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    o impeachment

    Lava Jato investiga lobby de Oi e Andrade Gutierrez na Anatel

    JULIO WIZIACK
    FLÁVIO FERREIRA
    DE SÃO PAULO

    22/02/2016 02h00

    Paulo Lisboa - 20.jun.15/Folhapress
    Otávio Marques de Azevedo, ex-presidente da Andrade Gutierrez, quando foi preso na Lava Jato
    Otávio Marques de Azevedo, ex-presidente da Andrade Gutierrez, quando foi preso na Lava Jato

    A Lava Jato investiga mensagens trocadas entre executivos da Andrade Gutierrez e da Oi que revelam como a empreiteira, a tele e integrantes do governo operaram no passado para afastar conselheira da Anatel que se opunha a interesses da operadora.

    Os torpedos, trocados entre setembro de 2012 e janeiro de 2013, estavam registrados no celular de Otávio Marques de Azevedo, principal executivo da Andrade, que ficou oito meses preso e responde à acusação de crimes como corrupção e lavagem de dinheiro em outros casos envolvendo a empreiteira na Lava Jato. À época, a Andrade Gutierrez era uma das controladoras da Oi.

    As mensagens também reforçam a importância do funcionário da Oi José Zunga Alves de Lima, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, segundo as investigações, fez lobby no governo tanto para a operadora, quanto para a empreiteira.

    Na terça (17), a Folha revelou que Zunga fez gestão interna na companhia para que a Oi instalasse uma antena de celular para atender o sítio de Atibaia (SP) frequentado por Lula e sua família desde 2011.

    A Lava Jato investiga as circunstâncias que levaram a operadora a montar o equipamento perto do sítio adquirido por Fernando Bittar e Jonas Suassuna, sócios do filho de Lula, o Lulinha, na Gamecorp. A Oi se tornou sócia dessa empresa, tendo investido R$ 5,2 milhões em 2005.

    Em outubro de 2012, a Oi ainda não tinha conseguido da Anatel, a agência reguladora do setor, o atestado de cumprimento de todas as condicionantes impostas para a aprovação da compra da Brasil Telecom, negócio que aconteceu no fim de 2008, depois que Lula, então presidente, decidiu mudar a Lei Geral das Telecomunicações.

    Para finalizar o negócio, a Oi propunha pagar parte de suas multas que, naquele momento, totalizavam R$ 2,1 bilhões. A empresa ofereceu R$ 50 milhões para quitar toda a dívida, além de outros R$ 50 milhões para que a Anatel cancelasse todos os processos de sanção em curso. Em troca, investiria R$ 1,3 bilhão na operadora pós-fusão.

    Mas a conselheira da Anatel Emilia Ribeiro, próxima ao senador José Sarney (PMDB-AP), era contra o acerto.

    Nas mensagens, a conselheira é chamada de "Bigoduda" e Sarney, de "Bigode".

    Em torpedo de 25 de outubro de 2012, o diretor de planejamento da Oi, João de Deus Pinheiro Macedo, avisa Azevedo que tinha recebido uma mensagem do "caipirinha" –seria o presidente da Anatel, João Rezende. Nas mensagens, o então ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, é chamado de "caipirão".

    "Aperte a blitz [contra a conselheira]. O ministro reclamou dela para o Renan [Calheiros]. E ficaram de conversar semana que vem junto com o Sarney. É importante desmobilizar ela (sic)", diz a mensagem de "caipirinha" para João de Deus, da Oi.

    Um dia antes, João de Deus escreveu para Azevedo: "Bigoduda procurou Bigode e (ilegível) sobre recondução. Bigode falou com as 2 mulheres. Alagoas designado para tratar". A Folha apurou que as conversas mencionadas aconteceram.

    Às vésperas de sua saída, Emilia Ribeiro encontrou-se com Sarney, que tentou convencê-la a aceitar a recondução ao cargo. Ribeiro era a "cota" do PMDB na agência.

    Renan Calheiros foi encarregado por Sarney de reconciliar Ribeiro e o ministro Paulo Bernardo. Mas a conversa entre a conselheira e o ministro foi um desastre. Bernardo, em conversa com a presidente Dilma Rousseff, condicionou sua permanência no governo à saída de Ribeiro, o que aconteceu em 5 de novembro de 2012.

    BRIGA NA ANATEL

    A Folha apurou que a tentativa de acordo das multas da Oi na Anatel era costurada pela então secretária-executiva da agência, Simone Scholze, que, segundo servidores ouvidos sob a condição de anonimato, defendia a tele.

    Os técnicos foram contrários à proposta. Para os servidores, a agência não deveria pensar no assunto por menos de R$ 240 milhões.

    Zunga então foi enviado para tentar fazer Emilia Ribeiro mudar de ideia. No dia seguinte à reunião, ela apresentaria seu voto para análise no conselho da agência, no qual recomendava que a empresa melhorasse a oferta.

    Em mensagem de 24 de outubro de 2014, João de Deus Pinheiro Macedo informou Otávio Azevedo sobre o assunto, ao escrever: "Ela [Emília Ribeiro] pautou os 50M para amanhã".

    Azevedo, então, questionou qual era a posição da conselheira.

    "Mandei Zunga lá e ela [a conselheira] disse que 'não poderia ser contra o que ela mesmo relatou no passado'", respondeu o executivo da Oi.

    As teles costumam fazer esse tipo de abordagem junto a autoridades. Mas as mensagens apreendidas no celular de Otávio de Azevedo também indicam que a Oi participou de uma "blitz" com integrantes do governo para afastar a conselheira.

    Sete anos depois, a pendência da Oi sobre as multas segue em discussão na Anatel, que ainda não deu o aval final para a compra da Brasil Telecom, apesar de, na prática, ela ter se efetivado. Hoje, as multas da tele já chegam a R$ 6 bilhões.

    OUTRO LADO

    O funcionário da Oi José Zunga Alves de Lima disse desconhecer o teor de troca de mensagens entre executivos da Andrade Gutierrez e da Oi que o mencionam e indicam que ele participou de operação para tentar convencer a Anatel a liberar a compra da Brasil Telecom pela Oi.

    "Nunca troquei mensagens sobre esse conteúdo. Não trabalho com esse tema", afirmou o funcionário.

    Procurada, a Oi não quis comentar o teor das mensagens, encontradas pela Lava jato no celular de Otávio Azevedo, da Andrade. Desde a quinta-feira (17) a Folha ligou para a defesa de Otávio Azevedo, mas não obteve resposta do advogado que cuida de seu caso.

    A reportagem tentou fazer contato com o ex-ministro Paulo Bernardo mas não obteve retorno até a conclusão desta edição. A Folha também tentou falar com João de Deus Pinheiro Macedo, mas não obteve contato. A então secretária-executiva da Anatel, Simone Scholze, não foi localizada.

    A ex-conselheira da Anatel Emília Ribeiro também não retornou as ligações feitas pela reportagem.

    *

    A JORNADA DA OI
    Tele, que recebeu dinheiro público para virar campeã nacional, patina com endividamento

    • 2005 A operadora paga R$ 5,2 milhões por 30% da Gamecorp, empresa controlada por um dos filhos de Lula e por Jonas Suassuna, dono do sítio frequentado pelo petista
    • 2008 Então presidente, Lula muda a Lei Geral de Telecomunicações, permitindo que a Oi comprasse a concorrente Brasil Telecom
    • 2009 Pela aquisição, Oi desembolsa R$ 5,8 bilhões e sua dívida salta de R$ 12 bilhões, em janeiro, para R$ 21 bilhões em dezembro
    • 2010 Pouco antes de deixar o cargo, Lula convence o governo português a permitir a entrada da Portugal Telecom (PT) no bloco de controle da Oi. Ao deixar a Presidência, ganhou uma antena de celular para cobrir o sítio que passou a frequentar em Atibaia (SP)
    • 2012 A operadora tenta convencer uma conselheira da Anatel a mudar seu voto para que as condições impostas para a compra da Brasil Telecom fossem consideradas cumpridas. Caso contrário, o negócio poderia ser desfeito
    • 2013 Num cenário de competição acirrada, a Oi se funde com a PT e passa a atuar no Brasil, Portugal e África. A operação injeta R$ 14 bilhões na companhia, para reduzir a dívida, já em R$ 30 bilhões
    • 2014 Uma dívida de € 837 milhões da PT obriga a venda da própria Portugal Telecom para a Altice
    • 2015 A dívida da Oi ultrapassa a barreira dos R$ 50 bilhões, R$ 20 bilhões só da incorporação da PT, e a operadora recebe uma proposta de um fundo russo disposto a ser maior acionista da empresa desde que ela se funda com a TIM
    • 2016 Junto com outras do setor, a Oi tenta mudar a legislação do setor e renegociar multas aplicadas pela Anatel. Hoje a empresa vale menos de R$ 2 bilhões na Bolsa
    Editoria de arte/Folhapress
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