• Opinião

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    editorial

    Sem trégua

    14/01/2017 02h00

    A queda de Geddel Vieira Lima da Secretaria de Governo, em novembro, marcou o agravamento da crise política que aflige a administração de Michel Temer (PMDB). Agora, percebe-se que o presidente teve sorte de se livrar com alguma antecedência do fiel aliado.

    O então responsável pelas negociações políticas entre o Planalto e o Congresso havia sido flagrado em lobby desavergonhado por interesses particulares. Pressionava a pasta da Cultura, com conhecimento de Temer, a rever o embargo de obras em um edifício no qual havia comprado apartamento.

    Embora o governo tenha procurado minimizar o episódio, sua gravidade era inconteste —da proverbial promiscuidade entre o público e o privado ao abuso de autoridade para afrontar a decisão de um órgão técnico, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

    Do desrespeito à ética e ao decoro, entretanto, o noticiário em torno do ex-ministro evolui agora para as suspeitas de corrupção em sentido mais estrito e deplorável.

    Com a deflagração nesta sexta-feira (13) da Operação Cui Bono? ("a quem beneficia?", na tradução do latim), da Polícia Federal, vieram à tona detalhes de investigação acerca da conduta de Geddel Vieira Lima à frente de uma das vice-presidências da Caixa Econômica Federal de 2011 a 2013.

    Descobriu-se que ele tratava de operações de crédito do banco público com ninguém menos que Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o ex-presidente da Câmara dos Deputados cassado por seus pares e, desde outubro, preso em caráter preventivo.

    De acordo com o Ministério Público, há indícios de que ambos participavam de conluio para favorecer empresas "dispostas a realizar negociações ilícitas".

    Comprovem-se ou não todas as suspeitas, é absurdo o bastante que um dirigente de instituição financeira pública dê satisfações de medidas internas a qualquer cacique político —tanto pior se tiver ficha corrida extensa, como Cunha.

    Também evidente é o risco no qual incorreu Temer ao povoar seu primeiro escalão com velhas raposas do varejo partidário e do loteamento de estatais, numa estratégia para solidificar sua sustentação no Congresso.

    Se o governo pode comemorar vitórias parlamentares, exemplos presentes e passados dos piores vícios da vida pública teimam em minar sua estabilidade. Antes de Vieira Lima, dois peemedebistas de alto calibre, Romero Jucá e Henrique Eduardo Alves, já haviam deixado o ministério de forma vexatória.

    A economia até suscita esperanças de melhora, mas a política vive sob tensão sem trégua —e uma não caminhará sem a outra.

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