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    Pressão política fez TCE liberar licitação, diz e-mail da Alstom

    FLÁVIO FERREIRA
    MARIO CESAR CARVALHO
    DE SÃO PAULO

    24/05/2014 02h00

    O Metrô paulista pressionou o TCE (Tribunal de Contas do Estado) de São Paulo para que a corte liberasse uma licitação de interesse da Alstom, aponta e-mail encontrado na multinacional por autoridades federais. Uma semana após a mensagem, o TCE cassou uma decisão que bloqueava a concorrência e deixou que ela prosseguisse.

    O tribunal paulista resolveu o caso todo em 15 dias, com rapidez incomum. Em geral, processos como esse demoram de 30 a 60 dias.

    Posteriormente, a Alstom venceu a licitação com uma proposta acima do valor do orçamento elaborado pelo Metrô, o que é também inusual em concorrências com livre disputa entre empresas.

    O e-mail trata da licitação de 2005 da linha 2-verde do Metrô para implantação dos sistemas de trens do trecho entre as estações Ana Rosa e Alto do Ipiranga, no governo de Geraldo Alckmin (PSDB).

    A Alusa, concorrente da Alstom, pediu ao TCE para barrar a concorrência no dia 16 de fevereiro de 2005.

    Segundo a empresa, o Metrô colocou em um só pacote da licitação quatro sistemas de equipamentos que podiam ser vendidos separadamente. Esse tipo de concentração, de acordo com a Alusa, violava a Lei de Licitações.

    A legislação determina que os fornecimentos devem ser divididos sempre que possível, para aumentar a disputar e reduzir os preços.

    Em 19 de fevereiro de 2005, o então conselheiro do TCE Eduardo Bittencourt acolheu o argumento e suspendeu provisoriamente a licitação. Bittencourt chegou a ser afastado do TCE pela Justiça, sob suspeita de enriquecimento ilícito, em ação judicial sem ligação com o Metrô, mas depois reassumiu o cargo.

    Três dias depois, o diretor da Alstom Wagner Ribeiro enviou e-mail à colega Stephanie Brun para informar sobre a situação da concorrência.

    Disse que a apresentação das propostas da licitação estava bloqueada no TCE em razão da impugnação da Alusa, e que o "cliente" (o Metrô) havia colocado em ação um "esquema político" para liberar a entrega das ofertas.

    "A apresentação de propostas foi bloqueada pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo em razão de ação judicial da Alusa (empresa brasileira) contra o processo licitatório. O cliente colocou em prática um esquema político para liberar a apresentação das propostas", afirmou Ribeiro no e-mail.

    No dia seguinte, o plenário do TCE confirmou decisão favorável à Alusa. Porém, em 2 de março o plenário cassou a liminar concedida por ele mesmo e liberou a licitação, como queria a Alstom.

    O TCE aceitou o argumento técnico do Metrô de que a divisão no fornecimento dos equipamentos poderia comprometer a segurança e a confiabilidade dos sistemas.

    A decisão foi unânime. Um dos votos foi o de Robson Marinho, investigado sob suspeita de beneficiar a Alstom em contrato de 1998. Dois meses depois do julgamento, a empresa francesa venceu a licitação em consórcio com a alemã Siemens.

    Segundo delação feita pela Siemens em 2013 ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica, ela, a Alstom e outras empresas formaram um cartel para fraudar a licitação da linha 2.

    Rivaldo Gomes-20.mar.13/Folhapress
    Passageiros esperam para embarcar na estação Paraíso da linha 2-verde
    Passageiros esperam para embarcar na estação Paraíso da linha 2-verde

    OUTRO LADO

    O Metrô e o TCE-SP negam que tenha havido pressão de natureza política no julgamento de 2005 sobre a licitação da linha 2-verde.

    Em nota, o Metrô diz que "não adota, não autoriza e desconhece qualquer conduta como a sugerida no e-mail citado pela reportagem".

    Ainda segundo a nota, o Metrô "não pode responder pela troca de mensagens entre profissionais de outra empresa, em contexto desconhecido e ambiente externo à sua área administrativa".

    A estatal afirma que a impugnação da Alusa não foi bem-sucedida em razão da "indivisibilidade do objeto da concorrência e a possibilidade, prevista no edital e na lei, da formação de consórcios".

    O TCE informa que suas decisões "apoiam-se em considerações de ordem técnica e de conveniência do interesse público" e que a licitação da linha 2 não fugiu à regra.

    Quanto à rapidez no julgamento, a corte diz que "o prazo de apreciação deste processo não destoa da esmagadora maioria dos feitos da espécie. Nesse contexto, a expressão 'esquema político' soa extravagante".

    O advogado de Eduardo Bittencourt, Paulo Sérgio Santo André, afirma que as decisões no caso da licitação da linha 2 "pautaram-se pela estrita legalidade, tanto que posteriormente foram confirmadas pelo Plenário". O defensor diz que há irregularidades na ação judicial contra Bittencourt e a Justiça reconhecerá a inocência dele.

    A Alstom afirma que "não concluiu a avaliação do processo" e não se manifestou.

    Robson Marinho disse ao plenário do TCE em 14 de maio que nunca recebeu suborno de qualquer empresa.

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