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    Empresas privatizadas impedem acesso a documentos da ditadura

    MARCO ANTÔNIO MARTINS
    DO RIO

    04/01/2015 02h00

    Empresas que eram estatais na época da ditadura (1964-1985) e que, segundo documentos oficiais e depoimentos de ex-funcionário, colaboraram com os órgãos da repressão, vêm se negando a liberar esse material histórico a pesquisadores.

    O Arquivo Nacional tenta fazer com que firmas privatizadas como CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), Usiminas e Embraer entreguem os registros do período, uma obrigação para estatais e ex-estatais, de acordo com uma lei de 1991 que dispõe sobre arquivos públicos e privados.

    Segundo os pesquisadores, algumas ex-estatais colaboravam com o extinto SNI (Serviço Nacional de Informações), produzindo documentos sobre seus empregados e figuras de destaque nas cidades onde foram instaladas, como advogados e políticos.

    Após a ditadura, 41 empresas federais foram privatizadas até 2005. Nem a Comissão Nacional da Verdade, encerrada em dezembro, conseguiu acesso a esses materiais.

    Há menções à atuação de algumas dessas empresas em documentos do extinto Dops (Departamento de Ordem Política e Social), que estão no Arquivo Nacional, e no Arquivo Público de São Paulo.

    O processo mais adiantado de acesso a esses arquivos vem sendo conduzido pela Comissão da Verdade do Estado do Rio e pela de Volta Redonda junto à CSN.

    Em novembro, uma reunião entre representantes das comissões e da empresa abriu caminho para a cessão dos documentos. Mas ainda não há data definida para tal.

    O Ministério Público Federal também tenta acesso aos papeis da CSN. O procurador Júlio José Araújo cita o envolvimento de militares com a empresa mesmo após a redemocratização. Em 1988, uma greve local foi encerrada com uma intervenção militar que resultou na morte de três trabalhadores. Cinco anos depois, a firma foi privatizada.

    "Havia dois arquivos na empresa: o do Recursos Humanos e um outro, coordenado por um coronel que acompanhava a atuação política de funcionários, advogados e políticos", afirma Edgard Bedê, pesquisador da Comissão da Verdade do município.

    O presidente da comissão, Alex Martins, enviou à empresa uma lista com 70 nomes de trabalhadores que teriam sido perseguidos e demitidos por sua atuação política.

    INTERCÂMBIO

    As pesquisas sugerem que militares agiam cotidianamente no interior de estatais produzindo relatórios para a repressão.

    Sugerem também que essas empresas não atuavam isoladas. Em alguns casos, elas se uniam para trocar informações e aumentar a área de influência.

    O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos (SP) cedeu à Comissão Nacional da Verdade documentos comprovando a criação de um grupo chamado Cecose (Centro Comunitário de Segurança do Vale do Paraíba), que teria servido para o intercâmbio de informações.

    O Cecose reuniu ao menos 25 firmas, entre elas a Embraer e Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista).

    Procuradas pela Folha, CSN, Embraer e Uniminas não se pronunciaram.

    Homero Sérgio/Folhapress
    Militares na intervenção para combater a greve da CSN em 1988, em Volta Redonda (RJ)
    Militares na intervenção para combater a greve da CSN em 1988, em Volta Redonda (RJ)

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