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    Lava Jato

    Aliada de Cunha fez requerimento a pedido de corretor ligado ao deputado

    RUBENS VALENTE
    DE BRASÍLIA

    18/06/2015 12h55

    Suspeita de ter ajudado o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a pressionar empresas envolvidas no esquema de corrupção na Petrobras, a ex-deputada federal Solange Almeida (PMDB-RJ) apresentou em 2009 requerimento relacionado a interesses do corretor de valores Lucio Bolonha Funaro. Em 2005, Funaro respondeu a suspeitas de ter bancado despesas pessoais de Cunha —na época, ambos negaram irregularidades.

    Solange solicitou à Câmara, em 2009, que o presidente da Schahin Engenharia, Milton Schahin, fosse ouvido em uma das comissões da Casa sobre o rompimento de uma barragem de uma hidrelétrica que provocou a inundação de parte de um município em Rondônia.

    O jornal "O Globo" divulgou nesta quinta-feira (18) reportagem sobre a apresentação do requerimento feito pela aliada de Cunha.

    O requerimento para ouvir o executivo da Schahin Engenharia foi feito após um pedido de Lucio Bolonha Funaro.

    O corretor confirmou à Folha, por meio e-mail enviado pela sua advogada Beatriz Catta Preta, que por volta de 2009 esteve com Solange e sua assessoria em um almoço, num restaurante em Brasília, quando relatou a necessidade de a Câmara apurar um assunto que colocaria contra a parede a Schahin.

    Na época, um grupo empresarial representado por Funaro, a Cebel (Centrais Elétricas Belém), e a Schahin travavam uma disputa avaliada em R$ 150 milhões na Justiça do Rio em torno de prejuízos gerados pelo rompimento da barragem, durante a construção de uma central hidrelétrica em Vilhena (RO).

    Ed Ferreira/Folhapress
    O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, investigado pela Lava Jato, comanda sessão no plenário da Casa
    O presidente da Câmara, Eduardo Cunha —investigado pela Lava Jato—, comanda sessão no plenário

    O requerimento apresentado por Solange, em novembro de 2009 na Comissão de Seguridade Social e Família, atendia aos interesses da Cebel e de sua controladora, a Gallway —sediada no exterior e representada por Funaro, na disputa com a Schahin.

    Solange, atualmente prefeita de Rio Bonito (RJ), queria, com seu requerimento, promover uma audiência pública para ouvir o executivo da família Schahin e representantes de fundos de pensão, entre outras pessoas, "a fim de prestarem esclarecimentos sobre os prejuízos causados pela interrupção do empreendimento da barragem". A audiência não chegou a ser realizada.

    Funaro afirmou à reportagem que na conversa com Solange "explicou a gravidade" do problema em Rondônia, na época "o maior acidente ecológico da Amazônia Legal". Segundo ele, o acidente "afetou milhares de pensionistas de fundos de pensões estatais, uma vez que suas patrocinadoras tinham investido dinheiro na compra de cédulas de crédito bancário que financiaram a obra".

    Funaro disse ter explicado a Solange que as empresas do consórcio construtor (Schahin e Eit) não tomaram nenhuma providência quanto ao acidente e que a Cebel foi multada em R$ 100 milhões por órgãos ambientalistas.

    O corretor disse que o evento "provocou danos financeiros seriíssimos aos fundos de pensão" de funcionários da Petrobras (Petros), da companhia de água e esgoto do Rio (Prece) e das centrais elétricas de Santa Catarina (Celos), "o que afeta sua rentabilidade e, consequentemente, a equação de pagamento da seguridade social de seus patrocinados".

    O requerimento de Solange foi localizado pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP), membro da CPI da Petrobras, que pediu em plenário uma apuração sobre o assunto. Ao ser indagado pelo deputado, no último dia 27, em sessão na comissão parlamentar de inquérito, sobre o requerimento de Solange que citava seu nome, Milton Schahin disse que ainda não era o momento de se manifestar sobre o assunto —ele se recusou a responder todas as perguntas naquele dia.

    APARTAMENTO

    Em 2005, a imprensa revelou que Cunha morava em um apartamento em um hotel em Brasília de propriedade de Funaro. Cunha afirmou na Justiça que foi apenas "sublocatário" do imóvel anteriormente sublocado a Funaro "em razão de contrato efetivado por sua chefe de gabinete e jamais teve qualquer tipo de relacionamento" com o corretor.

    Outra ligação foi relatada no passado entre Cunha e Funaro —investigado no escândalo do mensalão por ligações com a Garanhuns, que fazia pagamentos ao Partido Liberal, hoje PR. Um aliado do deputado, Lutero Cardoso, nomeado nos anos 90 para a presidência da companhia de água e esgoto do Rio a partir de uma indicação de Cunha, foi consultor da empresa da qual Funaro é representante, a Gallway.

    Cunha é alvo de inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal) em desdobramento da Operação Lava Jato, que investiga o pagamento de propinas na Petrobras. O doleiro Alberto Youssef disse, em sua delação premiada, que Cunha se beneficiava do esquema de corrupção e que, por meio de aliados, apresentou requerimento para pressionar uma das empresas a retomar o pagamento de propina.

    A Folha revelou que Cunha aparece como autor dos arquivos digitais de dois requerimentos justamente da ex-deputada Solange Almeida contra a empresa Mitsui, fornecedora da Petrobras.

    OUTRO LADO

    Cunha afirmou à Folha, na quinta passada (11), que não mantém negócios com o corretor Lucio Bolonha Funaro: "Eu não o vejo há muito tempo. Conheço, sei quem é, já estive com ele algumas vezes, mas não tenho relacionamento cotidiano com ele, não. Não é pessoa que faça parte das minhas relações cotidianas".

    Sobre o imóvel ocupado por ele em 2005, o deputado disse que não teve suas despesas bancadas pelo corretor.

    "Ele [Funaro] alugava um apartamento no hotel e eu processei quem publicou aquela matéria", afirmou o presidente da Câmara. "Se você chega para alugar um apartamento em um hotel, não significa que você tenha que saber de quem é", disse Cunha.

    O deputado afirmou ainda que não pode responder pelo "fato de eventualmente conhecer ou ter conhecido qualquer pessoa que por ventura um outro [deputado] se faça um requerimento".

    Sobre o requerimento de Solange, Cunha disse que a pergunta deveria ser dirigida à ex-deputada. "Eu não conversava com a deputada Solange sobre os atos dela no mandato dela. [...] Ela é responsável pelos atos do mandato dela, não eu", disse o deputado. A respeito das dúvidas sobre o requerimento, Cunha disse que "a CPI é sobre a Petrobras, não de outra coisa".

    Funaro disse à Folha que "nunca pagou qualquer conta" de Cunha, "sendo certo que as matérias vinculadas a esse respeito foram alvo de processos judiciais". Ele também "negou veementemente ter tratado de assuntos ligados a quaisquer requerimentos" com Cunha.

    Segundo a advogada Beatriz, Funaro é "representante dos fundos controladores da Gallway desde 2003, mas não exerce atividade executiva no grupo".

    "Meu cliente ressalta que se a Petrobras e as autoridades competentes tivessem ao menos analisado as denúncias formalizadas pela Cebel e suas coligadas desde 2009, alguns bilhões de dólares não teriam sido desviados dos cofres públicos brasileiros", afirmou a advogada.

    Procurada desde a semana passada por meio da assessoria de imprensa da prefeitura de Rio Bonito (RJ), Solange Almeida não havia se manifestado até a publicação deste texto.

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