• Opinião

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    Miguel De Almeida

    Idade mental do militante das redes sociais

    03/04/2017 02h00

    Diante da baboseira presente nas redes sociais, a idade mental das multidões é um tema a ser recuperado. Estima-se que a consciência da massa reunida na praça seja equivalente ao descortino de uma criança de cinco anos.

    O ódio coletivo, a ignorância e o preconceito disfarçados de politicamente correto e a luta desesperada para o enxergar o mundo dividido entre os bons e os maus (sendo que os maus são os outros) demonstram o perigo de se confundir berimbau com gaita.

    Ou melhor : todos têm o direito à opinião sobre quaisquer assuntos, desde que não discordem da minha visão. Se discordar, é fascista, reacionário, entreguista e cafajeste. Alguns ainda xingam a mãe do desafeto.

    O psicólogo e sociólogo Gustave Le Bon, primeiro, e Sigmund Freud, depois, escreveram sobre a chamada psicologia das massas. Em linhas gerais, os dois dizem da dissolução da individualidade diante do coletivo, do apagamento da razão provocado pela forte emoção. Líderes populistas sempre trabalham a frustração e os sentimentos baratos como ferramentas de manipulação.

    Le Bon, ainda no século retrasado, identificou no princípio da repetição, como afirmação reiterada, uma forma de iludir, de soterrar a verdade. Joseph Goebbels, não custa lembrar, defendia a reafirmação constante da mentira até o momento em que a exaustão a elevava à condição de verdade absoluta.

    O aparelho petista de propaganda utilizou as redes sociais por meio de seus cães digitais (alguns se autointitulam blogueiros, vá lá) para disseminar a clivagem (nós contra eles) perpetrada pelo convicto Lula. Inventar um inimigo, e a ele creditar todos os males, inclusive a derrota por 7 a 1, é técnica velha de populistas desonestos (desculpe a tautologia).

    E as redes digitais, ao reunir uma massa ignorante, com a idade mental de cinco anos, surge como local próspero na manipulação das emoções -e na morte da verdade.

    Tanto Stálin como Hitler deram o mote ao lançarem mão da mentira como recurso recorrente na política. O sujeito que compartilha no meio digital comentários fascistas ou racistas pensa ser um tipo moderno e engajado, quando de fato é apenas o famoso zé ninguém de Reich (Wilhelm, o psicanalista, no caso): sua frustração com o anonimato e a crença de que precisa ter opinião acerca de qualquer assunto terminam por elevá-lo à condição de ventríloquo inconsciente da propaganda política.

    Hoje lemos comentários sobre questões atuariais, que recebem milhares de curtidas. E o autor é capaz de acreditar que fator previdenciário é uma cidade mineira.

    Observadores menos apaixonados pelas falsas questões políticas -como a tolice brasileira PT x PSDB- percebem facilmente o uso, pelos papagaios digitais, de idênticas palavras. São repetidas a partir de uma sinalização e se espalham como ondas, camadas insensatas de emoções baratas. O contágio se dá à semelhança de uma maldita melodia repetida no rádio do carro.

    Facebook, Google, entre outros mecanismos digitais, foram usados para disseminar falsas notícias na campanha presidencial americana. Muitas das mentiras foram logo contestadas, mas os desmentidos jamais alcançam a mesma repercussão.

    As inverdades acabam difundidas, no calor da disputa, pela massa com pouca idade mental -por frustração e ódios mal formulados, o zé ninguém digital dissemina o boato, a vilania e o preconceito.

    Ao final sua ignorância é tão criminosa quanto a do ladrão da Petrobras. Ou até pior: ele não verá o sol nascer quadrado em Curitiba.

    MIGUEL DE ALMEIDA é editor e escritor. Dirigiu, com Luiz R. Cabral, o documentário "Não Estávamos Ali para Fazer Amigos", sobre a atuação do caderno "Ilustrada", da Folha, nos anos 1980

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