• Opinião

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    Durval Lourenço Pereira

    Ocidente deve enviar tropas terrestres para combater o Estado Islâmico? Sim

    28/11/2015 02h00

    DOGMAS DO POLITICAMENTE CORRETO

    "Lembra-te que defendes não teus interesses pessoais, mas os do teu país".
    Sun Tzu – "A Arte da Guerra"

    O modelo de estratégia a ser utilizado pelo Ocidente no combate ao Estado Islâmico é alvo de discussão. No centro da controvérsia está a possibilidade do envio de tropas terrestres ao Oriente Médio. Em meio a argumentos contra e a favor, é preciso observar alguns princípios milenares da estratégia.

    O poder do Estado Islâmico não está na sua força militar, mas em certas debilidades da sociedade ocidental, como a tibieza de alguns líderes políticos, a ignorância sobre seu inimigo e a relativização da barbárie.

    Os jihadistas possuem uma milícia numerosa, estimada entre 30 e 50 mil homens, boa parte com pouco treinamento militar e coagida a integrá-la. Ao contrário de um exército regular, a estrutura operacional do Estado Islâmico entranha-se na vida civil dos territórios ocupados.

    Assim, sob o ponto de vista militar, a vitória sobre o Estado Islâmico depende, necessariamente, do êxito de uma operação em solo inimigo.

    Todavia, a invasão terrestre lidará com os perigos do combate urbano e o risco de baixas consideráveis. Eis o núcleo da questão: os líderes ocidentais estão dispostos a arcar com o ônus político da campanha?
    Há mais de 2.000 anos, o estrategista chinês Sun Tzu identificou os cinco defeitos básicos de um líder durante a guerra: a precipitação, a hesitação, a irascibilidade, a excessiva complacência e a preocupação com as aparências (o politicamente correto contemporâneo).

    De todos eles, este último é recorrente nos governantes ocidentais, zelosos em preservar a imagem pessoal junto à opinião pública.

    O argumento de que uma intervenção militar terrestre contra o Estado Islâmico despertaria ainda mais o ódio contra o Ocidente serve para resguardar tais interesses políticos. Além disso, mostra o desconhecimento da história recente e do inimigo –um pecado mortal, segundo Sun Tzu. A união desses vícios consolidou o poder das redes terroristas.

    Nos anos 1990, os EUA foram alvo de inúmeras ações da Al Qaeda, com destaque para a detonação de meia tonelada de explosivos no subsolo do World Trade Center e os ataques às suas embaixadas no Quênia e na Tanzânia.

    A resposta militar do presidente Bill Clinton às centenas de mortes limitou-se ao disparo de mísseis de cruzeiro contra uma fábrica de medicamentos no Sudão e a campos de treinamento terroristas, semidesertos, no Afeganistão.

    A estratégia não intervencionista do democrata foi vitoriosa na política interna, granjeando-lhe tanto a reeleição quanto o maior índice de aprovação ao término de um mandato presidencial desde o final da Segunda Guerra Mundial. Porém, Clinton deixou como herança a Al Qaeda fortalecida e seus subprodutos: o 11 de Setembro e uma longa, custosa e sangrenta guerra ao terror.

    A preocupação com as aparências repetiu-se na administração Obama, que ordenou a retirada prematura das forças terrestres dos EUA do Oriente Médio, permitindo o ressurgimento da Al Qaeda no Iraque, que viria a assumir depois o nome de Estado Islâmico.

    Tão nocivo quanto a prevalência dos interesses políticos é ignorar a estratégia e motivação do inimigo. O Ocidente aplaudiu a ascensão do jihadismo disfarçado de Primavera Árabe –origem da tragédia migratória europeia. Embevecida pelas falsas promessas do multiculturalismo, parte da intelectualidade ocidental se nega a admitir o choque civilizatório que alimenta o terror islâmico.

    Por tudo isso, a vitória do Ocidente na guerra contra o terror depende da derrota do seu inimigo interno: os dogmas do politicamente correto.

    DURVAL LOURENÇO PEREIRA, 47, tenente-coronel do Exército, é mestre em operações militares pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais do Exército Brasileiro. Escreveu o livro "Operação Brasil" (editora Contexto)

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