• Opinião

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    editorial

    A segregação da Virada

    08/12/2016 02h00

    Para quem ainda não sentou na cadeira, o prefeito eleito de São Paulo, João Doria (PSDB-SP), já adotou e arquivou quantidade considerável de medidas. Na primeira entrevista após a vitória, por exemplo, foi bombástico ao afirmar que congelaria as tarifas de ônibus ao longo de 2017 —e não aumentaria nenhuma taxa cobrada pelo município.

    A seguir, em meio a reações, e diante das despesas implicadas, passou a defender o cancelamento de gratuidades no transporte. Outro vaivém atingiu a promessa de restaurar os limites de velocidade nas marginais, ideia que, depois da eleição, se tornou mais flexível.

    Agora, Doria afirmou que a Virada Cultural será transferida do centro "para um único local". No caso, o autódromo de Interlagos —uma obsessão do tucano. Mas é isso mesmo que vai acontecer?

    Bem, talvez. André Sturm, indicado para a Secretaria de Cultura, entrou em cena para dizer que apenas parte do evento —a que reúne os chamados "megashows"—trocaria de endereço. Já o próximo secretário de Comunicação, Fabio Santos, foi claro quanto aos motivos : "a galera que vem da perifa".

    Entenda-se: a Prefeitura avalia que a festa está sob ameaça de atos de violência por parte de grupos de bairros periféricos, sob a forma, por exemplo, de arrastões. De fato, ocorrências desse tipo já tiveram lugar em edições anteriores. O problema de segurança existe e precisa ser equacionado —é, aliás, o que em parte vem sendo feito.

    Houve, por exemplo, um ajuste da Virada, com bons resultados, em 2016, quando os palcos foram concentrados e diminuiu o número de atrações da madrugada. É uma linha que pode ser reforçada.

    Transferir, contudo, o evento para Interlagos seria uma triste rendição diante do desafio urbanístico e civilizatório que inspirou sua criação, em 2005, na gestão de José Serra (PSDB-SP) —representante de um ramo do tucanato mais ilustrado e cosmopolita, sob ameaça de extinção.

    Tratava-se de promover um festival democrático, no qual cidadãos de diferentes meios e bairros se encontrariam no centro, região dotada de infraestrutura, praças, instalações culturais e densidade histórica, mas em parte abandonada pela expansão da metrópole.

    Confinar a Virada em Interlagos é ceder à lógica do condomínio fechado, dos edifícios murados e da segregação urbana —realidades triunfantes que o futuro prefeito pode endossar num evento criado para contrastá-las.

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