• Opinião

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    Manoel Pires

    O risco Fies

    02/02/2017 02h00

    O Fies é o principal programa de financiamento de ensino superior do Brasil. Para a maioria das pessoas, o crédito estudantil é a segunda decisão de consumo mais importante, perdendo apenas para a aquisição de um imóvel.

    Entre 2011 e 2014, houve notável expansão do programa, que saltou de 150 mil para mais de 700 mil novos contratos por ano. Atualmente, existem quase 2 milhões de contratos ativos. Para conter esse crescimento, o governo federal, em 2015, revisou algumas normas.

    Dentre as mudanças mais importantes estão o realinhamento dos critérios de renda, o fim do financiamento integral, o aumento das coparticipações e da taxa de juros e a redução do número de vagas. Buscava-se dessa maneira contemplar três objetivos: reduzir os custos do programa, realinhar os incentivos e melhorar a governança. Estimava-se que o subsídio por aluno cairia em 30%.

    É preciso reconhecer, no entanto, que programas de financiamento à educação possuem natureza diferenciada. A taxa de inadimplência e os subsídios são mais elevados. Em alguns casos, há perdão se o estudante não conseguir quitar a dívida em determinado prazo.

    Além disso, há espaço para renegociação das dívidas. Nos EUA, por exemplo, apesar da baixa demanda, os pedidos de revisão dos financiamentos estudantis são bem-sucedidos em 40% dos casos.

    Recentemente a imprensa noticiou uma série de problemas relacionados ao Fies -das mensalidades elevadas que conferem tratamento diferenciado aos estudantes à inadimplência que atinge 53% dos contratos, conforme relatou esta Folha no último domingo (29/1).

    Essa situação pode levar a um excesso de endividamento das famílias e a um significativo risco fiscal, uma vez que caberia ao Tesouro cobrir a parte não garantida pelo Fgeduc, o fundo que dá cobertura de crédito ao Fies.

    É necessário, portanto, buscar medidas que reduzam o risco fiscal do programa. Elas deveriam ser divididas em dois blocos.

    O primeiro aperfeiçoaria os novos contratos ao estabelecer os seguintes pontos: a inclusão gradual do Fies no orçamento do governo federal; o aumento da participação das instituições de ensino superior no Fgduc, hoje de 6,25%; maior controle do Ministério da Educação sobre o valor das mensalidades, com cruzamento de informações e de parcerias com outros órgãos; um planejamento de longo prazo para a criação de novas vagas.

    O segundo bloco, com foco nos contratos já existentes, teria tais metas: permitir descontos para o pré-pagamento; estabelecer sistemas de pagamento progressivo, já que os salários tendem a ser mais baixos no início da carreira; criar mecanismos de renegociação das dívidas.

    Esse último ponto é essencial para evitar o incremento da inadimplência e para proteger os credores, já que atualmente tem sido muito difícil renegociar as dívidas por falta de instrumentos e previsões legais adequados.
    Em conjunto, essas medidas são uma boa solução para mitigar os impactos sobre as contas públicas, evitando um significativo risco fiscal e mantendo a viabilidade de longo prazo do programa.

    MANOEL PIRES é pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas. Foi secretário de Política Econômica no Ministério da Fazenda (governo Dilma)

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