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    Em crise, situação do Rio Grande do Sul é comparada à da Grécia

    FELIPE BÄCHTOLD
    DE SÃO PAULO
    PAULA SPERB
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM PORTO ALEGRE

    18/08/2015 07h00

    30.jun.15/Cepers/Divulgação
    Crédito: Cepers/DivulgaçãoLegenda: Professores do Rio Grande do Sul protestam em frente ao Centro Administrativo, em Porto Alegre, na última quinta-feira (30)
    Professores do Rio Grande do Sul protestam contra atrasos no salário

    O calote do governo do Rio Grande do Sul na União anunciado na semana passada escancarou o contraste do quarto Estado mais rico do país: enquanto mantém bons indicadores sociais, convive há anos com alguns dos piores números das finanças públicas no Brasil.

    É o mais endividado, está na lanterna em investimentos e permanece entre os líderes de gastos com pessoal. Pior: nesta terça (18), com atrasos de seus salários, servidores estaduais decidem se entram em greve.

    O governador José Ivo Sartori (PMDB), que decidiu não pagar a dívida com a União para quitar salários atrasados, se vê diante de poucas alternativas para ampliar as receitas do Estado e ainda enfrenta a piora da arrecadação diante do cenário de crise.

    O peemedebista e seu antecessor, o petista Tarso Genro, comparam a situação do Estado com a da Grécia, que esteve prestes a provocar um desastre econômico internacional ao deixar de pagar uma parcela da dívida com o FMI em junho.

    Um indicador resume a penúria do Estado: no primeiro semestre deste ano, o governo gaúcho investiu em valores absolutos menos do que o do Piauí, um dos Estados mais pobres da federação.

    A longa crise levou o governo estadual a ser o pioneiro, a partir de 2004, no uso de recursos de depósitos judiciais (verbas de empresas ou cidadãos bloqueadas por contestação na Justiça) para bancar despesas públicas. Hoje, depois de mais de R$ 8 bilhões sacados dessas contas, até essa fonte se esgotou.

    A situação atingiu o auge nos últimos meses, período em que, alegando falta de caixa, o governo Sartori fez cortes e atrasou pagamentos nas mais diversas áreas, como repasses da saúde a hospitais.

    No fim de julho, parcelou os salários do mês e deu o calote na União. A resposta do governo Dilma Rousseff foi bloquear verbas do Estado. O funcionalismo promete greve geral a partir desta terça (18).

    Uma das origens da crise está no elevado comprometimento dos cofres estaduais com o pagamento de salários e aposentadorias.

    O Rio Grande do Sul passou, em 2013, a gastar mais com aposentados e pensionistas do que com servidores da ativa, o que provoca um rombo bilionário a cada ano. O governo do Estado afirma que cerca de 70% de sua recente corrente líquida é destinada ao pagamento de pessoal e de encargos sociais.

    DÍVIDA

    Os principais partidos se revezaram no poder no Estado sem conseguir reverter o quadro de dificuldades. Na campanha eleitoral do ano passado e ao longo do mandato de Tarso Genro (2011-2014), a renegociação da dívida com a União foi tratada como a tábua de salvação.

    Há quase 20 anos, o Estado é obrigado a destinar 13% de sua receita corrente líquida à União em um acordo que vai vigorar até o fim da próxima década. Hoje, está impedido de adquirir novos financiamentos por já ter atingido limites estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal.

    O governador deve apresentar projeto para aumento da alíquota do ICMS para reforçar o caixa. Os recursos extras, no entanto, demorariam para chegar, e os atrasos nos salários e na dívida devem se repetir nos próximos meses.

    Em entrevista concedida em julho, Sartori afirmou que o deficit de R$ 5,4 bilhões, estimado pelo governo para o Orçamento de 2015, é parecido com o da parcela da dívida que a Grécia deixou de honrar há dois meses.

    A dívida consolidada chegou a R$ 60 bilhões em 2014, enquanto a receita corrente anual do Estado foi de R$ 28,6 bilhões. A dívida grega equivale a 177% do PIB do país.

    As políticas de austeridade em vigor são criticadas por Tarso, que defende mais pressão sobre o governo federal junto com outros governadores para a renegociação da dívida. "Não há saída estrutural fora de um regime de colaboração com a União, que, por seu turno, também tem seus dramas financeiros", diz.

    'COISA NEOLIBERAL'

    No campo político oposto, economista Aod Cunha afirma que o equilíbrio orçamentário do Estado nunca foi uma prioridade e é visto como "coisa neoliberal".

    Secretário estadual da Fazenda de 2007 a 2009, no mandato da tucana Yeda Crusius, ele diz que o envelhecimento acima da média da população, que pressiona a Previdência, e a migração jovem também aproximam o caso gaúcho da Grécia.

    Atual secretário da Fazenda, Giovani Feltes admite não ver uma saída a curto prazo. "Diante dessa emergência, não se tem uma bala de prata", lamenta.

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