• Opinião

    Sunday, 19-May-2024 00:14:04 -03

    Emerson de Almeida

    Sucessão turbulenta ou céu de brigadeiro?

    12/12/2016 02h00

    Desde o início da Operação Lava Jato, assistimos a trocas de comando nos principais cargos executivos de diversas empresas acusadas de práticas ilícitas. Uma das mais recentes dança das cadeiras ocorreu na presidência do conselho de administração da Camargo Corrêa, que passou a ser ocupada por um estrangeiro, fato inédito na história desse conglomerado empresarial.

    Essas mudanças provocadas por investigações da Justiça servem de pretexto para introduzir uma questão observada também em outros contextos: a sucessão abrupta, que tende a gerar instabilidade e a troca constante de presidentes das empresas, como se isso bastasse para alcançar um porto seguro.

    O exemplo de dez empresas brasileiras foi fonte de estudo e inspiração para o meu novo livro, "A Sucessão como Ela É", no qual analiso casos de sucessão abrupta e relato o exemplo da TAM, que trocou de presidente sete vezes ao longo de 14 anos, resultando, portanto, em mandatos médios de dois anos.

    A Usiminas também foi alvo do estudo. Nela, a cadeira de presidente foi ocupada por cinco mandatários diferentes ao longo de sete anos, em um processo marcado por virulenta luta pela hegemonia dos seus dois grupos de controladores.

    Esse caos instalado pela incessante troca de comando e a deterioração do mercado de commodities resultaram na corrosão do valor acionário da empresa: as ações da Usiminas valem hoje perto de 10% do que valiam há oito anos.

    A mudança incessante não é tudo: como em qualquer empresa, um novo presidente significa novas equipes, novo estilo de gestão, novas orientações internas, novos interlocutores e novas estratégias com clientes, fornecedores e prestadores de serviço. Enfim, um recomeço sem fim com consequências imensuráveis para todos.

    O que caracteriza a sucessão abrupta é o caráter repentino da troca de comando decorrente de um fato inesperado ou um ato deliberado. Mas um fator agravante existe quando a empresa não está preparada para a mudança -que administração repentinamente substituída não tenha deixado um plano de sucessão, ou por negligência ou por interesse em se perpetuar no poder.

    Ou seja, esse tipo de sucessão ocorre quando a empresa não tem em sua "fila de espera" quadros internos de sucessores preparados, avaliados e pré-selecionados a partir de um processo orientado para o longo prazo.
    Na análise sobre a experiência de outras empresas encontramos situações opostas, que indicam que a sucessão programada e integrada nas rotinas produz resultados positivos e duradouros.

    Nesses casos, o processo de gestão da sucessão sustenta-se na preparação contínua de gestores, tanto no plano da formação quanto na prática do rodízio interno de funções atrelada a desafios ascendentes.

    O resultado dessa sucessão programada é exatamente oposto ao das empresas citadas anteriormente: estabilidade e mandatos de longa duração dos principais executivos. Esse é o caso da WEG, que também foi estudada no livro e teve apenas três presidentes em seus 54 anos de crescimento.

    Esse caso e outros retratados no livro sugerem também que a sucessão do presidente, quando bem planejada, pode trazer novas energias e elementos de rejuvenescimento, oferecendo rotas para voar num céu de brigadeiro.

    A troca de piloto por copiloto treinado e ancorado em processo planejado é uma coisa. No entanto, substituir o comandante por alguém da tripulação, em situação de emergência, com o avião em pane, é coisa bem diferente, mais arriscada e com consequências por vezes danosas para a empresa, seus parceiros na cadeia de valor e a própria sociedade.

    EMERSON DE ALMEIDA, economista, é cofundador e presidente da diretoria estatutária da Fundação Dom Cabral. Escreveu o livro "A Sucessão como Ela É"

    PARTICIPAÇÃO

    Para colaborar, basta enviar e-mail para debates@grupofolha.com.br

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024