• Opinião

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    Kátia Abreu

    À mesa, com ou sem Trump

    13/03/2017 02h00

    Profundas mudanças na ordem internacional estão em curso, e a ascensão de Donald Trump nos Estados Unidos, antes de ser causa, é consequência dessas transformações.

    Entre os americanos, muitos estão insatisfeitos com o modelo de economia globalizada, no qual empresas decidem onde querem produzir. É por isso que várias das promessas do novo presidente vêm sendo diligentemente cumpridas. No entanto, o que soa catastrófico para alguns pode ser, para outros, uma imperdível oportunidade.

    Exemplo disso é a saída dos EUA da Parceria Transpacífico (TPP). Sem participar do bloco, o Brasil estava na iminência de perder espaço em mercados importantes. Com os EUA fora, temos possibilidade de incrementar nossas exportações para os países do pacífico e de negociar acordos comerciais com economias como Japão e Coreia do Sul.

    É necessário, contudo, que os exportadores brasileiros estejam preparados para voltar à mesa e ocupar o espaço aberto a produtos nos quais somos competitivos, como os agropecuários.

    Não podemos achar que "ganhamos tempo" com esse abalo da TPP. Precisamos agir com rapidez, porque logo os EUA passarão a negociar acordos bilaterais com países asiáticos, em substituição ao bloco.

    O movimento das placas tectônicas do comércio mundial provocado pela era Trump já afeta também a relação bilateral com o México e a China. Importantes parceiros dos EUA e também do Brasil, esses dois países terão de buscar alternativas para preencher a lacuna a ser aberta nas suas operações de comércio e investimentos, caso as promessas do atual líder norte-americano continuem sendo levadas a efeito.

    Mais uma vez, nosso país precisará estar pronto para aproveitar as oportunidades que surgirão à frente. Como? Vivemos tempos em que a informação é um dos bens mais preciosos para operações comerciais exitosas. Não dá mais para seguirmos apenas reagindo aos mercados, simplesmente vendendo para aqueles que nos procuram.

    A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), por exemplo, não pode continuar fazendo serviço braçal em pleno século 21; tem que pensar estrategicamente pelo agronegócio.

    Em 2015, durante minha gestão como ministra da Agricultura, dei início ao desenvolvimento de um sistema de inteligência econômica e comercial para o agronegócio.

    Ao conhecer o Departamento de Agricultura dos EUA, que conta com mais de 800 economistas PhDs dedicados exclusivamente a análises de tendências de mercado para os produtos agrícolas, percebi que o Brasil tinha capacidade e necessidade de estruturar algo semelhante.

    Os quadros técnicos do Ministério da Agricultura -incluindo as adidâncias agrícolas no exterior e as instituições vinculadas, como Conab, Embrapa e Inmet- contam com especialistas do mais alto nível que podem se dedicar ao trabalho de inteligência estratégica. Temos de usar de maneira mais eficaz as informações disponíveis.

    O peso das exportações do agronegócio brasileiro não pode ser negligenciado neste momento em que a economia busca se recuperar. Com Trump ou sem Trump, o trabalho de inteligência estratégica não deixará de ser prioridade para os EUA. Por lá, a pasta da agricultura tem o segundo maior orçamento do governo, perdendo somente para o setor de defesa e segurança.

    Está claro que os EUA irão rever todos os seus acordos comerciais para beneficiar os norte-americanos -aliás, foi exatamente isso o que disse o porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer, em recente entrevista. Eles têm dados e informações para negociar. E o Brasil, com o que se sentará à mesa?

    KÁTIA ABREU, agropecuarista, é senadora (PMDB - TO). Foi ministra da Agricultura (governo Dilma Rousseff)

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