• Opinião

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    editorial

    Adversário de ocasião

    17/03/2017 02h00

    Inimigos externos, reais ou imaginários, costumam ser úteis a governantes em busca de apoio popular. Se não foi decisivo, um conflito com a Turquia parece ter ajudado o primeiro-ministro da Holanda, Mark Rutte, a derrotar a extrema-direita nas eleições parlamentares desta quarta-feira (15).

    A Europa recebeu com alívio o resultado do pleito. Temia-se que a Holanda confirmasse o avanço do populismo xenófobo que embala Donald Trump e o Brexit, além da candidatura presidencial de Marine Le Pen na França.

    Opositor da União Europeia, o extremista holandês Geert Wilders vinha liderando as pesquisas de intenção de voto, mas seu Partido da Liberdade obteve menos cadeiras no Legislativo do que se imaginava.

    Dias antes, o conservador Rutte viu-se envolvido em uma escaramuça diplomática originada pela ofensiva do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, por mais poder —sua intenção é tornar o país presidencialista por meio de um referendo em 16 de abril.

    A Holanda, que abriga cerca de 400 mil habitantes de ascendência turca, negou autorização para que o chanceler de Erdogan promovesse um comício político na cidade de Roterdã, em apoio à mudança do regime em sua pátria.

    Alegaram-se razões de segurança, mas o motivo real é que o governo holandês não se sentia confortável em contribuir para a escalada autoritária do líder turco.

    Rutte teve a oportunidade de mostrar firmeza. Em outro episódio, a polícia holandesa impediu que chegasse a Roterdã uma ministra da Turquia que fazia campanha em território alemão e havia cruzado a fronteira.

    O outro lado da moeda é que Erdogan aproveitou-se de maneira ainda mais evidente do entrevero.

    Suspendeu, de imediato, as relações diplomáticas entre as duas nações e elevou ao absurdo seus ataques retóricos. Tachou a Holanda de fascista e nazista; responsabilizou-a pelo massacre de Srebrenica, na ex-Iugoslávia, em que 8.000 muçulmanos foram assassinados por forças sérvias em 1995.

    A estratégia para despertar os brios nacionalistas dos turcos foi bem-sucedida. Mesmo o líder da campanha pelo "não" no referendo expressou solidariedade ao presidente e condenou os holandeses.

    Ao atacar de maneira tão ostensiva e virulenta um país da União Europeia, Erdogan dá sinal de que abandonou os planos de incluir a Turquia na comunidade. Tende a voltar-se mais para o leste, especificamente para a Rússia, com implicações potenciais para o equilíbrio de forças no Oriente Médio.

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