• Opinião

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    DIMAS RAMALHO

    A chance contra a Hidra de Lerna

    25/08/2017 02h00

    A queda de um governo alimentou esperanças de alguns, mas logo ficou evidente que os males do Brasil não haviam sido extirpados.

    Pouco depois, o grande vilão do Congresso acabou preso, e outros suspeitos avançaram sobre seu espólio. Já o executivo escalado em 2015 para moralizar a Petrobras após rapinagem faraônica revelada pela Lava Jato está detido sob acusação de ter exigido sua parte em conluio com corruptores.

    A sequência interminável de escândalos transformou o desarranjo em nossa nova condição normal de temperatura e pressão. Um ceticismo coletivo plenamente justificado espalhou-se pela sociedade, que vê as serpentes se multiplicarem a cada cabeça cortada, emulando o mitológico monstro da Hidra de Lerna.

    É saudável mantermos uma postura crítica permanente, para evoluirmos como nação. Mas também nos cabe fugir da descrença e da resignação, algo difícil ante a sensação de vácuo de liderança nas esferas de poder.

    Denúncias, grampos e prisões parecem, no primeiro impacto, uma trama de horror a que somos obrigados a acompanhar pela imprensa. Tudo isso, porém, alerta para algo bem mais estrutural do que o futuro individual dos envolvidos.

    Apesar da decomposição pública de personagens políticos relevantes, eleições gerais ocorrerão em 2018, para o bem de nosso mais longevo período democrático.

    Desse fato inevitável e inadiável surgem angústias: que cenário teremos montado daqui a um ano? Quais são os caminhos possíveis? A que regras o processo estará submetido? São questões cada vez mais urgentes e de respostas menos óbvias.

    O pleito que se vislumbra é uma oportunidade perfeita para iniciarmos uma reestruturação fundamentada no voto, sem sobressaltos à ordem constitucional. Cada cidadão terá a chance de alinhar valores com seus representantes ou tornar-se ele próprio um representante. O que não pode persistir é a inércia no universo político-partidário e o silêncio ensurdecedor das ruas.

    Obviamente, existem saídas. Elas, no entanto, precisam ser desenhadas e construídas. Na política, por definição, não há espaço para aventuras individuais. Trata-se de uma atividade coletiva e colaborativa por essência.
    E o momento talvez seja uma janela inédita para que movimentos sociais, associações e os mais diversos grupos de interesses legítimos consigam participar ativamente.

    A energia desses blocos de base será necessária para legitimar a inadiável reestruturação dos partidos.

    O diálogo dos novos atores com o establishment sobrevivente, no entanto, tem de ser despido de preconceitos ou melindres. Mesmo contando com a confiança firme de apenas 2% dos brasileiros -como apontou o Datafolha em junho-, os partidos são os únicos canais de representatividade que permitirão acesso à sala de controle do país.

    A maior demanda atual é por propostas e, principalmente, líderes. Serão eles (e não alienígenas) os articuladores das forças necessárias para colocarmos de pé um Brasil renovado.

    Para isso, precisamos de quadros que saibam fazer a boa política e que tenham disposição de representar novos valores sem demonizar instituições básicas da República.

    Suas bandeiras, porém, têm de ir além do combate à corrupção, pressuposto básico que não pode ser considerado um fim em si mesmo. O Brasil já possui maturidade suficiente para desenhar, sem puritanismo ingênuo ou cínico, o projeto de nação que buscamos.

    PARTICIPAÇÃO

    DIMAS RAMALHO é é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, do qual também foi presidente em 2016. Foi deputado federal (PPS) e estadual (PMDB)

    PARTICIPAÇÃO

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