• Opinião

    Saturday, 18-May-2024 05:43:30 -03

    editorial

    As grades e a lei

    04/05/2017 02h00

    Ao determinar, nesta terça (2), o término da prisão preventiva do ex-ministro José Dirceu, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal não toma uma atitude isolada ou de favorecimento discricionário.

    Outros envolvidos na Operação Lava Jato beneficiaram-se há pouco tempo de decisões semelhantes. Foi o caso de João Cláudio Genu, ex-tesoureiro do PP, e do pecuarista José Carlos Bumlai.

    Nos três casos, as prisões preventivas se prolongavam sem motivação clara. Dirceu estava preso desde agosto de 2015; Bumlai fora encarcerado em novembro daquele ano; Genu, em maio de 2016.

    A concessão de liberdade a tais personagens não equivale, claro está, a um ato de absolvição. Todos estão condenados em primeira instância —pesando, sobre José Dirceu, um total de 32 anos de pena por diversos crimes.

    Foi-lhe assegurado, apenas, o direito de aguardar em liberdade (com as diversas restrições previstas em lei, incluindo o uso da tornozeleira eletrônica) seu julgamento em instância superior.

    De resto, a pletora de evidências coletadas contra o ex-ministro petista, que responde pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, desautoriza o otimismo de qualquer equipe de defensores.

    Tampouco há razões para crer que a Lava Jato venha a conhecer impedimentos face à atitude do STF. O que se coloca, com efeito, não é a perspectiva de impunidade em um esquema venal de poder, mas sim o princípio impessoal dos limites a que se deve restringir o instrumento da prisão preventiva.

    Em tese, pode-se autorizar o encarceramento de um réu quando há fortes motivos para crer que possa evadir-se, destruir provas ou prosseguir na prática de crimes. Argumentou-se, no STF, que o acesso do PT e de Dirceu às fontes de verbas federais se inviabilizou desde o impeachment de Dilma Rousseff.

    Se há injustiça a reparar nesse tema, veja-se o espantoso número de réus menos estrelados, que, no Brasil, mantêm-se atrás das grades à espera de julgamento.

    São mais de 200 mil, dos quais não se sabe quantos, efetivamente, representariam real perigo público se lhes fosse suspensa a prisão preventiva —e que por certo não contam com a elite dos advogados a empenhar-se em seu favor.

    Esta Folha tem por reiteradas vezes apontado o risco de que essa modalidade de encarceramento sirva como forma de pressão abusiva para extorquir delações dos acusados, ou como instrumento persecutório a atender os reclamos, obviamente agudos, de uma opinião pública exausta de impunidade e arrogância.

    Sem sinais de abrandamento no combate contra a corrupção, em boa hora o STF assume o papel de corrigir eventuais excessos.

    editoriais@grupofolha.com.br

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024