• Opinião

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    Gary Stahl

    A revolução da infância e adolescência

    18/07/2015 02h00

    O Brasil comemora os 25 anos da aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a lei catalisadora de transformações importantes na vida de meninos e meninas em todo o país. Com isso, as crianças e os adolescentes que crescem hoje no Brasil vivem uma realidade muito diferente daquela que a geração de seus pais e avós viveu em sua infância.

    Em 1989, a Assembleia Geral da ONU adotou a Convenção sobre os Direitos da Criança, que foi ratificada no ano seguinte pelo Brasil. Antecipando esse movimento internacional, a Constituição de 1988 garantiu, em seu artigo 227, a infância e a adolescência como prioridade absoluta.

    Em 1990, o país traduziu esses princípios em uma legislação mais completa e detalhada, o Estatuto da Criança e do Adolescente, deixando para trás o Código de Menores, uma lei discriminatória, repressiva e segregacionista.

    Acompanhando essas mudanças no marco legal, o Brasil também viveu uma transformação social e econômica nos últimos 25 anos, tornando-se um país de renda média alta. Cerca de 60% dos brasileiros aumentaram sua renda, segundo o Banco Mundial. Ao todo, 36 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema.

    O país se fortaleceu economicamente: saltou da 13ª para a 7ª posição no ranking das maiores economias do mundo. Também ganhou uma face mais urbana: a concentração da população nas cidades cresceu de 75%, em 1991, para 84,8%, em 2013.

    O balanço desses 25 anos está marcado por conquistas concretas para crianças e adolescentes. O Brasil é uma das nações que têm se destacado por reduzir a mortalidade infantil. Entre 1990 e 2012, a taxa de mortalidade infantil caiu 68,4%, chegando a 14,9 mortes para cada 1.000 nascidos vivos, de acordo com o Ministério da Saúde. Com isso, superou a meta de redução da mortalidade infantil prevista nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) antes do prazo estabelecido.

    Nesse período, todos os indicadores relacionados à educação avançaram e o país está próximo de assegurar o ensino fundamental universal. De 1990 a 2013, o percentual de crianças com idade escolar obrigatória fora da escola caiu 64%, passando de 19,6% para 7% (Pnad). Os dados da educação são reforçados pela redução de 73,6% na taxa de trabalho infantil entre 1992 e 2013.

    Ao criar as condições que levaram ao desenvolvimento de políticas públicas que contribuíram diretamente com esses resultados, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) deve ser celebrado. Porém, a celebração apenas será completa se esse progresso alcançar todas as crianças e todos os adolescentes, sem exceção.

    Apesar de importantes avanços impulsionados pelo ECA, muitos meninos e meninas ainda estão sendo deixados para trás. Crianças indígenas, por exemplo, têm duas vezes mais risco de morrer antes de completar 1 ano do que as outras crianças brasileiras. Mais de 3 milhões de crianças e adolescentes –de 4 a 17 anos– estão fora da escola e 1,3 milhão entre 5 e 15 anos trabalham (Pnad, 2013).

    Os importantes resultados obtidos nesses 25 anos ficam ofuscados pelo número de mortes de adolescentes e jovens, um dos maiores do mundo, ultrapassando inclusive as estatísticas de países em situação de guerra e conflitos armados. Apenas em 2013, mais de 10 mil adolescentes foram assassinados no país. O Brasil está salvando as crianças da mortalidade infantil, mas acaba perdendo muitas dessas vidas para a violência urbana.

    Para o Unicef, há evidências suficientes para comemorar o fato de que o Brasil tomou a decisão certa ao aprovar uma lei que protege, promove e defende um conjunto amplo de direitos humanos e de cidadania para assegurar o desenvolvimento de crianças e adolescentes e, consequentemente, de todo o país.

    Mas esta também é uma oportunidade para refletir sobre as desigualdades que ainda impedem que cada criança e cada adolescente usufruam igualmente de todos os direitos. É, sobretudo, uma oportunidade de agir e transformar essa realidade para garantir direitos para todas as crianças e todos os adolescentes, independentemente de sua cor, condição física ou econômica. Só assim, o Brasil poderá se firmar como uma referência não só no campo legal e de políticas sociais, mas, principalmente, na vida real de meninos e meninas.

    GARY STAHL é representante do Unicef no Brasil

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