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    Para biógrafo, padre Cícero unia fé popular e canônica

    JOÃO PEDRO PITOMBO
    DE SALVADOR

    14/12/2015 22h07

    Autor da biografia "Padre Cícero: Poder, Fé e Guerra no Sertão", o jornalista e historiador Lira Neto diz ver o líder religioso cearense como uma figura ambígua e fascinante, que unia a fé visceral à canônica.

    Leia abaixo trechos da entrevista.

    *

    Folha - Como definiria a figura de Padre Cícero e sua importância para o Nordeste?
    Lira Neto - Padre Cícero sempre foi uma figura ambígua e complexa. Ele teve os seus votos suspensos porque a Igreja considerou que ele havia infringido uma série de regras ao propagar presumidos milagres que o Vaticano não reconhecia. Por outro lado, ele fazia um trabalho significativo com a população nordestina. Era um padre que fazia esse diálogo entre a fé popular, que é visceral, e a fé canônica. Um sincretismo que a Igreja não aceitou e, por isso, foi acusado de ser embusteiro, um falso milagreiro. Também foi acusado de ter um patrimônio incompatível com o exercício do sacerdócio. E o interessante é que, pouco dias antes de morrer, ele doou toda sua fortuna para a Igreja, que aceitou.

    Depois de suspenso, ele se tornou um importante líder político...
    Ele continua a exercer o seu sacerdócio da janela de casa, de forma não oficial. Daí, ele se tornou um líder político respeitadíssimo, que tinha um componente de rebeldia e articulou a deposição de um governador de Estado [do Ceará], devidamente amparado pelo governo federal. Ele tinha uma interlocução constante com os presidentes da República naquela época. Aquela imagem de um líder messiânico caricato cai por terra quando você vê a forma como ele contribuiu para criar um pacto entre as elites agrárias e políticas do sertão. Os coronéis fizeram dele um mediador. Daí ele se torna prefeito de Juazeiro do Norte por 18 anos e chega a ser nomeado vice-governador. É fascinante.

    Ele também teve contato com Lampião.
    Na época da Coluna Prestes, foi o Padre Cícero que assinou um salvo-conduto que deu a Lampião armas, munição, uniformes e a patente de capitão. Mas não foi um gesto pessoal, de conluio com o cangaço. Foi uma iniciativa do governo, que incentivou a criação de milícias armadas.

    E houve ou não houve o tal "milagre da hóstia"?
    Pouco importa, isso não altera o curso da história. O grande milagre que vejo é de um homem simples ter se transformado neste mito

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