• Opinião

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    Jerson Kelman

    Como avançar no saneamento?

    02/03/2017 02h00

    Como é bem sabido, as obras de saneamento criam muitos empregos e, quando passam a funcionar, beneficiam a saúde da população, diminuindo tanto as doenças de transmissão hídrica -diarreia, por exemplo- quanto as transmitidas por mosquitos -como a dengue.

    Por essa razão, o governo corretamente elencou o setor como uma das locomotivas para a retomada econômica do país, e esta Folha tem reservado generoso espaço para o debate do tema, em editoriais e artigos.

    Ao enunciar sinteticamente a conclusão do debate, numa mensagem publicada na seção "Painel do Leitor" no dia 25/2, eu disse que o saneamento no Brasil não é ainda universalizado porque nossas tarifas são em geral baixas se comparadas a de países desenvolvidos e vice-versa quando se dividem as tarifas pelas correspondentes rendas médias. Como não é uma conclusão de óbvia compreensão, vale a pena explicar melhor.

    Sim, nossas tarifas são em média baixas. Mesmo que as entidades de saneamento fossem excepcionalmente eficientes -e não afirmo que seja este o caso-, a receita não seria suficiente para fazer os investimentos necessários à prestação do serviço, digamos, no padrão europeu.

    Como a renda per capita do brasileiro é baixa se comparada com a do europeu, principalmente nessa época de acachapante desemprego, é reduzida a margem para significativo aumento tarifário das camadas mais humildes da população. O que fazer?

    Primeiro, melhorar a eficiência e eficácia das prestadoras de serviço de saneamento. Para isso, é preciso cada vez mais pagar pelo resultado -esgoto corretamente coletado e tratado, por exemplo- em vez de pagar pela obra, que frequentemente sai mais cara do que originalmente previsto e fica anos sem atingir a capacidade plena.

    Há exemplos bem-sucedidos de programas que adotam essa filosofia. Por exemplo, o Prodes da Agência Nacional de Águas (ANA) e os contratos de performance da Sabesp.

    Segundo, mudar a estrutura tarifária, isto é, alterar a maneira como o custo do serviço é dividido entre os usuários. Atualmente, ocorrem inúmeras inadequações, sob o ponto de vista da equidade social e da eficiência econômica. Cinco exemplos:

    1) Os consumidores da Sabesp de cidades do interior, que quase sempre têm 100% do esgoto coletado e tratado, pagam menos pelo mesmo serviço do que os da região metropolitana ou de cidades do litoral, em que as condições de saneamento ainda estão longe da perfeição.

    2) O metro cúbico de água utilizado num hospital público, numa indústria ou num estabelecimento comercial pode custar até oito vezes o que paga um cidadão de classe média ou alta.

    3) A tarifa social não beneficia todas as famílias humildes que necessitam dessa proteção.

    4) Os veranistas de cidades do litoral, que só utilizam o serviço na temporada, não pagam o suficiente para cobrir o custo de mantê-lo disponível todos os dias do ano.

    5) A conta de água é a mesma para quem consome de 0 a 10 metros cúbicos por mês.

    Por orientação do Tribunal de Contas do Estado, a Sabesp submeterá à Arsesp (agência reguladora), ainda no decorrer de 2017, uma proposta de revisão da estrutura tarifária, que certamente será debatida em audiências públicas.

    As simulações da Sabesp mostram que a diminuição dos subsídios cruzados que hoje beneficiam as classes média e alta, somada ao contínuo aumento de produtividade, resultarão numa distribuição mais justa dos custos e no avanço mais célere em direção ao padrão europeu de saneamento.

    JERSON KELMAN,engenheiro civil, é presidente da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo)

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