• Opinião

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    Roberto Kalil Filho e Fabio B. Jatene

    Corações que salvam vidas

    01/08/2016 02h00

    O sistema de controle público de transplantes no Brasil é relativamente recente, tendo sido instituído há menos de 20 anos. Na década de 1990, chegou-se a aprovar uma lei estabelecendo que todo cidadão era doador presumido de órgãos.

    Na prática, a legislação não funcionou, pois a classe médica manteve a conduta de só seguir adiante com o processo doação-transplante se houvesse a anuência da família do doador. De toda forma, a implantação do sistema foi um marco na saúde brasileira. Hoje o Brasil é o segundo maior transplantador de órgãos do planeta, atrás dos EUA.

    Foram estabelecidos protocolos e critérios adequados para captação e distribuição dos órgãos, e criadas as centrais estaduais de transplantes, interligadas a uma central nacional, do Ministério da Saúde.

    Atualmente, cerca de 90% dos transplantes de órgãos no país são realizados pelo SUS (Sistema Único de Saúde), que reconhece nesse tipo de cirurgia complexa um procedimento estratégico, isto é, a remuneração não segue o clássico critério de cotas.

    A rede pública de saúde garante o fornecimento de medicamentos caros para que os pacientes transplantados possam fazer o tratamento pós-operatório e, assim, evitar a rejeição dos órgãos.

    O Estado de São Paulo tem peso preponderante no programa nacional de transplantes por sua reconhecida eficiência, que passa pela existência de diversos centros de excelência, com equipes altamente capacitadas e comprometidas.

    O primeiro transplante de coração no Brasil foi realizado em 1968, no Hospital das Clínicas, pelo professor Euriclydes de Jesus Zerbini e sua equipe. O lavrador João Ferreira da Cunha, o "João Boiadeiro", que recebeu o órgão, faleceu 28 dias após a realização do procedimento, devido a complicações relacionadas à rejeição do órgão.

    Contudo, a repercussão desse fato histórico foi tamanha que o então governador de São Paulo, Abreu Sodré, assinou o decreto que criaria o Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas.

    Quase cinco décadas depois, o Incor acaba de superar a marca do milésimo transplante. Um feito também histórico, e não apenas simbólico, pois é a prova cabal do esforço institucional, de seus médicos e de toda a equipe multiprofissional, em prol de um dos principais programas de nossa instituição.

    As cirurgias de transplantes no Incor começaram em 1985 e, desde então, foram realizados 564 transplantes de coração em adultos, 230 de coração infantil e 286 de pulmão, com resultados comparáveis aos dos melhores centros do mundo.

    O Incor responde por mais de 40% do total de transplantes de coração em todo o Estado e por 37% dos de pulmão no país. Embora nos últimos dez anos tenhamos dobrado o número de procedimentos no Brasil, precisamos seguir crescendo, pois ainda fazemos, em termos proporcionais, pouco mais de 20% dos que são realizados nos Estados Unidos.

    A criação do Núcleo de Transplantes do Incor foi um marco de gestão, pois permitiu agrupar todas as áreas de atuação de nossa instituição, criando um programa multidisciplinar com sinergia e alta eficiência.

    O número de doadores em todo o país também dobrou entre 2008 e 2015, mas ocupamos apenas a 25ª posição no ranking dos 50 países com mais doadores de órgãos. Campanhas constantes de sensibilização da sociedade são essenciais, já que pacientes morrem enquanto esperam o órgão.

    O Brasil avança de forma consistente na área de transplante de órgãos e tecidos. É motivo de orgulho para o Incor, e todo o seu corpo clínico, ter ajudado a escrever parte dessa importante história.

    ROBERTO KALIL FILHO, cardiologista, é presidente do conselho diretor do Incor (Instituto do Coração) do Hospital das Clínicas

    FABIO B. JATENE, cirurgião cardiovascular e torácico, é vice-presidente do conselho diretor do Incor do Hospital das Clínicas

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