• Opinião

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    editorial

    Retrocesso no Egito

    18/08/2015 02h00

    A história recente do Egito pode ser vista como uma variação sombria da máxima expressa no romance "O Leopardo", de Giuseppe Tomasi di Lampedusa: "Se queremos que tudo permaneça como está, é preciso que tudo mude".

    Nos últimos anos, tudo mudou no país árabe. Em alguns aspectos, entretanto, em vez de as coisas permanecerem como estavam, ficaram ainda piores.

    O Egito tornou-se o país-símbolo da Primavera Árabe após a queda, em fevereiro de 2011, do ditador Hosni Mubarak, no poder havia 30 anos. Seguiram-se as primeiras eleições democráticas de sua história, vencidas por Mohamed Mursi, da Irmandade Muçulmana, principal força de oposição.

    Pouco mais de um ano da votação, as Forças Armadas deram um golpe de Estado –para o que contribuíram a insistência de Mursi em uma agenda sectária e seu fracasso na condução da economia.

    Com sua deposição, teve início uma onda de massacres, perseguições e prisões, sobretudo de seguidores da Irmandade Muçulmana, declarada organização terrorista.

    O ciclo de disputas entre forças democratizantes e autoritárias se fechou em junho de 2014, com a realização de novas eleições presidenciais e a vitória do general Abdel Fattah al-Sisi, articulador da destituição de Mursi.

    O maior país árabe, com isso, não só voltou a viver sob regime militar como também passou a experimentar uma linha ainda mais dura do que a anterior.

    Com efeito, sob a mão pesada de Mubarak, prisões arbitrárias e abusos não eram tão sistemáticos quanto hoje. De acordo com dados oficiais, já são mais de 22 mil opositores presos desde o golpe –ou 40 mil, pelas contas de ativistas.

    Tribunais vêm condenando à morte integrantes da Irmandade Muçulmana –incluindo Mursi–com base em evidências frágeis.

    À insegurança jurídica se somam novas leis sobre protestos e antiterrorismo. Agora, cidadãos podem ser detidos por perturbar a ordem pública, por exemplo, e jornalistas podem ser condenados a multas pesadíssimas pela publicação de "falsas notícias" (ou seja, que divirjam das fontes oficiais).

    Seja restringindo liberdades de expressão e associação, seja perseguindo e eliminando opositores, o governo egípcio fica, a cada dia, mais próximo de uma ditadura. Um fim melancólico para um movimento que pretendia tudo mudar –de verdade.

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