• Opinião

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    editorial

    Em causa própria

    19/07/2015 02h00

    Apesar de seu partido pertencer à base aliada, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se comporta como adversário do governo Dilma Rousseff (PT) desde o dia em que se elegeu presidente da Câmara dos Deputados. Derrotou o petista Arlindo Chinaglia (SP) na disputa pelo comando da Casa e fez da oposição ao Planalto seu esporte favorito.

    Manobrando para aprovar a redução da maioridade penal, defendendo a liberação obrigatória de verbas para emendas parlamentares ou propugnando por uma reforma política tirada da cartola, Cunha impôs seguidos e custosos reveses aos interesses do Executivo.

    Embora tenha se situado em campo contrário ao do governo em tantas questões substantivas, o presidente da Câmara jamais havia chegado ao extremo de cortar relações. Assim que se sentiu ameaçado pelas investigações sobre o escândalo de corrupção na Petrobras, porém, anunciou a ruptura.

    O lobista Julio Camargo afirmou à Polícia Federal que, em 2011, pagou US$ 5 milhões a Eduardo Cunha com vistas a garantir um contrato bilionário com a estatal.

    Valendo-se de um velho truque, com o agravante de utilizar em seu benefício o peso de uma instituição da República, o peemedebista procurou afastar as suspeitas dizendo-se vítima de vingança política.

    Segundo essa narrativa, o Executivo procurava transferir a crise para o Congresso; com esse propósito, cuidara para que Rodrigo Janot, chefe do Ministério Público Federal, obrigasse Camargo a mentir.

    "Desminto com veemência as mentiras do delator e o desafio a prová-las", disse. Nem precisaria: o acordo de colaboração que Camargo fez com as autoridades só terá validade se, de fato, suas informações puderem ser comprovadas.

    O mesmo raciocínio não se aplica às bravatas de Cunha, o que é uma pena. Suas acusações são gravíssimas, e qualquer presidente de Poder que quisesse ser levado a sério só deveria formulá-las com evidências à mão.

    Não há sinais de que o deputado fluminense as tenha –e tudo o mais sugere, aliás, que o governo não controla as investigações.

    De resto, chafurdando em uma crise econômica e política de profundidade ainda não de todo conhecida, o Planalto teria muito a perder se apostasse na instabilidade como boia de salvação.

    Em nota de qualidade incomum para os padrões da administração Dilma Rousseff, o governo disse esperar que a posição do peemedebista "não se reflita nas decisões e nas ações da presidência da Câmara", pois estas –nada mais preciso– devem se guiar pela imparcialidade e pela impessoalidade.

    São princípios com os quais Eduardo Cunha, para desolação nacional, parece não simpatizar. Alegando resgatar a independência do Congresso, atua antes como agente do caos legislativo, arauto da discórdia institucional e mensageiro da causa própria.


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