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    Empresários e parentes de políticos ocupam cargos na Assembleia da BA

    JOÃO PEDRO PITOMBO
    DE SALVADOR

    14/08/2015 12h01

    Christophe Simon/AFP
    O presidente da Assembleia Legislativa da Bahia, deputado Marcelo Nilo (PDT)
    O presidente da Assembleia Legislativa da Bahia, deputado Marcelo Nilo (PDT)

    A filha do ex-prefeito Zito (PSD), de Canudos (a 484 km de Salvador), é enfermeira no hospital municipal e dona de uma loja no comércio local. A filha do ex-prefeito Antônio Marques (PSC), de Sítio do Quinto (a 381 km da capital baiana), também tem loja no comércio de sua cidade.

    Além dos pais políticos e tino para os negócios, as duas têm outra coisa em comum: foram nomeadas para cargos na Assembleia Legislativa da Bahia, em Salvador.

    É lá que há nove anos quem comanda é um aliado político de seus respectivos pais: o presidente da Assembleia, Marcelo Nilo (PDT), que em 2014 foi o deputado estadual mais votado em Sítio do Quinto e o quarto mais votado em Canudos.

    As nomeações das filhas dos ex-prefeitos não são uma exceção. Por meio de contratos temporários, cujas nomeações não são publicadas em "Diário Oficial" e que não são alvo de fiscalização, a Assembleia baiana nomeou ao menos 40 políticos ou parentes.

    Previstas, no Reda (Regime Especial de Direito Administrativo), as nomeações são contestadas pelo Ministério Público da Bahia, que tenta anulá-las na Justiça com o objetivo de garantir a convocação de aprovados em concurso feito em 2014.

    A Folha conseguiu com exclusividade duas listas com os nomes dos nomeados: uma de dezembro de 2012 e outra de março de 2015. Antes, a reportagem havia realizado, por seis meses, tentativas fracassadas de obter a relação via Lei de Acesso à Informação.

    Na primeira delas, com 641 nomeados, os salários variavam de R$ 600 a R$ 6.000. Na deste ano, eram 633 contratados.

    Entre os políticos nomeados estão os ex-deputados Getúlio Ubiratan, Ewerton Souza, José Emídio Tavares e Vespasiano Santos, além de ex-prefeitos e ex-vereadores.

    Na lista dos parentes, há lugar para o neto do ex-deputado Luiz de Deus (DEM), um primo do deputado Leur Lomanto (PMDB) e uma filha da deputada federal Moema Gramacho (PT).

    Ainda foram nomeados a advogada Maria Josselia –mulher do desembargador aposentado Clécio Carrilho Rosa– e donos de rádios, clínica veterinária e até sex shop.

    Dois empresários que depois viriam a ser arrolados pela Justiça como suspeitos de fraude em licitação e desvios de recursos públicos também estão entre os nomeados.

    Com base na soma da remuneração dos 641 temporários que estavam nomeados em 2013, estima-se que Assembleia gastou cerca de R$ 20 milhões apenas com os salários-base naquele ano.

    PRAZO DETERMINADO

    Para o procurador-geral do Ministério Público, Márcio Fahel, as contratações temporárias devem ocorrer só por tempo determinado e para atender situações de excepcional interesse público.

    "Entendemos que qualquer outra modalidade de contratação que não o concurso público deve ser adotada de forma residual", diz.

    Atualmente, a Assembleia tem 2.800 funcionários, sendo 327 concursados, 671 temporários e o restante de secretários parlamentares. Dos cem aprovados no concurso feito em 2014 –o primeiro em oito anos–, só 17 foram nomeados.

    Presidente da Assembleia pelo quinto mandato consecutivo, Marcelo Nilo transita bem entre governistas e oposicionistas e é considerado um "cumpridor de acordos". A relação dos nomeados por Reda, afirmam deputados sob anonimato, seria um reflexo dessa forma de atuação de Nilo.

    Assim como indicação de temporários, outras benesses como bolsas de estudo em universidades eram distribuídas entre os deputados.

    Reportagem de Folha publicada em março mostrou que doadores de campanha, políticos e parentes constavam entre os bolsistas que, em tese, seriam para estudantes carentes. O programa foi encerrado em 2014 após questionamento da Promotoria.

    OUTRO LADO

    O presidente da Assembleia da Bahia, Marcelo Nilo (PDT), nega a utilização das nomeações temporárias como moeda de troca com políticos e afirma que os cargos são necessários para o "bom funcionamento da Casa". Ele afirma que os funcionários foram selecionados por meio de análise de currículo e obtiveram os cargos tão somente por "mérito".

    "Se eles [políticos e seus parentes] fazem a seleção e passam, o que eu posso fazer?", questiona Nilo.

    Só parentes de primeiro grau dos deputados estaduais, diz ele, são impedidos de assumir esses cargos.

    Ele diz ainda que a filha do ex-prefeito de Sítio do Quinto já não trabalha mais na Assembleia e que a filha do ex-prefeito de Canudos é enfermeira da Assembleia. Contudo, segundo o sistema do SUS, Mirele Borges da Gama trabalha num hospital municipal em sua cidade.

    "Ela dá plantão três dias na Assembleia [em Salvador] e três dias em Canudos", justificou Nilo. As duas cidades estão a 481 km de distância.

    Sobre as nomeações dos concursados, Nilo diz que firmou acordo com o Ministério Público e vai contratar os aprovados na medida em que as vagas surgirem. E prometeu divulgar os nomes e salários de todos os funcionários da Assembleia na internet até o fim do mês.

    Procurado, o deputado estadual Leur Lomanto Jr. informou que não foi responsável pela indicação de seu primo e alegou que este seria parente seu em "quinto grau".

    A advogada Maria Josselia Carrilho Rosa, em férias, não respondeu perguntas enviadas por e-mail. Seu filho, Marcos Carrilho Rosa, diz desconhecer a nomeação.

    A deputada Moema Gramacho e o ex-deputado Luiz de Deus não foram localizados pela Folha.

    A filha do ex-prefeito de Sítio do Quinto não foi localizada e a filha do ex-prefeito de Canudos não foi encontrada no hospital municipal.

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