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    Francisco Dornelles nega indicação de Cunha à Petrobras, revelada por FHC

    ALEXANDRE ARAGÃO
    DE SÃO PAULO

    05/10/2015 19h09

    Alan Marques - 20.jun.1998/Folhapress
    Dornelles (à esq.), com o ex-presidente FHC, em convenção do PPB, com Maluf e o vice Marco Maciel

    Citado nos diários do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) como articulador de uma tentativa de levar o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a uma diretoria da Petrobras, o vice-governador do Rio de Janeiro, Francisco Dornelles (PP), nega que tenha feito a indicação. "Se é verdade, eu não estava presente", diz à Folha. "Se eu indiquei o Eduardo Cunha, posso te garantir que não foi para a Petrobras."

    Então deputado pelo PTB fluminense, Dornelles teria se encontrado com FHC em 23 de março de 1996, junto com outros parlamentares do Estado, e feito o pedido. O relato veio à tona nesta segunda-feira (5), publicado pela revista "Piauí". "Recebi os deputados do Rio de Janeiro, o [Francisco] Dornelles à frente, com o [Odenir] Laprovita Vieira, chefe da igreja do bispo [Edir] Macedo, mais uns dois que não sei quem são, um muito ligado ao esporte. Na verdade o que eles querem é nomear o Eduardo Cunha diretor comercial da Petrobras! Imagina!", escreve o ex-presidente, afirmando, em seguida, que não aprovou o pleito.

    Ministro em duas pastas durante o governo FHC —Indústria, Comércio e Turismo (1996-1998) e Trabalho (1999-2002)—, Dornelles não quis comentar uma frase atribuída pelo ex-presidente à economista Dorothea Werneck, antecessora do vice-governador em um dos cargos. Segundo o relato de FHC, Dorothea afirmou que sua saída do ministério para a entrada de Dornelles representava um "pacto com o diabo".

    Na época da indicação, Dorothea e Dornelles discutiram publicamente. "Um cara que está constantemente se lançando a ministro perdeu o limite", disse à Folha, em fevereiro de 1996, a então ministra. "Eu nunca fui convidado, nunca pleiteei ministério", rebateu Dornelles, antes de ser indicado ao ministério.

    Leia a entrevista abaixo.

    *

    Folha - O relato feito pelo ex-presidente Fernando Henrique é verdadeiro?
    Francisco Dornelles - Se é verdade, eu não estava presente. Porque eu considero o Eduardo [Cunha], pela administração que ele fez na Telerj, um gerente muito competente. Ele fez uma bela administração. Eu, pelo menos, o indicaria para qualquer cargo relacionado com o que ele tinha ocupado. Agora, o meu relacionamento com a Petrobras sempre foi o mesmo que existia entre Argentina e Inglaterra na Guerra das Malvinas.

    O pior possível?
    O pior possível. Nunca fui à Petrobras. Sempre fui contra o monopólio da Petrobras, sempre fui contra a partilha da Petrobras. Sempre fui persona non grata da Petrobras. De modo que eu nunca indicaria ninguém para a Petrobras. Segundo, eu só mando carta depois de receber a resposta.

    Como assim?
    Eu só faria uma indicação para o Fernando Henrique se soubesse antes que ele iria aceitar. De modo que eu tenho impressão de que ele se equivocou, em relação à Petrobras, foi um equívoco.

    Então, a reunião sobre o Eduardo Cunha o sr. não estava presente, se ela aconteceu?
    Se foi para indicar à Petrobras, eu não estava presente.

    O sr. imagina que, caso essa reunião tenha acontecido e o sr. estivesse presente, a indicação foi para algum outro cargo?
    Se eu indiquei o Eduardo Cunha, posso te garantir que não foi para a Petrobras. Poderia ter sido para outro cargo, para a Petrobras não teria sido. Agora, eu não me lembro de ter feito indicação não acolhida. Porque eu geralmente antes de fazer a indicação, principalmente em público ou perante terceiros, primeiro teria conversado pessoalmente com ele e perguntado se ele aceitaria. Eu nunca criaria um constrangimento de fazer uma indicação não aceita.

    O sr. se lembra de alguma indicação ao ex-presidente que foi acolhida?
    Lembro da indicação do meu secretário-geral, Paulo Jobim. O Botafogo Gonçalves como meu sucessor no Ministério de Indústria e Comércio.

    E em relação ao outro trecho em que o sr. é citado, de que, segundo FHC, a ex-ministra Dorothea Werneck teria dito a ele que o governo estava fazendo um "pacto com o diabo" ao aceitar a nomeação do sr. ao ministério?
    Eu não sei, é um direito que ela tem de achar isso. Comentar a declaração dela não cabe a mim.

    Como aconteceu a ida do sr. para o ministério de FHC?
    Essa questão da minha ida para o Ministério da Indústria e Comércio. Eu tinha recebido pelo Luiz Carlos Santos, que era líder da maioria, o convite para ser ministro da Agricultura. Eu falei com ele que não aceitava ser ministro da Agricultura porque não entendia da área. Depois o Serra me ligou também me convidando para aceitar o Ministério da Agricultura, eu repeti a ele a mesma coisa. Isso foi em 1995.

    Aí num dia o Sérgio Motta [coordenador da campanha de FHC em 1994 e ministro das Comunicações] me ligou e falou: "Acertei com o presidente que você vai ser ministro da Indústria e Comércio e já vazei a notícia para a Globo". Aí não tinha mais volta. Eu assumi com grande satisfação, pra mim foi uma honra grande, para o meu currículo, ter sido ministro do Fernando Henrique.

    Nota: o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também cita o episódio em seu diário. "Quando termino essa reunião [que definiu Dornelles como ministro], vem a imprensa toda sabendo das nomeações. A Globo entrou em linha direta, em plantão, e anunciou cinco ministérios. Eu neguei. Na verdade, quando fomos ver depois, ela deu direitinho tudo que tinha acontecido no almoço, e isso me aborreceu muito. Me parece que foi o Luiz Carlos Santos, o que é um mau começo para quem vai ser coordenador político: usar a Globo. Resultado: chamei o [então senador e líder do PPB Espiridião] Amin correndo, ele já estava irritado, porque isso abriu o jogo, o PPB ficou assustado porque o pessoal quer Agricultura, e não Indústria e Comércio, e querem realmente para os fins conhecidos. Amin foi cooperativo e ficou de falar de novo à noite com o pessoal. Eu disse a ele que era o Dornelles e nessas condições."

    Enquanto o sr. esteve no ministério do ex-presidente Fernando Henrique houve algum atrito com ele?
    A minha relação sempre foi a melhor possível. É uma relação antiga, de relação familiar. O tio dele [Ciro do Espírito Santo Cardoso] foi ministro do Getúlio quando meu pai era subchefe da Casa Militar. Ele ajudou muito na campanha do Tancredo [Neves, tio de Dornelles], coordenou a campanha do Tancredo no exterior. Tenho por ele o maior apreço, o maior carinho, a maior admiração. Acho que foi o melhor presidente que o Brasil já teve no regime democrático.

    E fora do regime democrático?
    Acho que foi o Getúlio Vargas.

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