram um importante banco de material genético. Nove anos e todo o investimento em pesquisa foram perdidos.

    Ao mesmo tempo, em Brasília, cerca de 200 pessoas invadiram a reunião da CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), impedindo a votação do processo de liberação comercial do eucalipto transgênico.

    As alegações levantadas para impedir a aprovação do eucalipto transgênico no Brasil são baseadas em cinco pontos principais: agravamento da crise hídrica, fluxo gênico, ou seja, a possibilidade de contaminação de outros plantios de eucalipto, a segurança da proteína NPT 2, perda de competitividade do mel brasileiro e restrição à certificação florestal por parte do FSC.

    Alguns pesquisadores deixam transparecer para o público leigo que o eucalipto –seja transgênico ou convencional– some com a água que cai no solo pelas chuvas. Grande parte dessa água evapora e outra parte vai para os cursos de água alimentando os rios e reservatórios. Apenas 0,1 % da água é retida pelas plantações de eucalipto. Portanto atribuir ao eucalipto o agravamento da crise hídrica é sobrepor a crença à ciência.

    Boa parte das plantações de eucalipto no Brasil é oriunda de propagação vegetativa, ou seja, a possível contaminação por pólen transgênico não resultará em plantas com algum grau de transgenia.

    A proteína NPT 2, presente em alguns órgãos da planta do eucalipto transgênico e que os ativistas contra a liberação comercial consideram perigosa, já é estudada há muito tempo e importantes órgãos internacionais de proteção ao consumidor a consideram-na segura para o consumo humano.

    Abelhas do gênero Apis e nativas que foram expostas ao pólen do eucalipto transgênico não apresentaram diferenças na sua morfologia, comportamento ou reprodução, segundo estudos realizados pela FuturaGene.

    Sobre a possível perda de competitividade do mel brasileiro no mercado internacional por causa da presença de material transgênico, esta, se existir, estará bem abaixo das quantidades exigidas para a rotulagem de transgênico. Estudos mostram que o mel para exportação é filtrado e os resíduos, inclusive a presença de pólen, são retirados junto dos demais resíduos. Mas, mesmo assim, a proteína NPT 2 não causa danos ao organismo humano.

    O Conselho de Manejo Florestal (FSC), que certifica plantações florestais no mundo, ainda não aprovou a certificação de material transgênico no Brasil. O FSC não apresenta justificativa técnica para essa negativa. Esse é um dos motivos que faz com que os ativistas critiquem a liberação do plantio e comercialização do eucalipto transgênico.

    As empresas aderem voluntariamente aos processos de certificação e têm autonomia para decidir se interessa ou não mantê-los, de acordo com suas estratégias de mercado. Portanto é um assunto que não diz respeito à biossegurança do organismo geneticamente modificado.

    Assim como com outros organismos geneticamente modificados, qualquer atraso na liberação comercial do eucalipto fará com que o Brasil continue atrás no desenvolvimento de tecnologias avançadas.

    HILTON THADEU ZARATE DO COUTO, professor titular Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP, é membro titular da CTNBio

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