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    'Nunca houve interferência de Lula no BNDES', diz Coutinho em CPI

    REYNALDO TUROLLO JR.
    DE BRASÍLIA

    27/08/2015 15h44

    Pedro Ladeira/Folhapress
    Luciano Coutinho, presidente do BNDES, fala em CPI que investiga empréstimos do banco na Câmara
    Luciano Coutinho, presidente do BNDES, fala em CPI que investiga empréstimos do banco na Câmara

    O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, afirmou na CPI que investiga empréstimos do banco que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nunca interferiu nas operações da instituição em relação a projetos específicos.

    "Nunca houve interferência do presidente Lula nesses processos junto ao BNDES. As questões relativas ao ex-presidente devem ser remetidas ao Instituto Lula", disse Coutinho, em resposta ao deputado João Gualberto (PSDB-BA), que o questionou sobre suposto tráfico de influência de Lula na aprovação de projetos em Cuba e na Venezuela.

    Coutinho afirmou que são as empresas brasileiras que vão atrás dos negócios, e que o banco não participa de tratativas no exterior.

    O deputado Gualberto quis saber também sobre a influência do ex-ministro José Dirceu –preso há duas semanas em um desdobramento da Operação Lava Jato– nas atividades do banco, especificamente sobre as obras da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, suspeitas de terem sido superfaturadas.

    "Em relação a José Dirceu, não há ingerência em nenhum dos projetos tratados no BNDES. Não sei se durante seu período como ministro-chefe da Casa Civil ele participou, porque eu não estava no banco naquele momento [Coutinho assumiu o cargo em 2007], mas, posteriormente, o BNDES avalia estritamente em bases técnicas a consistência, o risco e as garantias dos projetos [antes de apoiá-los]", respondeu.

    CUBA E VENEZUELA

    O financiamento à exportação de bens e serviços, principalmente para Cuba, Venezuela e Angola, foi o maior alvo das perguntas dos deputados da CPI, que consideram as condições dos empréstimos pouco transparentes.

    Perguntas insistentes sobre o porto de Mariel, em Cuba, causaram um rápido bate-boca entre deputados governistas e da oposição. O deputado Davidson Magalhães (PC do B-BA) interrompeu o tucano Gualberto, que fazia as perguntas, e o mandou "ir orar".

    Coutinho respondeu que operações de apoio a exportações são realizadas pelo BNDES desde a década de 1990, e que elas representaram em sua gestão apenas cerca de 2% do total desembolsado pelo banco -a maior parte foi para financiamentos dentro do Brasil, disse.

    "O volume que o banco desembolsou em infraestrutura no Brasil é incomparavelmente maior que o da exportação de serviços de engenharia, que gera emprego e renda no Brasil. É a produção no Brasil de bens e serviços que vai ser exportada, e está contribuindo também para o desenvolvimento do país", afirmou Coutinho.

    "Não há orientação ideológica de parte do BNDES na concretização de apoios a projetos de comércio exterior. Olhamos capacidade de pagamento, garantias, e somos rigorosos nos requisitos. Não há dinheiro a fundo perdido para Cuba. Empréstimos foram feitos com taxas competitivas, para o porto que será importante no futuro, inclusive, agora que Cuba reatou com os EUA", disse.

    Em sessão anterior, a CPI já havia aprovado um requerimento para obter toda a documentação relativa aos contratos das obras em Cuba. Os dados ainda não foram enviados pelo banco.

    RICARDO PESSOA

    Confrontado com uma suposta reunião realizada com Ricardo Pessoa, dono da UTC, preso na Operação Lava Jato, em que teria orientado o empresário a procurar o petista Edinho Silva para fazer doações eleitorais para o partido, Coutinho confirmou a existência do encontro, mas negou ter tratado de doações.

    "Não participei de financiamento de campanha. A reunião que tivemos, com Ricardo Pessoa e outros empresários do Consórcio Viracopos, restringiu-se à conclusão do projeto do aeroporto [de Viracopos, em Campinas, no interior paulista] e o equacionamento do projeto, nada tendo a ver com campanha", afirmou Coutinho.

    O deputado Caio Narcio (PSDB-MG) perguntou a Coutinho se ele mantém relação de proximidade com Pessoa, com Dirceu, com o ex-presidente Lula e com o filho dele, Fábio Luís, o Lulinha. O presidente do BNDES negou.

    Narcio perguntou, então, se Coutinho autorizaria a quebra de seu sigilo telefônico. "A minha palavra é verdadeira, mas é uma prerrogativa da comissão quebrar o sigilo, e não minha", respondeu.

    A oposição também quis saber se o BNDES assinou contratos com empresas ligadas a Carolina Oliveira, mulher do governador de Minas e ex-ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, ou ligadas ao empresário mineiro Benedito Oliveira, o Bené, amigo de Pimentel e dono de um jatinho apreendido na eleição do ano passado com R$ 113 mil em dinheiro vivo. O presidente do BNDES afirmou que não.

    LAVA JATO

    Questionado sobre novos contratos com as empreiteiras envolvidas no esquema de corrupção desbaratado pela Operação Lava Jato, Coutinho disse que o BNDES está adotando cuidados.

    "O banco adotou um procedimento de grande cautela, dentro da lei. Primeiro, reexaminando as condições de rating [classificação de risco] e de capacidade econômico-financeira de cada uma das empresas. Nós não podemos, enfim, julgá-las inidôneas antes que a Justiça o faça.", afirmou Coutinho.

    "Porém, obviamente, por dever de cautela temos que rever as condições cadastrais. E separar qual o CNPJ específico [de cada grupo empresarial] que esteve envolvido em prática de corrupção, considerando que em vários casos essas empresas têm uma configuração heterogênea", disse.

    Também investigada na Lava Jato, a empresa de sondas Sete Brasil ainda poderá receber recursos do banco, afirmou Coutinho aos deputados, que perguntaram sobre supostos empréstimos já realizados à firma suspeita.

    "O BNDES aprovou um financiamento em dezembro de 2013, a Sete não conseguiu reunir os documentos para utilizar o recurso e o contrato não foi assinado", afirmou. "Hoje, as tratativas para reestruturar a Sete Brasil, reduzindo o número de sondas, continuam em curso. No momento em que o processo estiver saneado, o banco poderá fornecer suporte ao projeto."

    Com os principais cargos da CPI dominados por parlamentares da oposição e por aliados do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que rompeu com o governo, a estratégia governista foi mostrar que as empresas suspeitas também atuam em obras estaduais, como as do Metrô de São Paulo -Estado governo pelo PSDB.

    "Às vezes, parece que as empresas da Lava Jato só estão atuando junto ao governo federal, mas elas têm contratos com os Estados, inclusive, financiaram campanhas de governadores e de presidentes de todos os partidos, não só do PT. A obra da linha 6 [laranja] e outras do Metrô de São Paulo são todas realizadas pelas empresas da Lava Jato", disse Carlos Zarattini (PT-SP).

    PREJUÍZOS

    Sobre investimentos em empresas que tiveram prejuízos, em especial as do grupo EBX, de Eike Batista, e o Frigorífico Independência, de Mato Grosso do Sul, que faliu após investimentos de R$ 250 milhões do BNDES, o presidente do banco admitiu prejuízos no segundo caso, mas negou ter havido perdas no primeiro.

    "O grupo EBX teve seus problemas originados da ruína da OGX, que era a empresa de petróleo [do grupo]. Para essa empresa o BNDES não contribuiu. Para várias outras do grupo foram créditos garantidos por fianças. Foram devidamente renegociados à medida que novos investidores adquiriram as empresas e nosso crédito migrou, de forma que não tivemos prejuízo nas operações de crédito com o grupo EBX", afirmou, em resposta a pergunta do relator da CPI, José Rocha (PR-BA).

    "No caso do Frigorífico Independência, houve avaliação de balanço, da situação da empresa, respaldada por auditores externos. O que ocorreu depois foi uma rápida deterioração e uma suspeita nossa de que as informações apresentadas [pelo frigorífico] não fossem fidedignas. O Independência é o único caso [entre o setor frigorífico, que inclui ainda grupos como JBS e Marfrig] que, infelizmente, nos trouxe uma perda de R$ 250 milhões, em função de deterioração muito rápida da empresa entre o fim de 2008 e março de 2009."

    MOVIMENTOS SOCIAIS

    Primeiro vice-presidente da CPI, o deputado Miguel Haddad (PSDB-SP) quis saber sobre os financiamentos do BNDES a movimentos sociais. Neste mês, por exemplo, o banco destinou R$ 400 mil à Marcha das Margaridas, evento de agricultoras que ocorreu em Brasília e acabou se transformando num ato de apoio à presidente Dilma.

    "Apoiamos com patrocínio a realização de eventos, congressos, seminários, amplamente, desde o agronegócio, evento científico, eventos culturais, dezenas de eventos empresariais, de associações de classe, frente de prefeitos, e apoiamos também alguns movimentos sociais, uma vez que apoiamos a agricultura familiar e a pequena cooperativa de assentamentos", respondeu Coutinho.

    "Não fazemos controle ideológico desses apoios. Contemplamos todos os segmentos, principalmente os empresariais. Não há motivação política e ideológica", completou.

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