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    o impeachment

    Há fadiga com impeachment, diz historiador Boris Fausto

    THAIS ARBEX
    DE SÃO PAULO

    24/12/2015 02h00

    Marcus Leoni/Folhapress
    O historiador e cientista político brasileiro Boris Fausto em entrevista
    O historiador e cientista político brasileiro Boris Fausto em entrevista

    Há seis meses, a quem lhe perguntava sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff, Boris Fausto dizia que havia "mais razões técnicas" para a destituição da petista do que houve em 1992, quando o então presidente Fernando Collor de Mello deixou o cargo. Hoje, com o pedido em trâmite na Câmara dos Deputados, o historiador, aos recém-completados 85 anos, afirma que o avanço do "impeachment ficou muito mais complicado do que parecia há duas semanas".

    Para ele, o "antagonismo" de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) "dificultou muito o andamento" do processo. "O fato é que ele é quem ele é, com acusações de toda ordem e com uma folha corrida das mais negativas", disse. "Isso manchou, do ponto de vista da estratégia, o procedimento."

    *

    Folha - O STF (Supremo Tribunal Federal) anulou a comissão pró-afastamento da presidente eleita na Câmara e deu mais poder ao Senado no processo. Como o sr. avalia a decisão?

    Boris Fausto - O julgamento do Supremo demonstra cabalmente que não se trata de golpe. O STF regimentou de forma minuciosa, quase como uma camisa de força, o processo de impeachment.

    A corte teve méritos em estabelecer um rito, que, de certo modo, acalmou o país. Mas me parece evidente que extrapolou suas prerrogativas ao fixar a forma do voto, aberto ou secreto, e mais ainda ao invalidar um voto que vinha do conjunto dos deputados. O STF invadiu espaço que era prerrogativa do Congresso.

    Mas o Congresso também tem culpa nisso porque deixou de regular o processo de impeachment, deixando que permanecesse em vigor uma lei arcaica, de 1950.

    O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, está sob investigação. Ele tem legitimidade para conduzir o processo?

    O antagonismo do Cunha, os problemas que ele tem causado dificultaram muito o andamento do impeachment. E, inclusive, podem até ter concorrido para essa decisão restritiva de procedimento por parte do STF.

    É que claro que se pode dizer que Eduardo Cunha é, neste momento, o presidente da Câmara, portanto caberia a ele encaminhar ou não o processo. Mas o fato é que ele é quem ele é, com acusações de toda ordem, com uma folha corrida das mais negativas. Isso manchou, do ponto de vista da estratégia, o procedimento do impeachment.

    O próprio Miguel Reale Jr., um dos autores o pedido contra Dilma, criticou Cunha por ter usado o "impeachment como instrumento de barganha".

    O Cunha é uma figura muito negativa, isso não é segredo para ninguém, e que maculou bastante, do ponto de vista estratégico e da retórica, o processo de impeachment. Ele jogou com isso, tentou usar o pedido de impeachment como moeda de troca para salvar o seu mandato.

    O governo e o PT exploraram bem essa circunstância. Eu não diria que, daqui para frente, o jogo está dado, que está liquidado. Diria, pelo contrário, que ficou mais complicado o processo de impeachment da presidente.

    De avançar?

    A não ser que apareçam novidades –e o Brasil é um país novidadeiro–, sobretudo na Lava Jato, fica difícil porque o caminho do impeachment é como o daqueles jogos em que a cada momento tem um alçapão para travar.

    Os atos pró-impeachment do dia 13, que reuniram menos pessoas, também são um reflexo desse momento?

    Posso estar aqui repetindo algo banal: o impeachment é um ato jurídico, mas também em grande medida um ato político. Ele depende, portanto, de certos elementos políticos e daquilo que se chama de "a voz das ruas".

    É difícil dizer que as ruas recuaram ou que foi um fracasso, mas esta primeira manifestação [pós-aceitação do pedido], em um momento impróprio, às vésperas das festas de fim de ano, reuniu 40 mil pessoas em São Paulo. Não é um número irrisório. Mas é evidente que assistimos uma queda gradual em relação a março. Minha impressão é que há um cansaço geral.

    Em que sentido?

    Acreditar que o Brasil avance muito com a substituição da Dilma por um conjunto de forças que tenha Michel Temer na presidência é algo discutível. Abriria uma luz nesta situação de absoluta paralisia que o país se encontra, mas não entusiasma tanto quanto poderia se houvesse um nome capaz de dar o rumo a este país.

    Nem na oposição?

    A oposição não conseguiu se manter como oposição coerente. O PSDB se desfigurou como partido que sonhava ser um partido social-democrata. Hoje é um aglomerado e dificilmente mereceria um rótulo de um partido que tem um caminho claro, definido.

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