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    editorial

    Dubiedade turca

    03/08/2015 02h00

    Após oficializar sua entrada na coalização que combate a milícia extremista Estado Islâmico, a Turquia iniciou, no dia 24, ataques aéreos contra posições da facção terrorista no norte da Síria. O país anunciou ainda que autorizará as forças dos EUA a utilizar suas bases para executar bombardeios na área, antiga demanda americana.

    A participação turca na aliança militar deve reforçar a luta contra o EI. Trata-se, afinal, de uma das maiores potências da região.

    A investida contra os radicais, porém, foi acompanhada de ações que podem acrescentar incerteza e insegurança ao conflagrado Oriente Médio. É que os ataques aéreos também se dirigiram a campos do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão), organização guerrilheira que opera no norte do Iraque.

    Considerada uma milícia terrorista por Ancara, o PKK é o principal representante da contenda que há décadas opõe a Turquia ao povo curdo —os cerca de 30 milhões de pessoas dessa nação sem Estado se dividem pelos territórios turco, sírio, iraquiano e iraniano.

    Iniciado nos anos 1980, o conflito já provocou estimadas 45 mil mortes. Em 2012, encetaram-se negociações a fim de encontrar uma solução para a disputa. No ano seguinte, estabeleceu-se um cessar-fogo.

    Os bombardeios não só rompem o armistício como solapam as perspectivas de entendimento entre o Estado turco e o povo curdo.

    Após os ataques, o primeiro-ministro Recep Erdogan inflamou ainda mais os ânimos ao declarar que a paz com os curdos seria impossível. Analistas têm interpretado as movimentações do premiê como parte de uma estratégia eleitoral.

    Seu partido vem negociando sem sucesso há quase dois meses uma coalizão para formar maioria no Parlamento. Sem isso, novas eleições serão realizadas.

    Ao insuflar o nacionalismo turco, o primeiro-ministro busca minar o apoio conquistado pelo partido oposicionista curdo, que obteve surpreendente votação no último pleito (13% dos sufrágios).

    Pode fazer sentido político, mas não militar. O duplo combate revela-se contraproducente na luta contra o EI. Milícias curdas ligadas ao PKK vêm se mostrando uma das principais forças terrestres de oposição à facção radical.

    Ao misturar a ação contra o Estado Islâmico com uma campanha contra os curdos, a Turquia prejudica os esforços para combater os extremistas e açula desnecessariamente um conflito que se arrasta.

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