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    o impeachment

    Alta do mínimo trava gastos de prefeituras do Nordeste

    JOÃO PEDRO PITOMBO
    DE SALVADOR

    24/01/2016 02h00

    "A gente descobre um lado para cobrir o outro. Tenho consciência de que faço uma gestão só para pagar salário", afirma Adriano Araújo (PT), prefeito da cidade de Teofilândia, no sertão baiano.

    O município de 22 mil habitantes gasta cerca de R$ 2 milhões por ano com salários e encargos. Com os reajustes do salário mínimo e do piso dos professores, passará a gastar, aproximadamente, R$ 200 mil a mais.

    Mais pobres e dependentes de repasses federais, as prefeituras no Nordeste estão à beira do colapso e serão as mais afetadas com os reajustes salariais dos servidores.

    O cenário, aliado à queda nos repasses, deve refletir na oferta de programas federais (como o Saúde da Família), centros de assistência social e creches, já que as prefeituras estão sem margem para o custeio de novos servidores.

    O mínimo foi reajustado, neste mês, de R$ 788 para R$ 880 –um aumento de 11,5%.

    Levantamento da CNM (Confederação Nacional dos Municípios) aponta impacto de R$ 1,1 bilhão nos orçamentos das prefeituras nordestinas com o reajuste. A alta de gastos será de R$ 2,6 bilhões em todo o país.

    A concentração do impacto no Nordeste é fruto de uma situação peculiar: 36% dos funcionários públicos municipais da região ganham o salário mínimo. Nos municípios de São Paulo, por exemplo, o índice é de 0,8%.

    As prefeituras ainda irão absorver um impacto de cerca de R$ 7 bilhões do reajuste do piso dos professores.

    Do outro lado, terão que se virar com menos recursos. Em 2015, o aumento dos repasses da União ao FPM (Fundo de Participação dos Municípios) foi menor que a inflação, com perda real de 2%. E não há indicativo de que será diferente neste ano.

    A perda de arrecadação combinada com um aumento "forçado" de gastos ainda traz outro problema: o cumprimento do teto de gasto com pessoal previsto pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

    Na Bahia, 33% das prefeituras tiveram as contas de 2014 rejeitadas, a maioria por extrapolar os gastos com funcionalismo. A expectativa é que o número cresça na análise das contas de 2015, ano de recrudescimento da crise.

    Uma das cidades que teve as contas rejeitadas, Queimadas (a 302 km de Salvador) é exemplo de como os gastos com pessoal podem se tornar um gargalo quase insolúvel.

    Com 27 mil habitantes, tem 1.080 servidores concursados. Os salários levam 60% do Orçamento, ultrapassando o limite legal de 54%.

    "Como são concursados, não posso demitir. Já assumi o cargo sabendo que teria contas rejeitadas", diz o prefeito Tarcísio Pedreira (PR). Ele acusa gestões anteriores de fazer concursos e planos de carreira "irresponsáveis".

    PROGRAMAS FEDERAIS

    A oferta de programas federais como o Bolsa Família e Saúde da Família nos municípios tem sido motivo de preocupação. Os prefeitos se dizem no meio de uma encruzilhada: as cidades mais pobres são as que mais precisam de atenção. Mas os programas demandam pessoal, pressionando o limite de gasto com funcionalismo.

    No Senado, um projeto de lei do senador Otto Alencar (PSD-BA) tenta retirar o custo com programas federais do cálculo do limite de gasto das cidades com funcionalismo.

    No caso do Bolsa Família, por exemplo, é o município quem contrata os funcionários para cadastrar os beneficiários e fiscalizar o cumprimento das condicionantes.

    "O governo federal cria os programas e joga no colo dos municípios", critica Paulo Ziulkoski, presidente da CNM, que ainda aponta atrasos nos repasses para custeio dos programas desde o ano passado.

    Alguns têm até rejeitado novos investimentos. "Se nos oferecerem uma UPA [Unidade de Pronto Atendimento], não vou aceitar. No atual cenário, a cidade não tem como manter o custeio e vai se endividar", diz Ednaldo dos Santos, prefeito de Sento Sé (BA), de 37 mil habitantes.

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