• Opinião

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    Suzana Kahn

    Limite da Ciência

    21/06/2017 02h00

    O primeiro relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) data de 1990. De lá para cá, o IPCC já produziu cinco relatórios em intervalos de cerca de cinco a seis anos, sem contar nos inúmeros documentos especiais que focam em um único tema, como aviação, por exemplo.

    No início do mês de maio deste ano, foi realizada uma reunião do IPCC na Etiópia para debater o escopo do sexto relatório que deverá ser finalizado em 2022. Uma das questões que afligia alguns participantes da reunião era que basicamente não se teria muito a acrescentar ao que já se divulgou. Ou seja, o próximo relatório corria o risco de apresentar apenas um avanço incremental ao conhecimento que já se tem.

    Claro que ainda existe uma série de incertezas, lacunas e dúvidas, que são dirimidas sucessivamente. Mas, de uma forma geral, o recado foi dado repetidas vezes: o aquecimento global está acontecendo, as atividades humanas têm grande participação nisso e os impactos advindos do aumento da temperatura serão extremamente danosos para as economias de um modo geral e muito mais severos para as populações mais pobres do planeta. Os impactos serão muito desiguais, bem como a capacidade de cada nação se adaptar a eles.

    Evidentemente, tecnologias emergentes e disruptivas, novos custos e potenciais, políticas de financiamento inovadoras, práticas mais sustentáveis, entre outros aspectos, serão abordados em um novo relatório.

    No entanto, se não houver uma mudança de padrão de consumo e comportamento, alteração de um paradigma de modelo de desenvolvimento, todas as possibilidades de redução das emissões de gases de efeito estufa apresentadas nos relatórios científicos do IPCC são totalmente insuficientes para promover a transformação para um mundo de baixa emissão.

    De que forma, então, o aumento do conhecimento científico poderá ajudar a minimizar, já que evitar não é mais possível, as consequências?

    Por conta desta limitação, uma abordagem sobre os aspectos sociais da transformação se faz necessária. É preciso identificar como a sociedade pode aumentar seu bem-estar sem necessariamente crescer seu consumo material.

    Que estilo de vida é suficiente para se sentir bem? Nesse sentido, uma perspectiva psicológica também pode ser útil nos próximos relatórios de maneira a se verificar as melhores formas de superar as resistências às mudanças de hábitos.

    Assim, se a ciência já esgotou seus argumentos para provocar mudanças em nossa tendência crescente de emissão de dióxido de carbono, outras áreas do conhecimento deverão entrar em ação.

    Só assim teremos uma chance de ficar no limite de aumento de temperatura de 2 graus Celsius no fim deste século.

    SUZANA KAHN é presidente do Comitê Científico do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC)

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