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    editorial

    O conto da repatriação

    29/07/2016 02h00

    A crer nas declarações do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, o Planalto já teria rejeitado a ideia de atenuar a lei de anistia a quem remeteu dinheiro ao exterior clandestinamente. Espera-se que sua convicção se prove correta, mas há motivos para desconfiar.

    Surgiram informações de que estudos sobre mudanças no programa de repatriação foram conduzidos no entorno de Michel Temer (PMDB) e de que o presidente interino se dispõe a analisar modificações que tornem mais sedutora a norma que entrou em vigor neste ano, antes de Dilma Rousseff (PT) ser afastada do Planalto.

    Existe no governo certa frustração com os resultados da lei. Contava-se que, com os impostos (alíquota de 15%) e as multas (outros 15%) pagos por brasileiros para regularizar recursos mantidos ilegalmente fora, a arrecadação adicional chegaria a R$ 21 bilhões. Por ora, está na casa de R$ 8 bilhões.

    Uma das sugestões para estimular a reentrada de dinheiro partiu de escritórios de advocacia interessados em facilitar a vida de seus clientes: a tributação e a multa incidiriam somente sobre o saldo em conta no dia 31 de dezembro de 2014, não sobre o que tenha sido gasto antes dessa data.

    É fácil ver que a mudança atende os interesses de quem tem ativos irregulares no exterior. Difícil é entender como um governo sério poderia concordar com tamanha doçura diante de uma ilegalidade.

    As necessidades contábeis não podem ser postas à frente do respeito à lei e dos mandamentos éticos.

    Não custa lembrar que anistias desse tipo, por sua própria natureza, tendem a ser um prêmio para quem andou à margem da lei e um desrespeito com quem observou as devidas formalidades legais.

    Além disso, criam renovadas expectativas de impunidade e podem beneficiar quem, por meio da sonegação, obteve vantagens competitivas em sua atividade.

    No caso específico da lei da repatriação, a experiência internacional comprova potencial não desprezível de arrecadação. Nem por isso o Brasil poderia abrir mão de contrapartidas, muito menos suavizá-las após entrarem em vigor.

    Talvez, vendo o aperto orçamentário do país, alguns tenham calculado que poderiam induzir o governo a rever os termos da lei. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), parece ser um deles.

    Aperto, mesmo, enfrenta quem mantém dinheiro não declarado no exterior. Em 2018 o Brasil terá acesso a dados tributários de 97 países, como parte de convênio de intercâmbio de informações na área.

    Como ficarão vulneráveis a processos criminais, os sonegadores não encontrarão incentivo maior que esse para regularizar ativos.

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