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    Corrupção não é o principal problema dos brasileiros, diz Mangabeira Unger

    DE SÃO PAULO

    05/11/2014 15h50

    Declarando-se à disposição da presidente Dilma Rousseff (PT) para colaborar no seu segundo mandato, "dentro ou fora" do governo, o filósofo Roberto Mangabeira Unger, 67, afirmou em sabatina realizada pela Folha nesta quarta-feira (5) que a corrupção não é o principal dos problemas brasileiros.

    "Há um fato que ninguém quer reconhecer: entre os grandes países em desenvolvimento, especificamente os Brics, Índia, China e Rússia, o Brasil é, de longe, o menos corrupto. Embora as pessoas em geral, sobretudo a classe média, não queiram reconhecer isso, é uma verdade inconveniente. Nós temos corrupção no Brasil, mas não é um dos nossos problemas maiores, ao contrário do que pensa uma grande parte da população. É um problema de suscetível solução", disse.

    Ex-ministro do governo Lula, quando ocupou a Secretaria de Assuntos Estratégicos entre 2007 e 2009, e professor da Faculdade de Direito de Harvard (EUA), Mangabeira disse que é preciso atacar a causa maior da corrupção, que é o financiamento das campanhas políticas. Ele defendeu o financiamento público em substituição ao privado, "sobretudo o corporativo".

    "[A corrupção] é um problema que podemos solucionar. O que não podemos permitir é que esses assuntos da moralidade substituem o conteúdo da reorientação. Vivemos sempre nessa sedução, ataques periódicos de moralismo que depois se esvaem e não deixam nenhum legado", afirmou.

    Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
    Mangabeira Unger participa de sabatina no auditório da *Folha*, em São Paulo
    Mangabeira Unger participa de sabatina no auditório da Folha, em São Paulo

    O professor rememorou suas contradições em relação ao governo Lula. Em artigo publicado na Folha em novembro de 2005, na esteira do escândalo do mensalão, Mangabeira Unger escreveu que o governo do petista era o mais corrupto da história nacional e pedia o impeachment do então presidente. Menos de dois anos depois, o professor entrava no Palácio do Planalto como ministro.

    "Fui crítico do primeiro governo Lula. Mas ele magnanimamente me convenceu a trabalhar pelas mudanças do país", justificou-se na sabatina mediada pelos repórteres especiais Morris Kachani e Fabiano Maisonnave, e pelo repórter de Poder Ricardo Mendonça.

    Ao comentar as diferentes personalidades de Lula e Dilma, que foi sua colega em Brasília naquele período, o filósofo disse que ele tinha uma "grande intuição no trato pessoal", enquanto ela tem uma formação distinta, de afirmação nacional. "A presidente Dilma militou comigo no PDT, na época do Brizola. Ela tem uma visão que nos aproxima, de usar o poder do Estado para construir alternativas. Mas isso precisa ser reestruturado, precisamos dar nova forma a isso. O nacional-desenvolvimentismo não é mais suficiente".

    O professor encaixou o primeiro mandato de Dilma Rousseff no final de um ciclo, segundo ele iniciado com a estabilização monetária e a eleição de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1994.

    "Houve uma democratização da demanda, ampliação do consumo. Foi a base de nosso modelo de crescimento, ao lado da exportação de commodities. Mas esse modelo de crescimento está esgotado. Precisamos de um novo ciclo, da democratização do acesso aos recursos e às oportunidades da produção. É a democratização da oferta, não mais da demanda. Gostaria que o segundo mandato de Dilma representasse o início desse ciclo".

    Por fim, o filósofo e professor de Harvard afirmou que vai rodar o Brasil defendendo uma nova política nacional. "Estou sempre nessa situação, fazendo campanha sem campanha, em um estado permanente", disse Mangabeira, que já assessorou políticos como Leonel Brizola e Ciro Gomes, além de já ter sido filiado ao PRB, partido ligado à Igreja Universal do Reino de Deus. Ele cogitou ser candidato à Presidência em 2006, sendo apoiado, à época, por Caetano Veloso.

    "Tenho muita esperança no segundo mandato de Dilma e muita vontade de colaborar, como estou fazendo agora. Não preciso estar dentro do governo para colaborar", finalizou.

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