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    o impeachment

    'Ou o governo muda, ou o povo muda o governo', diz Romero Jucá

    NATUZA NERY
    VALDO CRUZ
    DE BRASÍLIA

    15/08/2015 02h00 - Atualizado às 04h01

    Um dos principais representantes do empresariado no Congresso, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) faz um prognóstico pessimista para a economia este ano e diz que a situação vai "piorar a cada domingo" ao avaliar que as manifestações de amanhã (16) não serão o ápice do desgaste do governo.

    Idealizador dos principais pontos da Agenda Brasil, pacote de medidas anticrise proposto pelo Senado para tentar expurgar o pessimismo com o país, Jucá diz que o quadro de uma eventual deposição da presidente da República não está "maduro". Mas sentencia: "Ou o governo muda ou o povo muda o governo".

    E faz um alerta geral: "o governo está na UTI, pelo amor de Deus não racionem o oxigênio!"

    Afastado por Dilma Rousseff da liderança do governo no Senado durante seu primeiro mandato, Romero Jucá ajudou a costurar as articulações que deram oxigênio à petista às vésperas das protestos organizados pela oposição. Lula e assessores palacianos o chamaram de "quadraço".

    Investigado na operação Lava Jato, o peemedebista afirma que "não há demérito em ser investigado", mas sim em ser "condenado". E votará pela recondução do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

    A seguir, os principais trechos da entrevista concedida à Folha nesta quinta-feira (13):

    *

    Folha - A Agenda Brasil foi lançada para corrigir o rumo do ajuste na economia feito pelo governo. É um atestado de erro da presidente?
    Romero Jucá - Desde o início do ano que a gente coloca questões que consideramos vitais [na economia]. A primeira é a forma equivocada como o governo iniciou esse processo de reconstrução da economia.

    Como assim equivocado?
    O governo começou anunciando um ajuste fiscal, em tese em cima de direitos sociais. Começou completamente pela contramão. Ao falar de corte, de aumento de impostos e de direitos sociais sendo retirados que, na verdade, não o eram, o governo começou a criar um ano depressivo. Falou de problema, projetou uma gravidade da economia, mas não construiu uma previsão de saída dessa gravidade.
    O governo tinha uma nuvem diante de si, estava entrando na tempestade. Não disse em quanto tempo ia sair dela para os agentes econômicos se planejarem, arrocharem o cinto, não comerem, recolherem a bandeja. Botaram a culpa nas aeromoças. Com um agravante: o GPS deste avião estava danificado.

    O Planalto tinha o GPS danificado?
    O GPS da condução política. Não previa a tempestade. O GPS mostrava que essas questões todas podiam se resolver facilmente e não previa as dificuldades com a tripulação (políticos), com os passageiros (população). Um conjunto de problemas foi subestimado.

    Qual o resultado?
    Quando você não dá o horizonte, o piloto não sabe em que direção está indo, o tamanho do CB [nuvem escura de tempestade] e se o combustível vai dar para pousar. Quando a economia não sabe o que fazer, planeja pelo pior. O empresário, ao não ter a previsibilidade, decide demitir o que puder, fechar o que puder, porque não sabe o que pode acontecer.

    Foi o que ocorreu.
    E vai piorar. Não tenho dúvida. Porque a arrecadação federal está caindo, a atividade econômica está caindo, os Estados começando a quebrar, os setores que ainda empregaram no primeiro semestre, como comércio e serviços, vão desempregar no segundo semestre, com a classe média com risco de ser desempregada ou já desempregada. Com o carnê, com a prestação do apartamento, do carro, da moto para pagar, com o supermercado mais caro. Então todo mundo vai ser o mais conservador possível. Isso amplia o espiral negativo da economia.

    Por isso um pacote anticrise?
    O primeiro sacrifício deveria ter sido do governo para dar o exemplo. Diminuir ministérios, consolidar empresas. Tinha de fundir empresas, acabar com estatais ineficazes e juntar agências reguladoras. Não basta cortar R$ 70 bilhões, tem de mostrar que está cortando na carne para justificar o corte nas áreas dos outros. Você vai andar num shopping daqui a pouco e ver muitas lojas fechando, já está acontecendo.

    O sr. discutiu com a área econômica sobre os rumos da economia, o que o ministro Joaquim Levy dizia?
    Que eu estava equivocado. Dizia que precisava fazer o ajuste para depois ir para essas etapas. Eu dizia que primeiro tinha de ir para essas etapas fazendo o ajuste. Podia ser junto. O problema é começar pelo sacrifício depressivo. Tem que ter o discurso da animação econômica.

    Ele defendia que se pintasse um quadro difícil para forçar o Congresso a aprovar as medidas do ajuste.
    O governo partiu da permissão de que tinha de fazer uma recessão para os preços caírem, para a inflação cair. É um modelo econômico. Eu só acho que este modelo econômico está dissociado do momento político. O tempo da política é muito mais rápido do que essa economia que ele quer construir. Um hiato que pode criar uma dificuldades sem precedentes para o governo.

    Como foi a construção da agenda?
    No fim de julho decidimos que o Senado se posicionasse. Os parlamentares têm vindo dos Estados deprimidos e assustados com a cobrança. Ou a gente constrói uma agenda positiva para canalizar essa preocupação ou essa preocupação vai se manifestar espontaneamente em aumento de despesas para agradar a determinados setores como forma de tentar se salvar individualmente politicamente. Isso é péssimo para o país. Uma coisa é aprovar algo que gere despesa pontual. Outra é aprovar medidas que causem dano estrutural às contas públicas.

    O pacote é viável?
    Tem alguns pontos técnicos, alguns pontos estruturais. Tem alguns pontos filosóficos. Nem tudo vai ser votado, nem tudo vai ser discutido. Existem ali sinalizações de curto, médio e longo prazos.

    O sr. acha que a presidente demorou demais a acordar para essa situação?
    O governo por um tempo achou que o ajuste fiscal, da forma como foi proposto, bastaria. Simplificou as dificuldades. Primeira coisa para o governo encarar a situação é tomar conhecimento da realidade. O governo está falando uma linguagem que a sociedade não está entendendo.

    Essa forma equivocada ajudou a aprofundar a crise política?
    Impeachment é consequência de falta de condição de governar. Ninguém é cassado por um fato determinado, pela vontade de A, B ou C dentro do Congresso. Acho que, para um presidente cair, é preciso haver uma decisão do país. Essa decisão não está madura.

    Pode chegar a isso?
    Não tenho bola de cristal. Mas o quadro vai se agravar a cada dia mais da forma como a situação está hoje e com os remédios que estão sendo aplicados hoje.

    Mas ela consegue reverter essa extrema fragilidade?
    Se ela se entender com a sociedade, sim. Se a maioria ficar fora do baile, eles acabam com a festa.

    Até que ponto a Operação Lava Jato agrava esta situação?
    Lógico que a Lava Jato agrava porque é um processo que fragiliza o governo e cria fatos negativos permanentemente. Todo dia estoura uma bomba diferente. O governo está à mercê de um processo de investigação que não tem perspectiva de fim. Isto fragiliza o partido do governo principalmente. E isto reforça esta visão negativa da sociedade.

    Há nomes de autores da agenda Brasil, entre eles o do sr., que foram citados e estão sob investigação da Operação Lava Jato, isto não gera suspeita....
    Tem várias pessoas que estão sendo investigadas. O que tenho defendido aqui sempre? Primeiro, toda investigação é legítima, porque quem vive na vida pública tem de se sujeitar a isto. Na democracia, o presidente pode ser investigado e o motorista, o ministro, o senador, o deputado também. Então, eu considero legítima a investigação, agora sou daqueles que aplaudem a investigação e cobram o resultado da investigação. Todo mundo pode ser investigado. Agora, há demérito em ser investigado? Não, não há. Demérito é ser condenado, é haver provas contundentes de que se fez algum tipo de irregularidade.

    O sr. então está tranquilo sobre o seu caso?
    Eu vou votar a favor da recondução do [procurador-geral Rodrigo] Janot, ele tem de ser reconduzido, o processo tem de continuar rapidamente, acho que o Senado não tem de retaliar nada, porque ao tentar retaliar o Janot vai parecer que a gente não quer que investigue. Eu acho que tem de ser exatamente o contrário.

    A sua previsão é que ele esteja votado até quando?
    Minha previsão é de aprovação sem dificuldades. Acho que até o final de agosto ele está votado.

    A presidente está tutelada pelo PMDB hoje?
    De forma nenhuma, mesmo porque o PMDB tem diversas posições. Eu sou de um PMDB independente, eu não votei na presidente Dilma por estas questões econômicas, eu anunciei isto. Mesmo assim eu ajudei a aprovar no final do ano a questão da mudança de meta, porque achava que era importante para o país.

    O sr. defende, então, que o governo precisa mudar de rumo para se recuperar?
    Eu já disse isto. Ou o governo dá um cavalo de pau radical ou ele não se sustenta. Continuo dizendo a mesma coisa. Mas enquanto há vida há esperança. Para que existe UTI? É para reanimar o cidadão. Vou repetir algo que disse há dois dias, o governo está na UTI, pelo amor de Deus não racionem o oxigênio porque depois vai morrer e aí não adianta ter oxigênio no tubo porque já passou a hora.

    Você disse isto onde?
    Numa reunião do PMDB. Este cenário está na minha cabeça há um ano, desde quando decidi não votar nela.

    O sr. já disse que o governo pode acabar no próximo ano?
    Eu acho que ou o governo muda ou o povo muda o governo. Então, esta é uma questão que o governo tem de decidir o que ele quer.

    As manifestações de domingo vão ser um termômetro disto?
    Não, não serão ainda, porque o quadro econômico e político vai se agravar cada dia mais. Cada domingo será pior, porque cada domingo haverá mais pessoas chorando desemprego, lojas fechando, pessoas sem pagar o carnê na segunda, devendo cheque especial.

    O sr. prevê o fim do mundo então?
    Não, ela pode ajustar.

    A presidente não está um pouco fora da realidade?
    Posso dizer que a prática para trás do governo mostra que ele errou, a prática para frente a gente precisa dar o benefício da dúvida, do bom senso, eu sou um otimista.

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