• Opinião

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    Paul Singer

    Um combate positivo ao desemprego

    04/10/2015 02h00

    Depois de anos de pleno emprego, de que gozamos desde 2005, o desemprego voltou a afetar o país com virulência. As estatísticas a respeito do número de postos de trabalho têm revelado que a perda deles vem superando amplamente a quantidade de novos criados, o que significa que o número de pessoas que perderam seu emprego cresce e é improvável que muitos já tenham conseguido outro trabalho.

    O aumento de pessoas em situação de desemprego é preocupante, pois são vítimas quase sempre inocentes de um processo extremamente doloroso de exclusão social que começa com a perda de contato com os colegas de trabalho e de sindicato com os quais haviam tecido ao longo de anos laços de companheirismo e amizade.

    Para a maioria dos desempregados, o prolongamento da situação de procura sem sucesso de novo emprego provoca a perda da moradia, causada pela falta de renda salarial, quase sempre a única fonte de dinheiro para a subsistência própria e dos dependentes.

    Em situações como essas, torna-se habitual que as famílias despejadas acabem morando na rua, o que provoca frequentemente a dissolução dos laços familiares.

    Situações de desemprego de longa duração acabam afetando a saúde física e mental das vítimas, muitas das quais apelam ao suicídio. Em países como a Espanha e a Grécia, o fenômeno do "suicídio econômico" se tornou uma importante causa de morte, devido exclusivamente ao prolongamento da situação de desemprego.

    O Brasil passou por situação semelhante quando, após o segundo choque do petróleo, em 1981, os países importadores se viram amplamente endividados, impossibilitados de cumprir seus compromissos com os credores por falta de moeda forte (na época, os chamados "petrodólares").

    O governo brasileiro, ainda sob o comando dos militares, entrou em regime de austeridade, o que provocou a falência de muitas empresas e desemprego em massa.

    Naquela ocasião, quem veio em socorro dos desempregados foram as organizações populares, as pastorais e o movimento sindical, que apoiaram a organização de milhares de coletivos, associações e cooperativas de desempregados.

    O curioso é que, na época, essa ação de resgate humano foi totalmente ignorada pela mídia e, portanto, do público eventualmente interessado. Eu tomei conhecimento graças a um convite da ONG Cáritas na época para visitar uma cooperativa por ela patrocinada.

    Depois dessa experiência, convenci-me de que essa ação humanitária –além dos méritos éticos– constituía uma maneira eficiente de enfrentar o gigantesco drama humano que o desemprego em massa acarreta.

    Tive então a ideia de publicar um artigo que provocou uma enxurrada de cartas de leitores, o que contribuiu para o nascimento no Brasil da economia solidária, que hoje se tornou um movimento mundial.

    Muitos anos depois, como secretário nacional da Economia Solidária, venho coordenando ações para fortalecer estas iniciativas da sociedade civil. No entanto, neste novo contexto de crise, é necessário envidar esforços mais amplos para combater o desemprego.

    Com a mobilização da sociedade civil e uma ampliação das políticas nacionais de assessoramento técnico, de crédito, de apoio à comercialização e à organização comunitária das finanças, poderemos contribuir para uma saída autônoma e coletiva organizada pelos próprios trabalhadores desempregados.

    Acho que chegou a hora de o Brasil lançar mão dessa experiência histórica e organizar um movimento do governo em parceria com a sociedade civil para o resgate humana das vítimas do desemprego. Para um país que se orgulha de ter começado a erradicação da miséria, é o mínimo que se deve esperar.

    PAUL SINGER, 83, economista, é secretário nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego. Foi secretário municipal do Planejamento de São Paulo (gestão Luiza Erundina)

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