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    Mensagens trocadas com doleiro eram sobre venda de terreno, diz deputado

    MARIANA HAUBERT
    DE BRASÍLIA

    02/09/2014 19h10

    Em depoimento ao Conselho de Ética na Câmara, o deputado Luiz Argôlo (SDD-BA) argumentou nesta terça-feira (2) que todas as mensagens que trocou com o doleiro Alberto Youssef, flagradas em investigações da Polícia Federal na Operação Lava Jato, se referiam apenas à cobrança que ele fazia para o pagamento de um terreno vendido ao doleiro pelo seu irmão, Manoelito Argôlo Jr., em Camaçari, Bahia.

    Em quase duas horas e meia de depoimento, Argôlo refutou as acusações de que é sócio de Youssef em empresas fantasmas e que teria recebido dinheiro do doleiro. O deputado afirmou que conheceu Youssef como um empresário que tinha interesses de investir na região norte do Estado, reduto político do parlamentar, e que se aproximou do doleiro quando seu irmão, Manoelito Argôlo, vendeu um terreno a ele no início de 2013. "Não o conheci com um cartão de apresentação: 'sou doleiro'. Eu o conheci como um investidor que poderia investir na minha região", disse.

    Argôlo responde a um processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética devido ao seu envolvimento com Youssef. O deputado é acusado de ter usado dinheiro público da Câmara dos Deputados para viajar e se reunir com o doleiro. Youssef está preso desde março e é investigado por um esquema que teria desviado R$ 10 bilhões. Ele adiantou seu depoimento que estava marcado para acontecer nesta quarta-feira (3).

    Dessa forma, o relator do caso, deputado Marcos Rogério (PDT-RO), encerrou a fase de instrução do processo. Ele apresentará seu relatório no próximo dia 10. Se considerar que houve quebra de decoro, ele poderá pedir a cassação do seu mandato.

    Argôlo contou que assumiu as negociações com o doleiro porque, segundo ele, seu irmão passou por problemas de saúde e familiar que o limitaram nas tratativas. Segundo o deputado, Youssef fez a oferta para a compra do terreno ainda em 2012, que foi fechado em torno de R$ 375 mil. Youssef teria depositado um sinal mas não teria concluído o pagamento até hoje.

    De acordo com investigação da Polícia Federal, Argôlo e o doleiro trocaram 1.411 mensagens entre 14 de setembro de 2013 e 17 de março de 2014. O celular usado por Argôlo está registrado em nome da Câmara, de acordo com a PF.

    Argôlo explicou que, inicialmente, Youssef havia prometido quitar a dívida por meio de transferências bancárias. Depois mudou de ideia e disse que iria sacar o valor e pagar em dinheiro. Com a demora, Argôlo afirmou que enviou diversas mensagens para ele cobrando o pagamento rapidamente. Como solução, Youssef propôs que o deputado repassasse para ele uma lista com empresas com as quais Argôlo tinha negócios para que ele depositasse diretamente a elas.

    "Todos os diálogos que se falam em valores são relativos a esse imóvel. Foram feitas várias cobranças mas dos mesmos valores. [...] Encaminhei várias contas a eles, e em 95% dessas contas não foi feito o pagamento. Depois ele disse que ia sacar e fazer o pagamento à vista. Mas ele não fez nada disso", disse. Argôlo afirmou, no entanto, que Youssef havia feito alguns depósitos que totalizavam entre R$ 180 mil a R$ 200 mil.

    Questionado pelo Rogério sobre o por quê de não ter cancelado o negócio mediante o não pagamento, Argôlo afirmou apenas que o doleiro já havia feito o pagamento do sinal, um valor inicial para garantir o negócio, e que, por se tratar de um grande empresário, proprietário de dois grandes hotéis no Estado, ele não poderia imaginar que Youssef não faria o pagamento do terreno.

    "Eu nunca iria imaginar que ele não teria a possibilidade de efetuar o pagamento. E no período em que ele teve um infarto eu parei de cobrar. Quando se recuperou, ele prometeu que iria pagar em três meses. Eu falei para ele que se ele não concluísse o pagamento, ele perderia o sinal que foi dado", afirmou Argôlo. De acordo com o deputado, o terreno ainda está registrado em nome de seu irmão.

    CONTADOR

    Argôlo acusou a contadora de Youssef, Meire Poza, de ter pedido R$ 250 mil a ele para que não prestasse depoimento à Polícia Federal. Segundo informações prestadas pela contada à PF, o deputado seria chefe informal de Youssef na empreiteira Malga Engenharia. Argôlo era o parlamentar mais próximo de Youssef, segundo dados reunidos pela Polícia Federal na Operação Lava Jato.

    "Ela é uma criminosa", disparou Argôlo. Ele argumentou que ela só prestou depoimento porque a PF apreendeu documentos em sua casa. Segundo Argôlo, Meire jantou com seu advogado, Aluísio Lundgren Régis, uma semana antes de ter dado entrevista à revista "Veja". No encontro, o advogado teria dito que seu cliente não daria a ela qualquer quantia. Argôlo afirmou que agora está concentrado na sua defesa na Câmara e nas eleições –ele é candidato à reeleição– mas quando o período acabar prometeu processar Poza e "várias outras pessoas".

    Segundo investigações da PF, Youssef chegou a entregar dinheiro no apartamento que a Câmara dos Deputados cede a Argôlo, de acordo com a PF. O deputado, por sua vez, usou recursos da Câmara para pagar passagem e hotel para encontros com o doleiro.

    A Malga é uma das três empresas de Youssef que não eram de fachada (as outras são a Web Hotéis e a rede de agência de viagens Marsans), ainda segundo documentos apreendidos pela PF.

    A empreiteira é dona de máquinas, caminhões e chegou a ser subcontratada pela Delta para duplicar uma estrada no Paraná, a BR 163, num contrato de R$ 115 milhões do Dnit (Departamento Nacional Infraestrutura de Transportes Terrestres).

    Há suspeitas de que Argôlo tenha conseguido o contrato por meio de seus contatos políticos no órgão. A Delta é suspeita de tantas irregularidades que hoje é proibida de celebrar contratos com o governo federal.

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