• Opinião

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    ADRIANO PIRES

    Os riscos da geração hidroelétrica no Brasil

    14/07/2015 02h00

    As usinas hidroelétricas responderam, em 2014, por 73% da energia gerada no país, enquanto as termoelétricas foram responsáveis por 23% e as eólicas, por 1%. O despacho dessas usinas é calculado pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que indica quais usinas devem produzir energia.

    A lógica dessa operação é baseada na minimização de custos para o sistema, o que significa que os geradores não têm controle sobre sua geração. O risco dessa operação é rateado entre as usinas hidroelétricas por meio do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE), que justifica-se pela grande extensão territorial do país, com diferenças hidrológicas entre as regiões.

    Dessa forma, o MRE realoca de forma contábil a energia, transferindo o excedente daqueles que geraram além de sua garantia física para aqueles que geraram abaixo.

    Para assegurar o nível de confiabilidade do sistema, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o Ministério de Minas e Energia estabelecem e atribuem a cada usina uma Garantia Física, a máxima quantidade de energia que cada empreendimento pode vender em contratos. O critério da EPE para atribuição de Garantia Física admite um risco máximo de deficit de 5%.

    Todas as usinas hidroelétricas participam compulsoriamente do Mecanismo de Realocação de Energia, que visa o compartilhamento do risco hidrológico. O GSF (em inglês, Generation Scaling Factor) é a relação entre o volume de energia efetivamente gerado pelo MRE e a Garantia Física total do mecanismo.

    Desde 2014, o GSF tornou-se um pesadelo bilionário para as geradoras hidroelétricas. A primeira causa desse desequilíbrio financeiro das geradoras se refere aos riscos hidrológicos e comerciais. Em caso de baixa pluviosidade ou se houver erro na estratégia de contratação de energia das geradoras, estas devem colher recompensas ou prejuízo.

    A segunda causa provém das políticas de expansão e operação impostas pelo governo, que alterou os modelos e estratégias das geradoras, deixando-as expostas de forma involuntária, com a imposição de riscos para os quais não há ferramentas de gestão disponíveis.

    Com isso, as geradoras hidroelétricos não possuem controle sobre as variáveis associadas à política energética do governo. Ainda assim, o risco dessas políticas é conferido à geradora hidroelétrica.

    Para recuperar o nível dos reservatórios, e garantir a segurança do fornecimento de energia, acionou-se usinas de fontes não hidráulicas e se incentivou a redução do consumo, levando à redução da geração total do Mecanismo de Realocação de Energia e, consequentemente, à submersão do GSF, restando às geradoras o pagamento do ônus.

    Diante da situação atual do setor elétrico, fica claro que o risco do negócio de geração hidrelétrica tornou-se maior e os motivos fogem ao controle do investidor. É preciso corrigir os erros sem afastar os investidores em novos leilões e ao mesmo tempo não transferir ainda mais para os consumidores o ônus de tarifas cada vez mais elevadas, provocando mais inflação, perda de renda, desemprego e recessão.

    Esse é o grande desafio do governo federal. A solução é ouvir as empresas e, em conjunto, encontrar os melhores caminhos e evitar que ocorra ainda mais judicialização. Na falta de um diálogo maior com a agência reguladora foi o que restou hoje às empresas para conter os enormes prejuízos.

    O contrato de concessão de uma usina hidroelétrica está coberto pelo princípio constitucional da estabilidade econômico-financeira. Portanto quando um ato do governo causa dano, a concessionária prejudicada tem direito constitucional à reparação, fundamentada pela teoria da responsabilidade objetiva do Estado.

    ADRIANO PIRES, 57, economista, é diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura

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