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    o impeachment

    Eduardo Cunha pode ser acusado de sonegação fiscal, dizem especialistas

    MARIO CESAR CARVALHO
    FLÁVIO FERREIRA
    GRACILIANO ROCHA
    DE SÃO PAULO

    15/11/2015 02h00

    O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), cometeu os crimes de evasão de divisas e sonegação fiscal ao não informar ao Fisco federal e estadual que criou e investiu recursos em uma estrutura financeira no exterior da qual era o principal beneficiário, afirmam três especialistas em direito tributário que analisaram o perfil das operações a pedido da Folha.

    Ele também está sujeito a punição do Banco Central, que exige que valores a partir US$ 100 mil sejam informado anualmente à instituição.

    Cunha admite que se valeu de uma engenharia financeira que envolveu "trusts", um tipo de contrato no qual o dono do recurso transfere para um terceiro a administração dos valores, porém nega que isso devesse ser declarado às autoridades brasileiras. Em entrevista à Folha no dia 7, ele negou que tenha cometido irregularidade.

    DISCRIÇÃO A MAIS - Cunha contrariou normas brasileiras ao não declarar recursos em suas quatro contas no exterior

    Como a figura dos "trusts" não está prevista no sistema legal brasileiro, o dinheiro transferido para ser gerido por terceiro nessa estrutura jurídica é tratado pela legislação brasileira como doação.

    Esse tipo de contrato é isento de impostos federais, mas paga 4% de imposto estadual no Rio e em São Paulo, o que Cunha não fez. Isso pode configurar, em tese, crime de sonegação fiscal.

    Os "trusts" também devem ser declarados à Receita no momento em que são criados, o que o congressista também não fez. A ausência de comunicação ao Fisco configura o crime de evasão de divisas, segundo os especialistas.

    Uma lei de 2001 exige também que qualquer capital de cidadão brasileiro no exterior seja declarado ao BC.

    Cunha criou dois "trusts", um em 2005 e outro em 2007. Os valores aplicados foram resgatados por Cunha em 2014, pouco depois da deflagração da Operação Lava Jato. Isso foi possível porque Cunha usou uma categoria de "trust" que é revogável, ou seja, os valores aplicados podem ser resgatados a qualquer momento.

    Reportagem da Folha publicada na quinta (12) revelou também que Cunha tinha controle total sobre os recursos dos "trusts". Especialistas chamam esse tipo de estrutura de "sham trust" (simulação de "trust").

    Os crimes de evasão de divisas e sonegação são punidos com prisão e multa. A omissão de recursos ao BC rende uma multa cujo valor máximo é de R$ 250 mil.

    Cunha nem poderá se beneficiar do projeto de lei, aprovado em votação na Câmara na quarta-feira (11), que regulariza a situação de quem tem recursos não declarados no exterior. O projeto impede que políticos e pessoas politicamente expostas sejam beneficiados por essa medida.

    O peemedebista já é investigado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) sob suspeita de lavagem de dinheiro e corrupção passiva, uma vez que o lobista ligado ao PMDB João Augusto Henriques transferiu 1,3 milhão de francos suíços para um "trust" de Cunha em 2011.

    Para procuradores da Lava Jato, o depósito é propina ligada a contratos da Petrobras.

    UNIFICAR REGRAS

    Um dos problemas sobre figuras jurídicas como o "trust" é a falta de uniformidade e clareza na legislação brasileira a respeito, opina o professor de direito da USP (Universidade de São Paulo) Heleno Torres, especialista em direito tributário.

    "O Brasil deveria aproveitar essa discussão para rever sua legislação e unificar as regras", afirma Torres. Uma das regras divergentes diz respeito ao valor mínimo que deve ser declarado: R$ 140, segundo a Receita, e US$ 100 mil, de acordo com a regra do censo de capitais brasileiros no exterior do Banco Central.

    "Essa falta de unificação gera insegurança jurídica e abre brechas para o uso do 'trust' para lavagem de dinheiro", afirma Torres.

    OUTRO LADO

    A assessoria do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) informou que o congressista não iria se manifestar sobre as avaliações dos tributaristas ouvidos pela Folha.

    Cunha vai se pronunciar sobre as operações financeiras no exterior somente nos autos das investigações, de acordo com a assessoria.

    A reportagem também procurou o escritório do advogado Antonio Fernando de Souza, defensor de Cunha, mas ele não ligou de volta.

    Em entrevista à Folha, publicada no dia 7, Cunha falou sobre o fato de não ter declarado suas operações no exterior às autoridades brasileiras: "Não tenho falha alguma. Não entendemos que existe essa omissão, entendemos que, na medida que você transferiu a propriedade para o 'trust' e tem dez anos, você não é mais proprietário de nada. Eu não tenho ativo".

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