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    opinião

    Maria Laura Canineu e Juliane Kippenberg: Dia do Meio Ambiente e o compromisso sobre o mercúrio

    05/06/2015 02h00

    Dois anos atrás, quando países adotavam um novo tratado internacional para reduzir a exposição das pessoas ao mercúrio em todo o mundo, o Brasil se colocou como uma liderança importante, sendo um dos maiores apoiadores do tratado, conhecido como a "Convenção de Minamata sobre o mercúrio", assinando-o imediatamente.

    Durante longas negociações noite adentro, vimos a delegação brasileira agir proativamente, pressionando pela inclusão de medidas para a prevenção e tratamento do envenenamento por mercúrio. A delegação agiu de maneira incisiva e, em certo momento, até deixou a sala de negociação em protesto, quando uma delegação de outro país utilizava-se de manobras para atrasar o processo.

    Ao final, os brasileiros foram bem-sucedidos em incluir as medidas desejadas. No entanto, o ímpeto do país arrefeceu, com danos previsíveis aos brasileiros, especialmente às crianças, que usam mercúrio no garimpo.

    O mercúrio é um metal líquido brilhante e fascinante, mas também tóxico. Ele ataca o sistema nervoso central, causando danos ao cérebro e outras doenças crônicas debilitantes, sendo particularmente prejudicial às crianças. Em doses mais altas, pode ser letal.

    O setor econômico no qual o mercúrio é mais utilizado globalmente é a mineração artesanal de ouro em pequena escala. O metal é misturado ao minério de ouro para formar um amálgama. Em seguida, o amálgama de ouro-mercúrio é colocado sobre uma chama, para que o mercúrio seja evaporado, deixando o ouro bruto como resultado, mas liberando gases tóxicos.

    Adultos e crianças em comunidades de mineração artesanal no Brasil e em outras partes do mundo normalmente inalam esses vapores tóxicos durante o trabalho todos os dias. A Human Rights Watch tem entrevistado crianças que trabalham no processamento do ouro com mercúrio, tendo encontrado crianças pequenas sendo expostas ao mercúrio na Papua Nova Guiné, Mali, Tanzânia, Gana e nas Filipinas.

    A Convenção de Minamata foi apresentada ao Congresso brasileiro, mas acabou esquecida num contexto de debates políticos mais áridos. Houve pouco progresso rumo à aprovação do tratado pelos parlamentares, que é um passo necessário para que o Brasil complete o processo de ratificação e se torne efetivamente parte do tratado.

    Para que a convenção tenha impacto, os países precisam ratificá-la e então cumpri-la. É necessário encontrar alternativas ao mercúrio, eliminar os métodos mais danosos de uso desse metal –como a queima caseira do amálgama– e oferecer cuidados médicos aos que já sofrem com o envenenamento por mercúrio.

    Nas comunidades de mineração artesanal do Brasil onde o uso de mercúrio ainda é comum, cada dia de atraso na ratificação do tratado pode resultar em danos severos –e até permanentes– aos mineradores e suas crianças. O país deve restabelecer seu compromisso em solucionar o problema do uso caseiro do mercúrio, onde a situação é mais periclitante.

    Hoje é o Dia Mundial do Meio Ambiente. O Congresso brasileiro deve aproveitar esta oportunidade para aprovar a Convenção e garantir sua ratificação.

    MARIA LAURA CANINEU é diretora para o Brasil da Human Rights Watch
    JULIANE KIPPENBERG é pesquisadora sênior para os direitos das crianças na Human Rights Watch

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