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    Lava Jato

    SBM escondeu do mercado que foi informada sobre propina na Petrobras

    LEANDRO COLON
    DE LONDRES

    25/05/2015 12h08

    Uma gravação mostra que a SBM Offshore escondeu do mercado no ano passado ter sido informada pelo Ministério Público da Holanda de que funcionários da Petrobras receberam propina de esquema com a empresa.

    No dia 6 de agosto de 2014, a empresa holandesa, fornecedora da Petrobras, divulgou o balanço financeiro do primeiro semestre do ano.

    Ao falar do Brasil em "conference call", quando a cúpula fica a disposição do mercado para comentar o balanço, o CEO, Bruno Chabbas, informou apenas que uma investigação interna não havia identificado irregularidades em relação aos contratos com a Petrobras.

    "Nós não encontramos nada impróprio no Brasil", disse. "O mesmo foi feito pela Petrobras", ressaltou o executivo.

    Participavam da reunião analistas de grupos prestigiados, como Morgan Stanley, UBS e ABN AMRO.

    A SBM omitiu uma informação crucial de que três meses antes, em maio de 2014, foi comunicada pelos procuradores holandeses da descoberta de provas que o lobista Julio Faerman, seu representante no Brasil, pagara propina a servidores da estatal brasileira.

    Naquele mesmo mês, a SBM repassou a informação em sigilo à Petrobras, que informou então a CGU (Controladoria-Geral da União). Um documento enviado em junho pela CGU ao Ministério da Justiça diz que a SBM havia relatado que "alguns milhões de dólares foram pagos para funcionários da Petrobras por meio de seu anterior representante no Brasil".

    Mesmo de posse desses detalhes, a SBM disse na apresentação do balanço público que nada havia sido encontrado.

    O CEO da empresa afirmou ainda que "questões políticas" do Brasil estavam em curso. Segundo ele, era importante colocar no "contexto" a "questão geral política que existe no Brasil e o distúrbio que isso pode criar". "Há um componente político nesse estágio no Brasil que pode impactar a relação um pouco mais", disse.

    ACORDO

    No dia 12 de novembro, após as eleições presidenciais, a SBM e o Ministério Público holandês, vinculado ao governo local, anunciaram acordo em que a empresa pagou US$ 240 milhões como punição por pagamentos de propina no Brasil, em Angola e na Guiné Equatorial, encerrando caso. Naquele mesmo dia, a CGU abriu processo contra a empresa no Brasil.

    A reunião de 6 de agosto revela também que a empresa já havia feito uma previsão de US$ 240 milhões para serem gastos com algo ligado às investigações –ou seja, já teria ciência da multa a ser paga, mas anunciada apenas em novembro.

    Até hoje, oficialmente, a SBM, que negocia acordo de leniência com o governo brasileiro, não admite que subornou funcionários da estatal. Argumenta que soube disso pelos procuradores holandeses. A empresa alega que seus repasses foram feitos a seu representante no Brasil, Julio Faerman, que recebeu US$ 139 milhões em comissões entre 2007 e 2011.

    A gravação de 6 de agosto foi entregue à CPI da Petrobras pelo ex-diretor da SBM Jonathan Taylor, delator do esquema de corrupção. Ele depôs aos membros da comissão no último dia 19 na Inglaterra. À CPI, assim com havia feito em entrevista à Folha, ele voltou a acusar a SBM de estar em conluio com a CGU, a Petrobras e as autoridades holandesas para esperar as eleições presidenciais para agir.

    "No dia 6 de agosto, a empresa estava dizendo para o mundo tudo que tudo estava bem em relação ao Brasil, quando já sabia que propinas foram pagas. A SBM mentiu", disse Taylor aos deputados.

    OUTRO LADO

    A SBM Offshore disse à Folha que a informação das autoridades holandesas de que havia provas de propina à Petrobras não foi revelada ao mercado porque "não era suficientemente específica" para ser divulgada na época.

    Sobre o fato de o CEO, Bruno Chabbas, citar "questões políticas" no Brasil na reunião com investidores e analistas, a empresa afirmou que o executivo estava "meramente reconhecendo a sensibilidade do assunto, intensificado pelos debates políticos em curso no país no momento".

    O caso de corrupção entre a SBM e a Petrobras foi revelado em fevereiro do ano passado pela mídia holandesa depois que detalhes do esquema foi divulgado meses antes numa página da Wikipedia. A empresa acusa seu ex-diretor Jonathan Taylor pela publicação e diz que ele tentou extorqui-la em troca do silêncio –o que ele nega.

    A partir de então, a Petrobras, a CGU e o Ministério Público Federal no Rio de Janeiro anunciaram investigação das denúncias. Os contratos da SBM com a Petrobras, ligados ao fornecimento de plataformas de exploração de petróleo, somam US$ 27 bilhões.

    -

    OUÇA A GRAVAÇÃO, EM INGLÊS

    Ouça

    No dia 6 de agosto, o CEO da SBM, Bruno Chabbas, diz ao mercado que nada foi encontrado em relação ao Brasil e destaca relação com a Petrobras. A seguir, a transcrição:

    "In particular related to Brazil. So what I intend to do here is really to address the Brazil points and really not come back to that."

    (Em particular relacionado ao Brasil. O que eu pretendo fazer aqui é realmente abordar pontos sobre o Brasil e não voltar a isso)
    (..)

    "So let me recap a bit what has been done. First of all, we published the result of our investigation on April 2 of this year stating that we didn't find anything improper in Brazil. That's our internal investigation. The same was done by Petrobras roughly in the same period after Petrobras had done their own internal investigation."

    (Deixe-me recapitular um pouco o que tem sido feito. Primeiramente, nós publicamos o resultado de nossa investigação no dia 2 de abril deste ano declarando que não encontramos nada impróprio no Brasil. Essa é a nossa investigação. O mesmo foi feito pela Petrobras aproximadamente no mesmo período, Petrobras tinha feito sua própria investigação interna)

    Now, despite all of this it was decided that we were not going to tender the two upcoming projects. It was a decision made by Petrobras that we concur with them, and it needs to be put into context of, first of all, obviously our own investigation but, more importantly, the overall political issue which exists in Brazil and the disruption that this can create.

    (Agora, apesar de tudo isso, foi decidido que nós não estaríamos concorrendo em dois projetos que estavam por vir. Foi uma decisão tomada pela Petrobras a qual concordamos com eles. E isso precisa ser colocado no contexto, primeiramente, obviamente nossa própria investigação, mas, mais importante, a questão geral política que existe no Brasil e o transtorno que isso pode criar)

    Having said all of this, what can be said is that the relationship of SBM Offshore and Petrobras has been a long relationship. We have been working together for more than 50 years. We have been working together to the benefits of both companies, and there is a lot of vested interest for it to get back to an even keel and to work together in the future.

    (Dito tudo isso, o que pode ser dito é que a relação da SBM Offshore com a Petrobras tem sido longa. Nós temos trabalhado juntos por mais de 50 anos. Nós temos trabalhado juntos em benefício das duas companhias, e há muito interesse estabelecido para que isso retorne a um certo equilíbrio para trabalharmos juntos no futuro.)

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