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    Cabral diz que errou ao se fechar para diálogo e que agora ouvirá mais as pessoas

    DENISE LUNA
    DO RIO

    02/08/2013 13h16

    O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), afirma que não vai renunciar ao cargo, como querem os manifestantes que quase diariamente saem às ruas para pedir seu impeachment.

    Acostumado, segundo ele, "com vaias e aplausos", Cabral diz que prefere se concentrar na eleição do seu sucessor, o vice-governador Luiz Fernando Pezão –para ele, o candidato mais preparado e que, por isso, não poderia ser vice em uma eventual chapa liderada pelo PT.

    Mas a afirmação de que não deixará o cargo por pressão popular não significa que Cabral vá cumprir seu mandato até o final. Existe a possibilidade de o governador se desincompatibilizar para que Pezão assuma seu lugar e, com isso, tenha mais visibilidade, e para que um de seus filhos, Marco Antônio, possa concorrer a deputado. Isso também abriria o caminho para que ele próprio se candidatasse ao Senado.

    "Tenho essas duas vertentes: dar maior espaço para o meu vice-governador ou ficar até o fim do governo. Estou avaliando com muita tranquilidade, não é para esse ano a decisão", informou.

    Reafirmando mais uma vez que errou ao se fechar para o diálogo, e admitindo ter agido de maneira autoritária algumas vezes, Cabral diz que pretende melhorar seu comportamento e ouvir mais as pessoas.

    O governador afirmou que tem visto autoridades fazendo autocríticas e que a entrevista do lutador Anderson Silva e as falas do papa Francisco sobre diálogo o emocionaram e o fizeram refletir.

    Ele diz que deixou de ir ao trabalho de helicóptero e que sua família também parou de usar o meio de transporte. Cabral diz que o uso dos helicópteros era feito por orientação de seu Gabinete Militar, para que evitassem as ruas, por questões de segurança.

    Agora, afirma o governador, ele vem adotando estratégias como variar horários e percursos para se proteger de ameaças que afirma receber diariamente.

    Leia abaixo a íntegra da entrevista com o governador do Rio

    FOLHA - O senhor pretende sair do governo para ajudar a campanha do seu vice, Luiz Fernando Pezão, ao governo do Estado?
    SÉRGIO CABRAL - Eu não decidi se desincompatibilizo ou não. Aqui mesmo no Estado dois governadores já saíram para ser candidatos a presidente. O Aécio [Neves, PSDB] saiu para ir para o Senado. Acho que o Cid Gomes (governador do Ceará, PSB), o Eduardo Campos (governador de Pernambuco, PSB) e o Jaques Wagner (governador da Bahia, PT) estão passando pelo mesmo dilema.

    Mas qual seria a sua opção?
    As pessoas defendem que eu vá para uma candidatura, saia candidato ao Senado, ou que eu fique até o final do governo. Eu hoje eu estou realmente focado em governar, porque é tanta questão ligada à gestão, tanta obra, tantos investimentos, cuidar da saúde, educação, segurança. Temos tanta coisa pela frente.

    As manifestações contra o seu governo não param e todo dia pedem sua renúncia. Até quando o senhor vai aguentar essa pressão?
    Eu estou muito acostumado ao jogo democrático, isso não seria o motivo da minha saída, porque o aplauso e a vaia fazem parte do jogo democrático. Eu disputei minha reeleição no palanque muitas vezes com grupos vaiando, fui inaugurar obras, com grupo vaiando. Tenho essas duas vertentes, maior espaço para o meu vice-governador ou ficar até o fim do governo. Estou avaliando com muita tranquilidade, não é para esse ano a decisão. Ano ímpar não é ano para pensar em eleição, tem que cuidar em fazer as entregas, temos ainda cinco meses de 2013 para muita entrega à população.

    Mas o senhor já pensou em renunciar?
    Renúncia? Nesse momento não, imagina, não tem pressão popular... eu tenho 16 milhões de habitantes no nosso Estado, uma responsabilidade enorme pela frente. Essas manifestações que ocorrem da oposição ou de grupos...

    O senhor já citou que seriam grupos ligados ao ex-governador Garotinho (PR) e ao deputado Marcelo Freixo (PSOL).
    Certamente tem filiados e pessoas simpáticas a eles, mas podem ter outros grupos. Do outro lado também há pessoas que reconhecem o meu trabalho, e tenho humildade, por exemplo, de reconhecer que até pessoas que reconhecem meu trabalho estavam sentindo muita falta do dialogo

    Por que o senhor acha que existe tanta insatisfação contra o seu governo?
    Foi um conjunto de fatores, isso pode ocorrer em determinados momentos com as pessoas públicas. A gente erra mesmo e acaba que a gente olha e se pergunta: porque chegamos a esse ponto de falta de diálogo, de percepção, de sensibilidade para sentar a mesa? É uma autocrítica que faço com a maior humildade mesmo.

    Mas por que chegou nesse ponto?
    Eu estou tentando refletir sobre isso. É um conjunto de fatores que te levam ao erro, que te levam a cometer erros. Outro dia eu estava vendo a entrevista do Anderson Silva [lutador], ele dizia que deixou de treinar, deixou de fazer isso, fazer aquilo e perdeu a luta. Aquilo me emocionou muito. Vi também o papa falar do diálogo, são questões que você vai olhando, referências, observações, autocríticas. Eu vejo personalidades fazendo suas autocríticas, pessoas públicas, pessoas das artes, das ciências.

    Não tem ainda uma noção do que saiu errado?
    O governante em seu 7º ano de governo... O Estado do Rio de Janeiro é um Estado que me anima o tempo inteiro, mas, será que eu cuidei muito da gestão? Ou pensei que a verdade estava do meu lado o tempo inteiro? A gente começa a se convencer que está no caminho correto e não ouve. Quando você não ouve, vai cometer erros. Eu converso muito com os meus cinco filhos, cada um no devido tamanho e idade. Eu passo isso: teu pai erra, teu pai não é super herói não, comete erros.

    Mas o que o senhor teria vontade de fazer agora?
    Eu tenho vontade de fazer um bom governo, não estou pensando nisso agora [em candidatura ao Senado]. O que eu tenho mais vontade, o que eu tenho mais entusiasmo, o que me dá mais estímulo é o Pezão governador, é ver o Pezão eleito.

    Por que?
    Porque você sabe o que era o Rio em 2006. Todos os defeitos, mazelas, dificuldades e obstáculos.
    O que se mudou desde lá... Respeito os candidatos ao governo, uns mais do que outros, mas acho que não há ninguém mais preparado e em condições de dar continuidade e aperfeiçoar e melhorar do que vem por aí do que o Pezão.

    Então por que resiste em sair e deixar o lugar para ele, e com isso permitir também a candidatura do seu filho?
    Porque eu não sei. Eu falo com meu filho (Marco Antônio). Ele é presidente da juventude nacional do PMDB, eu tive conversa franca. Eu disse: eu te amo muito, junto com seus irmãos são a coisa mais importante da minha vida, mas não tomarei nenhuma decisão por causa da sua candidatura. Não é hora de pensar em campanha, é de pensar em governar. Eu vou deixar a decisão para o ano que vem.

    O presidente regional do PMDB, Jorge Picianni, defendeu a sua desincompatibilização.
    Ele está no papel dele, e eu respeito demais. É um companheiro de muitos anos e preside muito bem o nosso partido. Está no momento de avaliar o quadro do partido, ele defende o que é melhor para o partido, defende que eu saia candidato ao Senado. Mas isso não é o mais importante agora. O importante agora é ficar concentrado no governo, depois vou decidir. Se não, eu falo uma coisa para você e em seis, sete meses eu faço outra coisa.

    Mas existe uma outra opção para o senhor?
    A opção hoje é ficar no governo trabalhando. A princípio eu vou até dezembro de 2014. Nesse momento, hoje, o meu sentimento, a minha visão é chegar a dezembro de 2014 sem deixar o governo para disputar nada. Mas política é uma evolução. Politica de alianças, tem uma série de coisas que tem que ser levado em consideração. Nas minhas reflexões, política de alianças é muito importante.

    O senhor admitiria o Pezão como vice em uma chapa encabeçada pelo PT?
    Eu reitero o que disse, o Pezão é o melhor nome e meu maior estímulo a enxergar o futuro do nosso Estado.

    E o senador Lindbergh Farias [pré-candidato do PT ao governo do Rio]?
    Vamos aguardar. Eu acho que PT e o PMDB constituíram uma aliança muito forte, muito importante para o Brasil. Eu gosto sempre de olhar a história. Ao longo do processo da democracia brasileira, da metade dos 40 aos 50, e metade dos 60, a gente teve 18 anos de democracia entre 46 e 64, e a aliança mais forte foi do PSD com PTB. A aliança do PT com o PMDB é mais densa e tem realizado muito pelo Brasil. Mas tem as questões regionais, aqui continua a aliança, tudo o que eu puder fazer para isso, eu farei.
    Um dos motivos das insatisfação popular foi o abuso do uso de helicópteros pelo senhor e sua família. Antes, o senhor também foi criticado por usar o jatinho de um empresário (Eike Batista) para ir à festa do empresário Fernando Cavendish. Nos dois casos o senhor disse que o fez por falta de regras que impedissem, mas toda a sociedade considerou antiético. Porque o senhor não consegue enxergar isso? O senhor não tem um senso ético?
    É evidente que eu tenho um senso ético. Mas no Estado do Rio, não havia protocolo. A minha família sempre recebeu recomendações do gabinete militar e eu sempre segui as recomendações do gabinete militar.
    Quando você toma decisões como nós tomamos aqui... Mandar marginais para presídios de segurança máxima fora do Rio e o governador nunca havia tomado essa decisão. A gente enfrentou a milícia, enfrentou o tráfico, está pacificando favelas. O gabinete militar tem o protocolo militar de segurança, estou mandando fazer um que não seja apenas militar.

    O senhor ia da lagoa Rodrigo de Freitas para o Palácio Guanabara, em Laranjeiras, de helicóptero por uma questão de segurança?
    O helicóptero era para minha segurança. Da Lagoa para Laranjeiras era por uma questão de mobilidade e de compromissos, que muitas vezes era ou uma exigência do gabinete militar, por exemplo, mas isso me fragiliza um pouco. Queria evitar batedores, uma estrutura de segurança maior, porque isso gera um inconveniente na cidade, então mandei eles adaptaram (o protocolo). É disque denúncia o dia inteiro, vamos matar o Cabral...Os caras (gabinete militar) trabalham para isso.

    E agora, sem usar helicópteros, como fica a segurança do governador?
    Estamos tomando precauções, mudando intinerários, horários, tem todo um protocolo.

    O senhor tem conseguido chegar em casa com os protestos na sua rua?
    Tenho chegado. Ali tem uma coisa de coação física à minha família. Eu estou acostumado, como te disse, com vaia na Assembleia, aplauso, quantas vezes nesse governo tive manifestações corporativas. O que eu acho é que ali tem uma criança de 6 anos e outra de 11 anos, meus filhos, isso é quase que uma coação física, eles na esquina. Aí a policia aumenta o efetivo, meus filhos ficam olhando..

    Até quando o senhor vai aguentar isso?
    O que eu posso fazer? Moro ali. Tenho conseguido chegar em casa, mas é uma coisa muito ruim. É uma ponderação democrática minha.

    E o que o senhor achou da violência da polícia contra os manifestantes?
    A polícia evoluiu muito nesses últimos dias, até nas redes se reconheceu que estão melhor. Pacificamos comunidades onde o tráfico dominava com fuzil na mão, acuando as pessoas. No asfalto, nas manifestações políticas, eles [polícia] tinham uma tradição de lutas e de conduta. De repente, após as grandes manifestações que houve em junho, se desdobraram manifestações com conteúdos muito violentos, de menor porte, em que você via, grupos que partiam para coquetel molotov, quebradeira de lojas, agências bancárias. São fatos novos nas manifestações urbanas, isso não existia no Brasil, você não via. A policia nunca se preparou para lidar com gente com coquetel molotov.

    Mas o senhor deu orientação para a polícia pegar mais leve?
    A orientação é do próprio comandante [coronel Erir Ribeiro da Costa Filho, da PM]. Houve reunião com a área de direitos humanos do governo. O Beltrame [José Mariano Beltrame, secretário de Segurança] diz que é um aprendizado, tudo isso tem que ser levado em consideração.

    O que o senhor achou da queda da sua popularidade no Ibope, de 70% para 12%?
    É tudo fotografia do momento e a gente tem que respeitar, pesquisa a gente acata avalia e procura tomar dela as melhores lições e avaliações.

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