• Opinião

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    editorial

    Impasse no Mercosul

    07/08/2016 02h00

    A reviravolta político-ideológica na América do Sul produz lances irônicos. A Venezuela bolivariana, regime que cerceia as liberdades civis e sufoca os controles republicanos, se esgueira de ser suspensa do Mercosul pela chamada cláusula democrática.

    Brasil, Argentina e Paraguai, cujos governantes se distanciaram do populismo esquerdista hegemônico havia mais de uma década, aparentemente relutam em aplicar contra Caracas o dispositivo conhecido como Protocolo de Ushuaia.

    A ironia se completa porque a Venezuela só foi aceita no bloco, em 2012, graças ao emprego da cláusula contra o Paraguai, que resistia ao novo parceiro, numa lamentável manobra da diplomacia brasileira. É bom, agora, que os métodos tenham mudado e se tenha evitado o revanchismo pueril.

    Cogitava-se mobilizar o protocolo para desfazer o impasse na presidência rotativa do bloco. Pelo disposto nas regras, o Mercosul deveria ser liderado nos próximos seis meses pela Venezuela.

    Brasília, Buenos Aires e Assunção resistem a passar o bastão ao governo periclitante de Nicolás Maduro, encurralado por uma crise que já deixou de ser apenas política e econômica para tornar-se humanitária. O Uruguai, porém, defende manter a ordem estabelecida para a chefia do Mercosul.

    A Venezuela também poderia sofrer sanção por descumprimento de quase metade dos compromissos tarifários e normativos assumidos na adesão. Tal como no quesito direitos humanos, há razões várias para enquadrar o governo Maduro por deslealdade comercial.

    Por esses motivos, teria sido melhor não incluir a Venezuela no Mercosul com tal açodamento. Agora, com o fato consumado e o regime perto do colapso, há que observar o cuidado diplomático.

    Maduro utiliza todo pretexto para adiar o referendo que pode revogar seu mandato. A oposição de Brasil, Argentina e Paraguai já é manipulada como trunfo pelo acossado dirigente, que aponta um complô regional da direita contra um governo popular.

    Caso Maduro consiga arrastar o referendo além de 10 de janeiro de 2017, sua eventual substituição não ocorrerá por eleições diretas. Assumiria, com mandato até 2019, um vice indicado pelo chavismo.

    Nessa hipótese, não se poderia descartar a conflagração civil em meio ao desabastecimento e à frustração dos venezuelanos. Para o Itamaraty, evitar surtos de violência na transição política do vizinho ao norte é objetivo tão importante quanto reativar a missão do Mercosul de abrir mercados.

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