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    Ex-ministro nega tráfico de influência em decisões sobre Medidas Provisórias

    DIMMI AMORA
    DE BRASÍLIA

    27/10/2015 19h37

    Em depoimento à CPI do BNDES da Câmara, o ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, negou que tenha havido tráfico de influência para decidir empréstimos do banco ou para editar medidas provisórias sobre redução de impostos.

    "Nunca fui procurado para coisa dessa natureza e se tivesse sido teria sido repelido", disse Mantega ao comentar uma declaração de um colega de esplanada. Nesta segunda, o ex-ministro Gilberto Carvalho disse ter orientando um dos presos na Operação Zelotes, Mauro Marcondes, a tratar com Guido sobre a renovação de uma medida provisória. A Polícia Federal suspeita que houve repasse de propina de empresas que teriam sido beneficiadas pela MP.

    Em defesa do governo, Mantega afirmou que tanto as MPs como as políticas de incentivos ficais foram discutidas amplamente pela sociedade e todas foram aprovadas pelo Congresso Nacional. Sobre empréstimos para empresas que depois viraram alvo de operações da PF, Mantega afirmou que o BNDES tomava os cuidados necessários antes de realizar as operações financeiras.

    "Se depois houve alguma irregularidade, o BNDES não poderia saber", afirmou o ex-ministro. Ele também negou ser amigo do empresário Vitor Sandri, citado na Zelotes como beneficiado por decisões do Carf, conselho de recursos de multas da Receita Federal, ligado ao Ministério da Fazenda.

    CRISE

    O ministro passou quase quatro horas respondendo deputados, a maioria da oposição. Grande parte das perguntas era sobre o que levou o governo a usar o BNDES para fazer empréstimos subsidiados.

    Guido reconheceu a gravidade da crise atual, mas defendeu seu período de quase nove anos à frente do ministério. Segundo ele, seu período não foi um "voo de galinha" em relação ao crescimento, já que teve aumento médio de 3,5% ao ano do PIB.

    Mantega culpou mais uma vez a crise econômica mundial pelo atual problema que o país atravessa, dizendo que ela "dura até os dias de hoje". Argumentou que a crise –após derrubar a economia americana, em 2008, e a europeia, em 2012– entrou agora em sua terceira fase e atinge também os países emergentes.

    "O nosso problema é que a crise continuou e não permitiu sucesso maior. Navegamos com vento contrário", afirmou Mantega ao ser questionado sobre a redução do crescimento do PIB desde 2011.

    Sobre o que levou a presidente Dilma Rousseff a fazer previsões equivocadas sobre a economia durante as eleições, Mantega disse que o governo e o mercado se enganaram, citando dados do Boletim Focus, do Banco Central, que capta perspectivas do mercado. Nessa hora, ele culpou a "seca", a "redução dos preços das commodities", a "instabilidade política" e até a "Copa" pelo fraco desempenho da economia a partir de 2014.

    PSI

    Em relação ao PSI (Programa de Sustentação de Investimento), Mantega defendeu que os empréstimos a juros subsidiados para empresas como forma de aumentar os investimentos no país e o emprego, negando que os gastos tenham sido excessivos.

    "Foi de bom tamanho", disse o ex-ministro, que admitiu no entanto que esse tipo de programa "tem que ter limite".

    Mantega, que foi presidente do BNDES entre 2004 e 2006 antes de ser ministro da Fazenda, apresentou gráficos afirmando que o crescimento do PIB do país nos últimos anos foi garantido por essa política de empréstimos a juros subsidiados, que aumentou os investimentos na economia. Segundo ele, o governo tinha consciência de que haveria gastos públicos para pagar os subsídios ao banco.

    De acordo com o TCU (Tribunal de Contas da União), o governo deixou de pagar esses subsídios, que ao BNDES somavam em 2014 quase R$ 20 bilhões. Por causa disso, o governo teve suas contas reprovadas em 2014.

    "O que teríamos a perder [sem os empréstimos] é maior do que o que temos a pagar", disse Mantega explicando que os gastos do banco com empréstimos subiram para dar crédito às empresas por causa da crise econômica de 2008.

    Para Guido Mantega, os gastos do governo para pagar os subsídios são "mais que compensados" pelo aumento da arrecadação do governo e também pela geração de empregos, que também teria, segundo ele, melhorado as contas da previdência.

    O ex-ministro da Fazenda é um dos 18 apontados pelo TCU (Tribunal de Contas da União) como responsável pelas irregularidades cometidas com as chamadas 'pedaladas fiscais', que são o pagamento por bancos e fundos públicos de despesas que deveriam ser do governo. O processo no TCU em que Mantega pode ser responsabilizado ainda não foi apreciado pelo órgão de controle.

    Quando perguntado sobre as críticas ao PSI feitas pelo atual ministro da Fazenda, Joaquim Levy, Mantega não respondeu diretamente alegando que não conhecia as críticas, mas lembrou que a Fazenda fez um estudo este ano mostrando que o país está numa situação semelhante à de 1999/2003 (governo de Fernando Henrique Cardoso, do PSDB) e lembrando que nesse período foi implantada a CPMF.

    "A diferença é que o temos agora condições melhores para sair da crise", disse o ex-ministro citando as reservas internacionais e um maior mercado consumidor no país.

    AZAR

    Já ao fim do seu depoimento, Guido Mantega não quis comentar diretamente declarações do ex-ministro da Fazenda, Delfim Netto, que disse que era Dilma a real ministra da Fazenda e que ela tomou decisões equivocadas. Ele classificou as palavras de Netto como 'fofoca'.

    Mantega disse que a presidente fez uma "aposta" na redução das tarifas de energia e classificou como "azar" a seca que vem afetando o país e que fez com que, segundo ele, a conta de luz tivesse que aumentar desde 2014. Segundo o ex-ministro, esse tipo de problema acontece em qualquer governo e afirmou que o governo de Fernando Henrique também teve "azar" com a seca de 2001, que naquela época levou ao racionamento do energia e, segundo Mantega, prejudicou o governo dele e a eleição seguinte.

    "Os governos são assim. Têm períodos de fortuna e sorte e de cenários piores. Eu devia ter saído no período bom e não ficar para o período de acomodação de crise, que é inevitável no capitalismo", disse Mantega.

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