• Opinião

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    Osvaldo Ferreira Valente

    Código Florestal: mudar agora é prematuro

    05/03/2016 02h00

    O Código Florestal que está em vigor é uma lei recente e foi resultado de um grande debate no Congresso Nacional, com defesas acirradas de posições emitidas por ambientalistas e setores do agronegócio. A primeira versão foi sancionada em maio de 2012 (Lei Federal 12.651), com alguns vetos da presidente Dilma.

    Os itens vetados foram reescritos em Medida Provisória, rediscutidos no Congresso, e aprovados pela Lei Federal 12.727, de outubro de 2012. Ficou revogado, então, o Código Florestal de 1.965, que já estava completamente desfigurado por emendas que nem sempre preservaram a lógica que deve ser o princípio básico de uma lei.

    O novo Código criou duas ferramentas muito importantes: o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o Programa de Recuperação Ambiental (PRA). O CAR é uma autodeclaração do produtor rural quanto à situação florestal de sua propriedade e está em pleno desenvolvimento, com prazo de encerramento em maio próximo.

    Espera-se ter, a partir do CAR, uma radiografia da situação atual, eliminando ou pelo menos diminuindo as especulações feitas com dados não confiáveis, manipulados de acordo com os desejos de grupos.

    O CAR servirá, também, para criar o que poderá ser o maior movimento de recuperação ambiental do Brasil, desde que as instituições responsáveis pela aplicação do PRA sejam capazes de exigir de cada produtor rural as correções necessárias e apontadas no CAR.

    O mais surpreendente, até, se se pensar no descaso com que o antigo Código Florestal foi tratado, é a adesão mostrada pelos setores rurais no preenchimento das autodeclarações, com forte apoio de sindicatos rurais, federações, cooperativas e empresas de consultoria.

    Parece que os embates que existiam antes do novo Código fizeram com que a possibilidade de um novo período de tranquilidade no campo tenha levado o produtor rural a entusiasmar-se com a aplicação imediata do novo sistema.

    Acontece que, no meio desse jogo ainda em andamento, há um movimento de ambientalistas pressionando a Câmara de Deputados a propor modificações nas leis que ainda estão em processo de aplicação. Uma proposta de modificação já foi aprovada na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, alterando as metragens de Áreas de Preservação Permanente em torno de cursos d'água.

    Metragens que são apoiadas em valores arbitrários, sem nenhuma sustentação científica verdadeiramente comprovada. Falar que deveremos ter 30 metros de área de proteção ao longo de um córrego é tão científico como dizer que tal área precisa ser de 15 ou de 50 metros, dependendo do humor ambientalista de quem analisa.

    Ressuscitar, agora, uma das mais fortes polêmicas existente na época da discussão do Código certamente não trará nenhum benefício para o meio ambiente. Já se pode notar, por declarações de lideranças rurais, certo desânimo com a possibilidade de uma nova insegurança no campo.

    Corre-se o risco de criar, com isso, a sensação de que as esperanças trazidas com o CAR e o PRA são fugazes e tudo vai voltar a ser como dantes no quartel de Abrantes. Ou seja, que as leis ambientais não passam de divertimentos congressuais, pois acabam não sendo cumpridas por causa de atropelamentos sucessivos e que derrubam quaisquer esperanças de credibilidade.

    Se persistir a intenção de mudar, vai-se novamente apostar no círculo vicioso de ficar eternamente modificando modificações, sem nunca ver resultados efetivos de nenhum delas.

    Os ambientalistas e suas entidades precisam parar, também, de tratar todos os produtores rurais como inimigos, pois são eles que estão lá no dia a dia convivendo com os recursos naturais importantes como solo, água, flora e fauna. O mais importante é atuar para que eles tenham condições técnicas e financeiras de trabalhar harmonicamente com tais recursos.

    O país, dizem os analistas sensatos e independentes, precisa de regras estáveis para se desenvolver, pois as mudanças constantes trazem inseguranças jurídicas e inibem investimentos.

    O meio ambiente só terá a agradecer se todos se unirem para colocar o Código Florestal em prática. As exigâncias nele propostas, se efetivadas, trazem a possibilidades de um ganho substancial nas áreas de proteção e conservação.

    Depois, então, se o futuro mostrar a necessidade de reajustes eles serão propostos. Qualquer iniciativa de mudar agora é prematura e só causará desânimo, descrença e irritação no campo. E isso não resultará em nenhuma ação positiva.

    OSVALDO FERREIRA VALENTE, 74 anos, é engenheiro florestal e professor titular aposentado da Universidade Federal de Viçosa

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