O ex-deputado federal Pedro Corrêa (PE), ex-presidente do PP, cita políticos da base do governo e da oposição em sua delação premiada, negociada por cerca de oito meses e assinada há duas semanas com a PGR (Procuradoria Geral da República).
A Folha teve acesso a alguns trechos da delação de Corrêa, preso em Curitiba, chamados de "anexos". O acordo ainda precisa ser homologado pelo Supremo.
Em um destes anexos, intitulado "Mesada de Augusto Nardes", o ex-parlamentar mira o atual ministro do TCU (Tribunal de Contas da União).
Afirma que, entre 2003 e 2005, quando Nardes era deputado federal pelo PP, ele estava entre os nomes da bancada da Câmara que recebiam propina arrecadada pelo deputado José Janene (morto em 2010) junto à Petrobras e outros órgãos com diretorias indicadas pelo PP.
Corrêa lembra que, quando Nardes foi nomeado ministro do TCU, em 2005, foi destruído um recibo que comprovava o pagamento da propina. Era, segundo Corrêa, um recibo de valor "baixo", algo entre R$ 10 mil e R$ 20 mil.
Isso foi feito, de acordo com o ex-deputado, porque o documento poderia "prejudicar a nomeação".
O pernambucano também apresentou uma lista de operadores de propina e incluiu o nome de Andrea Neves, irmã do senador Aécio Neves (PSDB-MG) e uma de suas principais assessoras, como a responsável por conduzir movimentações financeiras ligadas ao tucano.
A citação a ela é a primeira numa lista que inclui nomes como Marcos Valério, operador do mensalão, e Benedito Oliveira, o Bené, investigado na Operação Acrônimo, que apura suspeitas de irregularidades na campanha de Fernando Pimentel (PT) ao governo de Minas Gerais, no ano de 2014.
REELEIÇÃO
Também foi apresentado um anexo sobre o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que tem como foco a votação que aprovou a emenda constitucional possibilitando a sua reeleição, em 1997.
Segundo o relato, o ex-presidente FHC contou com apoio financeiro do empresariado para aprovar o projeto da reeleição.
Olavo Setubal, do Banco Itaú, morto em 2008, é mencionado como alguém que ajudou FHC.
"Olavo Setubal dava bilhetes a parlamentares que acabavam de votar, para que se encaminhassem a um doleiro em Brasília e recebessem propinas em dólares americanos", diz o anexo, citando o relato do ex-deputado federal pernambucano.
A delação de Corrêa deve causar impacto, entre outros motivos, porque ele teve quase 40 anos de vida política, parte deles presidindo o PP, legenda que integrou a base aliada dos presidentes FHC, Lula e Dilma.
Passaram por seu crivo nomeações como a de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, um dos primeiros delatores da Lava Jato.
A colaboração está consolidada em pouco mais de 70 anexos, cada um com um tema. São cinco referentes a Lula e cinco a Dilma.
LULA
Um dos fatos apontados por Corrêa envolvendo Lula, como revelou a revista "Veja" no ano passado, foi uma reunião com a participação dele, do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, e de José Eduardo Dutra, na época presidente da Petrobras, para acertar a nomeação de Costa para a diretoria da estatal, em 2004.
O ex-parlamentar e outros integrantes da cúpula do PP defendiam a nomeação, enquanto Dutra, sob pressão do PT, era contra.
Corrêa disse, porém, que Lula atuou em nome do indicado e revelou detalhes da conversa.
"Mas Lula, eu entendo a posição do conselho. Não é da tradição da Petrobras, assim, sem mais nem menos trocar um diretor", disse Dutra, na época presidente da estatal.
Lula respondeu, segundo Corrêa: "Se fossemos pensar em tradição nem você era presidente da Petrobras e nem eu era presidente da República", teria dito.
De acordo com o relato, 15 dias depois deste diálogo, com a nomeação de Costa, o PP destravou a pauta do Congresso Nacional.
Apesar das revelações, há pouca prova documental apresentada pelo ex-parlamentar, um dos motivos que levaram sua negociação a ser uma das mais longas da Operação Lava Jato.
Os fatos narrados por Corrêa são vistos como "uma crônica política" que ajudará a completar lacunas de outras colaborações.
OUTRO LADO
O ministro do TCU Augusto Nardes afirmou que o envolvimento de seu nome na delação do ex-deputado Pedro Corrêa é uma "retaliação pela oposição" que fazia dentro do PP.
Disse que foi um candidato independente ao cargo e que não contou com apoio do ex-parlamentar, na época presidente da sigla.
O senador Aécio Neves (PSDB-MG) declarou que Andrea Neves, irmã dele, não conhece e jamais teve contato com Pedro Corrêa.
Também enfatizou que repudia "as falsas acusações mais uma vez repetidas, sem indícios que possam minimamente comprová-las".
O tucano fez um apelo para que a Justiça esclareça "as denúncias verdadeiras e aquelas que têm unicamente o objetivo de tumultuar as investigações".
Ao tomar conhecimento da citação envolvendo compra de votos na emenda da reeleição em seu governo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso classificou o episódio como "ridículo".
Em nota, o presidente do Itaú, Roberto Setubal, disse que fica "profundamente indignado" ao ver o nome do pai dele, Olavo Setubal, "absurdamente envolvido numa história sem comprovações".
"Ele era um homem absolutamente ético e tenho convicção de que jamais se envolveu em nada parecido com o que, covardemente, o ex-deputado Pedro Corrêa descreveu. Meu pai não participava de qualquer atividade política desde 1986, e não há nenhum indício de que essa história possa ter fundamento".
O instituto Lula disse que não comenta falatórios e que "quem quiser levantar suspeitas em relação a Lula que apresente provas".
A defesa de Corrêa não se pronunciou.