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    o impeachment

    Fabio Feldmann se diz descrente de partidos e aponta dificuldades da agenda verde

    MARCELO LEITE
    DE SÃO PAULO

    15/02/2016 02h00

    Fabio Feldmann, 60, está de luto. Não só pela morte recente da irmã mais velha, Rachel, mas pela falência da política partidária e pelo esfacelamento da agenda ambiental no Brasil.

    O desânimo do militante verde, responsável pela maior parte do capítulo ambiental da Constituição de 1988, fez com que decidisse se dedicar de forma exclusiva, de ora em diante, a seu escritório de consultoria. Mas, como a maior parte do trabalho ali é "pro bono", cogita também voltar a advogar.

    "Eu vivo do que ganho", diz o ex-deputado federal pelo PSDB (1986-2003) formado em direito no Largo São Francisco (USP) e em administração pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), pai de três filhos e dono de um Fusca 1985 –seu único carro.

    Feldmann diz que a política nacional não tem mais lugar para candidatos de opinião, como ele, só para os candidatos "de máquina" (líderes partidários) e do dinheiro (aqueles capazes de levantar fundos para campanha, quando não corrupção).

    "Sempre fui um outsider na política", diz. "Não existem mais partidos, só comitês eleitorais."

    O fracasso em reeleger-se, em 1998, ele atribui ao ressentimento por ter introduzido o rodízio de veículos em São Paulo (1995), quando foi secretário estadual de Meio Ambiente. Mas desde 1994, na sua avaliação, as campanhas se afastaram do debate para concentrar-se só naquilo que dá ou tira votos.

    Apesar da derrota, o político verde se considera um parlamentar fora do Parlamento. Até hoje tramitam e são eventualmente aprovados projetos seus.

    Foram 14 anos para sair a Lei da Mata Atlântica. Outros 18 foram necessários para a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Há 25 vegeta no Congresso sua proposta para proteger cavernas, que só não avança, segundo ele, por oposição de mineradoras.

    "É desanimador. Sinto mais dificuldade do que há 30 anos", desabafa. "E justamente no momento em que os temas se tornam mais relevantes."

    CLIMA RUIM

    Feldmann se refere à relevância adquirida pela questão da mudança do clima, que culminou no Acordo de Paris, em dezembro. Para ele, o Brasil da presidente Dilma Rousseff (PT) se saiu bem na capital francesa, mas Feldmann prevê fiasco do plano doméstico para combater o efeito estufa.

    As metas nacionais de redução de emissões de gases podem parecer ambiciosas, mas seu cumprimento depende da implementação pelos governos estaduais. E os governadores, afirma, sentem menos que o Planalto a pressão internacional. "O Brasil não terá condições de cumprir seus compromissos."

    Ele cita como exemplo o Código Florestal. A lei de 2012 exige de proprietários rurais que recomponham as áreas de preservação permanente (APPs) e de reserva legal desmatadas, e disso depende boa parte da meta brasileira de restaurar 120 mil km² de florestas até 2030.

    Os governos estaduais estão encarregados de mapear e cadastrar as matas que precisam ser recompostas para em seguida obter de cada proprietário um plano de recuperação e fazê-lo cumprir. Quase quatro anos depois, porém, pouca coisa andou.

    RETROCESSO

    Feldmann critica, entre outros, o governador Geraldo Alckmin (PSDB), de quem se tornou próximo quando ambos eram constituintes. Ao regulamentar a aplicação do código, diz, Alckmin cedeu a interesses do setor canavieiro e permitiu brechas para excluir do passivo ambiental as áreas de cerrado no Estado (14% do território).

    "São Paulo teria de ser a Califórnia brasileira", lamenta, referindo-se ao papel pioneiro do Estado norte-americano em matéria de padrões ambientais que depois são adotados nacionalmente.

    Nem a crise de abastecimento foi capaz de fazer o governo paulista rever o arcabouço legal sobre uso da água e enfatizar o vínculo entre florestas e produção hídrica.

    "Se Alckmin quiser ser presidente, tem de se ligar mais efetivamente nas questões contemporâneas", adverte. "Fica nessa discussão menor e não nas questões estratégicas, como a agricultura de baixo carbono."

    O descaso com o ambiente, porém, seria "suprapartidário". Além da crise hídrica, diz que os desastres da Samarco em Minas e dois acidentes sérios com armazenamento de produtos químicos na Baixada Santista não tiveram grande consequência.

    Ao contrário, "só se fala em flexibilizar o licenciamento ambiental".

    Não que ele tenha muita fé no campo das organizações não governamentais (ONGs). "Mesmo a sociedade civil só está ligada em sobrevivência e questões de curto prazo. Está faltando inovação."

    Feldmann se candidatou a governador pelo PV em 2010, "para ajudar Marina Silva. Mostra-se cético, porém, quanto ao potencial da Rede Sustentabilidade, partido liderado pela ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente.

    Ele considera Marina brilhante e carismática, mas avalia que o fenômeno eleitoral não se refletiu no Parlamento, não contribuiu para ampliar ali a preocupação com questões ambientais.

    "A agenda da Rede teria de priorizar a ampliação da representação."

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