• Opinião

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    Álvaro Rodrigues dos Santos

    Enchentes, São Paulo jogou a toalha?

    08/02/2016 02h00

    Apesar dos grandes recursos financeiros já investidos em obras e serviços de infraestrutura hidráulica, como ampliação das calhas de seus grandes rios, a dura realidade vem mostrando que a Região Metropolitana de São Paulo, assim como um enorme número de médias e grandes cidades brasileiras, estão cada vez mais vulneráveis a episódios de enchentes.

    Há uma explicação elementar para tanto: todas essas cidades continuam a cometer os mesmos erros básicos que estão na origem causal das enchentes urbanas.

    Relembremos a equação básica das enchentes urbanas: "volumes crescentemente maiores de águas pluviais, em tempos sucessivamente menores, sendo escoados para drenagens naturais e construídas progressivamente incapazes de lhes dar vazão".

    Ou seja, a cidade, por força de sua impermeabilização, perde a capacidade de reter as águas de chuva, lançando-as em grande volume e rapidamente sobre um sistema de drenagem - valetas, galerias, bueiros, córregos, rios - não dimensionado para tal desempenho. E aí, as enchentes. Ao menos em seu tipo mais comum.

    Excessiva canalização de córregos e o enorme assoreamento de todo o sistema de drenagem por sedimentos oriundos de processos erosivos e por toda ordem de entulhos de construção civil e lixo urbano compõem fatores adicionais que contribuem para lançar as cidades a níveis críticos de dramaticidade no que ser refere aos danos humanos e materiais associados aos fenômenos de enchentes. E, lamentável e inexplicavelmente, as cidades continuam a cometer todos esses erros.

    Da equação hidráulica enunciada decorrem duas linhas básicas de ação para a redução das enchentes urbanas: a primeira, voltada a aumentar a capacidade de vazão de toda a rede de drenagem, a segunda, voltada a recuperar a capacidade da cidade reter uma boa parte de suas águas pluviais, reduzindo assim o volume dessas águas que é lançado sobre as drenagens.

    O governo paulista tem quase exclusivamente atuado na primeira linha básica de ação, ou seja, procurado aumentar a capacidade de vazão de córregos e rios através de obras e serviços de engenharia, a um custo extraordinário. Com resultados altamente comprometidos pelo violento processo de assoreamento a que todo esse sistema de drenagem continua sendo submetido.

    Quanto à segunda linha de ação priorizou-se a construção de piscinões, uma obra que por suas terríveis contra-indicações urbanas, pois que na prática constitui um verdadeiro atentado urbanístico, financeiro, sanitário e ambiental, parece felizmente estar saindo de cena.

    Mas com esse mesmo objetivo de retenção máxima de águas de chuva, e sem as contra-indicações dos piscinões, há um enorme elenco de medidas, virtuosamente utilizadas em vários países, que sequer foram consideradas, apesar das insistentes cobranças do meio técnico.

    São elas reservatórios domésticos e empresariais para acumulação e infiltração de águas de chuva, calçadas e sarjetas drenantes, pátios e estacionamentos drenantes, valetas, trincheiras e poços drenantes, multiplicação dos bosques florestados por todo o espaço urbano, etc.

    São as chamadas medidas não estruturais, que uma vez aliadas a um vigoroso combate aos processos erosivos e a uma radical coibição do lançamento irregular de lixo urbano e entulho da construção civil, constituem providência indispensável para o sucesso de qualquer programa de combate às enchentes.

    E mesmo que isoladamente não suficientes para a eliminação total do problema, terão a propriedade de reduzir drasticamente a quantidade, as dimensões e os custos das medidas estruturais de aumento de vazão que ainda se façam necessárias.

    ÁLVARO RODRIGUES DOS SANTOS é geólogo formado pela USP; ex-diretor de planejamento e gestão do Instituto de Pesquisas Tecnológicas - IPT

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