• Opinião

    Saturday, 18-May-2024 06:02:26 -03

    ADILSON AMADEU

    Conveniente, mas não oportuno

    27/04/2016 02h00

    A lei 16.279 foi sancionada pelo prefeito Fernando Haddad em outubro do ano passado após 15 meses de debates, com aprovação de 43 vereadores. Como explicar que, seis meses depois, o mesmo prefeito tome uma decisão diametralmente oposta?

    Vale lembrar que a lei 16.279 jamais baniu a tecnologia do setor de transportes, nem sequer trata disso. Ela apenas restringe o uso de carros particulares, cadastrados por aplicativos, para locomoção remunerada de pessoas, como prevê lei federal. Tentar revogá-la é uma guinada de 180 graus.

    Não se trata de uma defesa corporativista, como muitos acusam. É inegável que São Paulo necessita de políticas e investimentos em mobilidade, mas há dúvidas se o caminho escolhido é o melhor. A consulta pública realizada serve apenas para tentar justificar a mudança de posicionamento e a incoerência do prefeito e sua equipe.

    Num cenário de desemprego, a possibilidade de tirar o carro da garagem e ganhar algum dinheiro é sedutora, mas quem aprova a regulação de aplicativos como o Uber olha para a cidade ou para as
    necessidades individuais?

    O Banco Mundial, assim como especialistas internacionais, reconhecem a proposta como uma "alternativa inovadora", mas não uma "fórmula de sucesso", pois jamais foi testada antes.

    Nesse sentido, São Paulo pode se transformar em laboratório, e nós seremos as cobaias. Todos sabemos que até remédios longamente estudados possuem efeitos adversos. Acomodar os interesses de uma empresa irregular, portanto, é um perigoso precedente. Qualquer coisa pode se encaixar no discurso da "livre iniciativa".

    É inegável que a prefeitura tem realizado ações favoráveis à mobilidade. O Uber, entretanto, atua em sentido oposto. Para oferecer uma "segunda renda", a empresa coloca carros, antes ociosos, para rodar. O carro da família se transformou em instrumento de trabalho e já surgiram "investidores" oferecendo veículos para aqueles que não têm um.

    O Uber apenas "compartilha" o espaço das vias. A concorrência desleal vem provocando a canibalização no setor. É ingenuidade acreditar que o transporte individual possa ter o mesmo valor do coletivo. Cedo ou tarde, isso terá reflexos na segurança, na qualidade da frota e no serviço.

    O substitutivo do prefeito, associado ao projeto de lei 421, prevê tantas novidades que deixa brechas para uma série de espertezas difíceis de controlar. Receio pela segurança do cidadão.

    A execução da proposta é complexa para um prefeito cujo mandato acaba no fim do ano. Caso não seja reeleito, que compromisso o seu substituto terá com essas ideias?

    A venda de créditos para uso do viário pode se transformar em fonte de recursos para equilibrar as contas do município?

    São Paulo, com 30% de carros irregulares em circulação, precisa de uma gestão de tráfego inteligente, capaz de controlar e fiscalizar toda a frota em circulação, garantir melhorias na mobilidade e reduzir ainda a criminalidade. Tecnologia existe, mas a parceria proposta pela prefeitura não garante isso.

    Nesse aspecto, a simples regulação pode ser conveniente para o Uber, locadoras e similares, mas não é oportuna para a cidade.

    ADILSON AMADEU é vereador em São Paulo (PTB)

    *

    PARTICIPAÇÃO

    Para colaborar, basta enviar e-mail para debates@grupofolha.com.br.

    Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024