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    Convicção na democracia é recorde, mostra pesquisa

    RICARDO MENDONÇA
    DE SÃO PAULO

    30/03/2014 02h00

    No momento em que o golpe de 1964 completa 50 anos, a democracia brasileira bate um recorde. A convicção no modelo democrático como a melhor via a ser trilhada nunca foi tão alta, conforme atestam a última pesquisa Datafolha e a série histórica do instituto sobre o assunto, que começa em 1989.

    Para 62% dos brasileiros, a democracia "é sempre melhor que qualquer outra forma de governo". Apenas 16% afirmam que "tanto faz se for uma democracia ou uma ditadura". E só 14% admitem que "em certas circunstâncias, é melhor uma ditadura".

    Parece haver uma lenta, gradual e segura escalada sobre isso. Quando o Datafolha fez essa pergunta pela primeira vez, 25 anos atrás, 43% dos entrevistados manifestaram convicção absoluta na democracia. No meio dos anos 90, o índice subiu para 54%. Em 2003, foi a 59%.

    A crença majoritária e perseverante do brasileiro no regime democrático, porém, não o exime de críticas.

    O Datafolha perguntou aos mesmos entrevistados como eles avaliam o funcionamento da democracia no Brasil hoje. Para 61%, ela tem "grandes problemas". A ideia segundo a qual viveríamos numa democracia plena é assentida por apenas 3%.

    A satisfação com a democracia também não é garantida. Só 9% afirmam estar "muito satisfeitos" com ela. Um contingente três vezes maior está "nada satisfeito". A maioria está na posição intermediária: 59% se sentem "um pouco" satisfeitos com a democracia.

    COERÊNCIA

    Para o filósofo Marcos Nobre, não há contradição entre o apoio recorde conquistado pela democracia e o fato de a maioria citá-la como um regime com grandes problemas.

    "Isso é resultado da experiência democrática. Tem certas expectativas que ela gera, mas não cumpre", diz. "Junho de 2013 escancarou isso: grandes protestos, mas poucos que foram para a rua estavam contra a democracia."

    Editoria de Arte/Folhapress

    Se o regime nos moldes atuais é criticado, há risco de o país cair numa nova ditadura? Não. Pelo menos na opinião das mesmas pessoas que manifestaram insatisfação. Para 75%, há pouca ou nenhuma chance de ocorrer uma nova ditadura no país.

    O historiador Marcelo Ridenti atribui essa combinação de resultados às conquistas sociais: "Apesar de todos os problemas que temos visto em todos os governos desde a redemocratização, os direitos sociais têm avançado. E a população percebe isso".

    A pesquisa foi feita entre 19 e 20 de fevereiro. Foram ouvidas 2.614 pessoas. A margem de erro é de dois pontos para mais ou para menos.

    ESQUECIMENTO

    O Datafolha também investigou a memória dos brasileiros em relação à ditadura.

    Três décadas após a campanha das Diretas-Já, quase um terço da população (32%) não sabe dizer se a ditadura deixou mais realizações positivas ou negativas.

    Editoria de Arte/Folhapress

    O índice é alto, levando-se em consideração o padrão tradicional de respostas "não sei" em pesquisas desse tipo.

    Uma hipótese é a já razoável distância temporal do regime militar. De cada três entrevistados, dois eram crianças, adolescentes ou não tinham nascido em 1985, quando João Figueiredo, o último presidente militar, deixou o Palácio do Planalto.

    Mas a explicação não é totalmente satisfatória, já que a taxa de "não sei" varia pouco conforme a idade –é alta até entre os mais velhos. O segmento que destoa é o da baixa escolaridade.

    No grupo dos que têm ensino fundamental, 41% não sabem avaliar.

    "Depois de tantos anos os efeitos da ditadura militar caem no esquecimento", afirma o filósofo José Arthur Giannotti.

    O maior contingente de entrevistados, de qualquer forma, diz que a ditadura deixou mais realizações negativas: 46% dos brasileiros pensam assim. É mais que o dobro dos que acham o contrário (22%).

    Para Giannotti, a pesquisa "revela a fantástica transformação das classes populares que ocorreu nos governos de Fernando Henrique Cardoso, com a estabilização da economia, e de Lula, com os programas de assistência social e formalização da força do trabalho".

    Nobre vê significado histórico no conjunto dos resultados: "Pela primeira vez dá para dizer que a ditadura foi ideologicamente derrotada".

    "Até pouco tempo era forte a ideia de que a ditadura havia deixado um legado positivo. Isso ruiu. É uma posição cada vez mais encastelada em grupos minoritários."

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