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    Lava Jato

    Tesoureiro e lobista pediram doações ao PT, diz executivo em depoimento

    ALEXANDRE ARAGÃO
    FLÁVIO FERREIRA
    MARIO CESAR CARVALHO
    DE SÃO PAULO

    17/03/2015 19h41

    O vice-presidente da Engevix Gerson de Mello Almada afirmou em depoimento ao juiz federal Sergio Moro, no âmbito da Operação Lava Jato, que o lobista Milton Pascowitch e o tesoureiro nacional do PT, João Vaccari Neto, pediram que a empreiteira fizesse doações eleitorais ao partido. A construtora realizou as contribuições, segundo Almada.

    "Como ele [Milton Pascowitch] tinha um relacionamento com o PT, na Diretoria de [Engenharia e] Serviços [da Petrobras], também ele trazia pedidos não vinculados a obras, mas vinculados a doações para o partido nas épocas de eleições ou em dificuldades de caixa do partido", disse Almada.

    Na época, o diretor à frente da seção era Renato de Souza Duque, que teria sido indicado pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu ao cargo.

    Ainda de acordo com Almada, entre 0,5% e 1% dos contratos celebrados entre a Engevix e a Petrobras intermediados por Milton Pascowitch, eram repassados ao lobista —o empresário, no entanto, diz não saber qual era a destinação final dos valores. Ele afirmou, no entanto, que Pascowitch teria posto como condição o pagamento a ele para que a Engevix "ficasse bem com o partido político", referindo-se ao PT.

    "Teve um ano eleitoral em que foram feitas duas doações para o PT", continua Almada, que afirma não se recordar dos valores exatos das doações. Segundo o executivo, os detalhes das contribuições eram acertados com João Vaccari Neto, tesoureiro nacional da sigla.

    Segundo Almada, o repasse para um lobista era uma "tradição" na diretoria de Serviços comandada por Duque. "Já era uma tradição, desculpe usar esse termo, mas depois a gente pode até mudar, porque eu já tinha esse vínculo com os contratos da diretoria de Serviços. Já existia um tipo de relacionamento partidário, de pessoas que faziam o meio de campo entre eu, a empresa e os partidos".

    Em um dos trechos do depoimento, Almada sugeriu que os pagamentos eram feitos como resultado de extorsão. "Foram pagos valores que garantiam que a gente continuasse trabalhando. Se você não fizesse isso você tinha sérias ameaças de não pagamento, não participação em novas concorrências, penalizações. Sempre de maneira velada, muito educada, mas sempre deixando transparecer que isso existia", disse.

    Almada também afirmou que fez repasses de "comissões" ligadas a contratos da Petrobras para o doleiro Alberto Youssef, que se apresentava como um representante do PP (Partido Progressista), após pedidos do deputado José Janene (PP-PR), morto em 2010.

    Porém, indagado pelo juiz Sergio Moro se os pagamentos correspondiam a propina, ele qualificou de lobby as ações de Pascowitch e Youssef.

    Almada é um dos executivos de empreiteiras presos na carceragem da PF no Paraná após uma das fases da Lava Jato.

    JOSÉ DIRCEU

    Almada diz, ainda, que contratou o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu para representar a Engevix no exterior após o petista colocar-se "à disposição". A empreiteira celebrou um contrato com a JD Assessoria, empresa de Dirceu, por aproximadamente um ano, de acordo com o empresário.

    "Após a saída do ministro José Dirceu [do governo, em 2005], nós tivemos uma primeira reunião, em que ele colocou-se à disposição para fazer um trabalho junto à empresa no exterior", relatou Almada. "Basicamente voltado a vendas da Engevix em toda a América Latina, Cuba e África, que é onde ele tinha um capital humano de relacionamento muito forte."

    No depoimento, o empreiteiro detalhou três reuniões com Dirceu, sempre intermediadas por Pascowitch, amigo do ex-ministro. Eles fecharam contrato para que o petista representasse a Engevix no Peru e em Cuba. Almada elogia os contatos de Dirceu: "Fala com todo o mundo, bota você nas melhores coisas".

    Questionado sobre quanto pagou pelos serviços, o vice-presidente da Engevix disse não se recordar. "Posso levantar, mas não me recordo. Deve ser coisa de quatro, cinco anos atrás, não é recente", afirmou. A Justiça determinou a quebra do sigilo da empresa JD Assessoria —há pagamentos da Engevix que somam R$ 1,285 milhão.

    O empresário disse que Dirceu nunca fez pedidos de doações eleitorais a ele. Sobre as doações da Engevix a Zeca Dirceu (PT-PR), filho do ex-ministro, o executivo afirmou que o pedido foi feito por Milton Pascowitch, amigo pessoal de Dirceu.

    OUTRO LADO

    O PT e o tesoureiro do partido João Vaccari Neto afirmam em nota que a legenda partidária só recebe valores lícitos e por meio de doações registradas no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

    O PP afirma que "não compactua com atos ilegais e acredita na justiça para revelar a verdade".

    Em nota, a assessoria de José Dirceu aponta que a empresa do ex-ministro, a JD Assessoria e Consultoria, "prestou serviços à Engevix de 2008 a 2011 com o objetivo de prospecção de negócios no exterior, sobretudo Peru e Cuba, conforme declara o executivo Gerson Almada em seu depoimento à Justiça nesta terça-feira".

    Segundo a nota, "O contrato com a JAMP Engenharia [empresa do consultor Milton Pascowitch] foi assinado em março de 2011 depois que o executivo Milton Pascowitch, que trabalhou na Engevix, deixou a companhia e passou a trabalhar como consultor para a construtora. O contrato da JD com a JAMP teve o mesmo propósito: prospectar negócios para a Engevix no exterior."

    A Folha não localizou a defesa de Milton Pascowitch.

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